Vinte

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— O que você está fazendo aqui? — uma voz ressoou na escuridão e eu dei um salto da mesa em que eu estava sentada.

Levei a mão ao peito. Pisquei várias vezes olhando para o breu, de onde a voz de Bruno veio. Vim para seu ateliê por que estava com medo de dormir no meu quarto, a conversa com a rainha, e o medo de abrir os olhos e encontrar o rei lá era algo que não para de me atormentar. Esse era o lugar que eu sentia que era o mais seguro para ficar.

— Não conseguia dormir. — Era a única explicação que eu poderia dar. Expressar verbalmente o motivo que me levou a isso me causava arrepios.

— Andar pelo palácio sozinha essas horas é perigoso, devia ter ficado no seu quarto. — O alerta em sua voz me deixou nervosa mais rápido do que eu gostaria de ter ficado.

A luz se acendeu me cegando momentaneamente enquanto meus olhos se acostumavam com a onda de claridade. Há poucos metros, um Bruno completamente diferente caminhava em minha direção, sem realmente parecer me notar, seus olhos estavam cansados, assim como sua expressão que beirava a exaustão. Ele se sentou no outro extremo da mesa, longe de mim.

Seu rosto era duro apesar do aparente cansaço, o maxilar estava travado e as roupas... Ele não estava em trajes formais. E sim com roupas surradas manchadas de terra e sangue. Meu corpo gelou só de imaginar o motivo de ele estar assim, e as possibilidades que surgiram em minha imaginação não foram nada satisfatórias.

Mordi minha língua evitando fazer qualquer pergunta. Estava petrificada demais para tentar entender o que isso significava.

Bruno estava tão distante, olhando apreensivo para um pedaço de papel que retirou do seu bolso. Ele mal parecia se lembrar de que eu estava aqui, a uma curta distância. Sua mão tremia, o rosto sempre calmo, era um misto de raiva e repulsa. Qualquer um que tivesse amor a sua vida temeria aquele olhar feroz, eu não parava de sentir o tremor de puro medo que envolveu meu corpo.

Sua mão tremia quando ele amassou o bilhete em sua palma.

— Desgraçados! — Rosnou, batendo com força no tampo da mesa. A exaustão tinha sumido da sua face rapidamente.

— Está tudo bem? — Encontrei minha voz vacilante e traidora.

Bruno levantou o olhar em minha direção, com a expressão indecifrável. Hesitei um passo para trás, pronta para correr caso precisasse. Eu não conhecia o homem a minha frente afinal.

— Tinha me esquecido que você estava aqui. — falou baixo. O que não acalmou meus nervos nem por um segundo.

Queria questionar o motivo de ele estar vestido desse modo, ou porque ele estava me olhando assim, com o olhar feroz. Era pior do que observar a fúria com que Richard dirigia a mim. Queria tanto saber a razão de estar tão diferente, das inúmeras vezes em que estive aqui, observando-o.

Minha boca estava seca, não havia um fio de coragem em mim sequer para sussurrar uma única palavra apenas.

Me encolhi um pouco, e isso o fez suavizar sua expressão, para me deixar mais tranquila.

— Você não pode ficar aqui... Não depois de tudo o que estamos fazendo... — Não conseguia nem imaginar o que ele estava querendo dizer. — Volte para o seu quarto e não fique transitando a noite sozinha.

Mordi o lábio e encarei meus pés, assentindo para o que Bruno me instruiu. Uma mão pousou em meu ombro, e outra em meu queixo, fazendo com que eu olhasse para cima. Olhos verdes como os meus carregados de preocupação e ternura me encaravam, um sorriso frouxo surgiu em seus lábios. Lembrou-me do meu pai nas raras vezes em que ele me mostrava seus sentimentos.

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