capitulo 16

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Descemos para o café da manhã às onze horas. Quase todos os parentes ainda estavam à mesa, mas tomando café só meus pais e Daniel. Entre queijos, salames e pão italiano, a mesa da cozinha sempre foi e sempre será o lugar escolhido pela minha família para colocar todos os assuntos em dia. Sentado à minha frente e demonstrando certa impaciência, Daniel me olhava de um jeito tão diferente que era impossível imaginar o que se passava pela sua cabeça. Minha mãe me servia um copo de leite quente com açúcar, quando meu avô perguntou:
- Qual o nome da sua namorada, Marcus?
- Nome de quem, vô?
- Da sua namorada?
- Disse o primeiro que me veio à cabeça.
- Beatriz, vô.
Por debaixo da mesa, levei um chute do Renato.
- Beatriz do quê, Marcus?
- Eu não sei, vô.
Ele ficou nervoso.
- Como é que não sabe! Você nome uma menino e não sabe o sobrenome da família?
Antes que pudesse responder, minha avó entrou na conversa.
- É lógico que não sabe, Francesco. A juventude de hoje é diferente. Não seja antiquado!
Pensando, ele ficou quieto por alguns minutos e perguntou:
- Ela é virgem, Marcus?
Nem esforço de segurar uma gargalhada, me engasguei com um pedaço de pão.
Enquanto me davam exagerados tapas nas costas para que o pão descesse, vovó já discutia com o meu avô.
- Isso é pergunta que se faça. Francesco?  - Você não me chamou de antiquado, Luiza? Então fiz uma pergunta moderna e ele ainda não me respondeu.
- É lógico que não respondeu. Você viu que o menino está engasgado? Ele ficou chocado com a sua pergunta. Acho que o vinho subiu à cabeça, Francesco. Onde já se viu fazer uma pergunta dessas a uma criança.
- Ele já é um homem, Luíza. Ele fez aniversário ontem.
- Ele ainda é uma criança!
- Não é, Luíza!
- Pára de falar besteira, Francesco!
Quando disfarçadamente saí da cozinha - levando um sanduíche de queijo provolone -, eles ainda discutiam; só que agora todos participavam do assunto.
Fui para a varanda da frente da casa e em poucos minutos Renato chegou.
- Eu trouxe o seu leite.
Passando o copo para as minhas mãos, ele disse:

Desculpe, Renato, mas foi o primeiro nome que me veio à cabeça. Você está muito chateado?
- Não é isso, Marcus. É que…  Cortei suas palavras.
- Já sei. Essa garota não deve participar em nada da nossa vida.
- É isso mesmo. Esqueça que ela existe.
- Renato, nós temos que definir um nove de garota para ocasiões como esta. Que tal… Renata?
Em silêncio, ele apenas me olhava.
- Deixa para lá, Renato. Não precisa responder. Você quer um teco do meu lanche?
Sorriso no seu rosto.
- Eu não consigo ficar bravo com você, alemãozinho.
Só não nos beijamos, porque poderíamos ser vistos por alguém, mas trocamos olhares bem pessoais.  - Vou comprar cigarros, Marcus. Você vem comigo?
- Vou, deixe apenas eu acabar de tomar o leite.
Mudei de idéia quando Daniel entrou na varanda. Nós tínhamos um assunto pendente que não podia esperar.
- Se você quiser ir comprar cigarros, Renato, tudo bem.
Mesmo sem comentar nada com ele sobre a conversa que tive com o meu primo na noite passada. Renato logo percebeu que alguma coisa havia aconte4cido e, entendendo o meu toque, foi sozinho comprar cigarros.  - E aí, Daniel, vamos conversar?
Bastou um sim, para que eu conduzisse até o jardim das roseiras. Sentados no mesmo banco da noite anterior, ele perguntou:
- Seus pais nunca desconfiaram de nada?
- Nem imaginam, Daniel.
Silêncio.  - Falei alguma coisa que não devia, Marcus?
- Não é isso. Na verdade eu gostaria de conduzir essa conversa de um outro jeito.
- Me desculpe, Marcus.  Apesar de ter passado boa parte da minha infância brincando com o Daniel, no fundo ele será um total desconhecido para mim.
- Já se apaixonou por alguém, Daniel?
- Por quê?
- Responda.
- Paixão, paixão, acho que não, mas gosto muito de uma garota, Marcus. O nome dela é Iara.
- Vocês estão namorando?
- Mais ou menos, a gente sai de vez em quando. Mas o que isso tem a ver com o nosso assunto?
Pedi a ele paciência e continuei a perguntar:
- Você já transou com a Iara?
- Já.
- Tinha que ser Beatriz!
E o que vocês fazem na cama?
Nervoso, ele disse:
- E isso é pergunta que se faça? Esse assunto não diz respeito a você, cara.
- Não precisa ficar puto da vida comigo, Daniel. Era justamente neste ponto que eu queria chegar.
Visivelmente sem-graça, ele havia entendido o recado.
- Como você mesmo pôde perceber, Daniel, não é muito legal ficar comentando certas coisas. É tudo muito pessoal Boa parte do que você precisa saber eu já contei.
Meu instinto estava correto. Para quem esperava ouvir muito mais do que ouviu, aquilo era uma frustração.
- Como primos e amigo eu peço a você, Daniel, que respeite a minha opção de vida, não comentando nada com ninguém.  - Tudo bem. Da minha boca ninguém nunca vai saber nada.
- É isso aí, cara. Antes de voltar à varanda, ele fez mais uma tentativa:
- Posso perguntar só uma coisa, Marcus?
- O que é?
- De maneira alguma eu quero que você fique ofendido com a minha pergunta, mas estar com um cara - e eu não estou falando do Renato - não dá a você um certo… um certo nojo?
Percebendo que eu não havia gostado nem um pouco da pergunta, ele disse:
- Não fique ofendido, Marcus. Eu só estava dizendo isso, porque mulher é mulher.
Não tem pêlos no corpo, está sempre perfumada, sem falar do jeito feminino de fazer as coisa. Você não acha?
- Acho Daniel. Mas acho que o homem tem a sua beleza. E tem mais, cara, eu nunca tive outra pessoa além do Renato.
- Ele já sabe que eu sei?
- Não.
- Você vai contar a ele?
- Não.
Sem dar tempo a uma nova pergunta, fui me levantando.
- Vamos voltar para a varanda, Daniel?
- Ok.
Frustrado ou não, ele teve que conter sua curiosidade. - É isso aí, Daniel!
- Falou, primo.
Ele voltou para a cozinha e como Renato ainda não havia chegado, decidi encontrá-lo no caminho. Estava a dois quarteirões da casa quando avistei meu namorando bebendo um cafezinho no balcão da padaria.
- Quer um gole, Marcus?
- Não, Renato, obrigado.
- Falou com o seu primo?
- Hã, hã.
- E. - Tudo certo.
Ele não sabia o motivo da conversa, mas esperou que saíssemos da padaria para perguntar.
- E aí, Marcus? O que rolou?
- Ele nos viu conversando ontem à noite no jardim da casa.
- Então ele viu o lance do bolo!
- Viu.
- Que droga! E agora?
- Fique frio a que está tudo bem. Eu contei a ele que nós estamos namorando, e só.
- E você acha pouco?
Comecei a rir.
- Esconder a minha opção sexual depois do que ele viu e provavelmente ouviu, não iria adiantar nada. Não esqueça, Renato, que além do lance do bolo, por várias vezes eu o alisei sobre o jeans. - E agora, Marcus?
- Ele pensa que meus pais não sabem de nada.
Fiz cabaninha com as mãos para que ele pudesse acender o cigarro.
- E tem mais, Renato. Disse a ele que não contaria nada a você sobre a descoberta dele. Portanto, faça de conta de que não sabe que ele sabe.
- Você acha que nós podemos confiar nele?
- Claro. O que ele ganharia contando aos outros sobre a minha vida.
- Acho que nada.
- É só você fazer de conta que não sabe de nada, que vai ficar tudo bem, cara.
O fim-de-semana seguiu sem maiores problemas. A única coisa diferente, mas que ninguém percebeu, foi a atitude do Daniel para comigo. Ele continuava educado como sempre, mas toda vez que me olhava, fazia-o de cima para baixo, como a demonstrar uma certa superioridade que só existia na cabeça dele. Esse estranho olhar se completava com uma atitude física mais ridícula ainda, que era a de coçar o pau sobre o jeans, gesto esse que com certeza não fazia parte do seu dia-a-dia. Não sei exatamente aonde Daniel queria chegar com isso, mas uma coisa ficou clara para mim: a mensagem que ele me passava era algo como 'sou homem, sou macho' ou coisa do tipo. Acho que até um símio fazia esse papel muito melhor.
De volta a São Paulo - saímos de Jundiaí no Domingo à tarde -, pudemos finalmente nos sentir mais relaxados. Cansados da viagem, meus pais foram dormir cedo, deixando a sala toda para nós. Assistindo a um filme, Renato acariciava meus cabelos enquanto eu, confortavelmente deitado no sofá, mantinha o seu colo como travesseiro.
- Que sossego, hein, Marcus?
- Hã, hã.
- A sua família é legal, mas eles fazem muito barulho.
- Meu avô adora uma bagunça, Renato.
Rimos.
Ainda com a cabeça no seu colo, comecei a ser beijado por ele. Primeiro sua língua deslizou pelo contorno dos meus lábios para só depois se juntar à minha, num beijo lento, úmido e quente. Sensível àquele momento fértil, meu corpo pedia mais.
Tentei me levantar para fazê-lo deitar, mas não consegui:
- Não tenho pressa alemãozinho. O mundo é todo nosso.
Eu… nem te dei o meu presente ainda.
Beijos.
- Fiz algo diferente, alemãozinho.
Beijos.
- Eu queria algo que durasse para sempre.
Beijos.
- E consegui. Só que o meu presente… você não poderá levar.
Beijos.
Quando ele arregaçou a manga da camiseta branca até a altura dos ombros, pude ver como ficara bonita a tatuagem de um 'M' no seu braço direito.

Eterno Amor (romance bissexual)Onde histórias criam vida. Descubra agora