Doze

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Pela primeira vez eu deitei na cama sorrindo.

Era difícil explicar essa sensação em meu peito, mas eu estava feliz por pelo menos uma vez não deitar sobre meu colchão com a cabeça cheia de frustrações terríveis. Eu não estava pensando em fugir, e em estratégias que envolvessem tal ato. Eu só estava curtindo esse minuto de paz que estava tendo, e lembrando sem parar do sorriso de Elian. Eu não podia. Mas também não conseguia evitar sentir o pouco calor daquele ato que ainda era frio o bastante para representar quem ele era. O gelo daqueles olhos... Eu estava hipnotizada.

Revirei-me na cama, estava começando a ficar confusa em relação aos sentimentos que sentia por Elian. Na maior parte do tempo, eu sentia raiva por ele ter me levado para cá, mas em um momento como esse, eu sentia pena. Ele deveria ter crescido sozinho, e com um pai terrível como dele, era impossível não ter outro caminho a percorrer. Se nós éramos o espelho de nossos pais... Não! Eu não era uma cópia fiel da minha mãe, e menos ainda do meu pai. Eu era completamente diferente, eu cresci com outra visão de mundo, eu sempre vi as coisas de um modo oposto a todos ao meu redor, por isso nunca me encaixei completamente em minha família em nenhum lugar. Esse era um dos fatores com que faziam com que me sentisse ainda mais desolada, pois em Ryce ainda existia um caminho para que eu pudesse agir em uma liberdade sigilosa, e no palácio, mesmo que muitas vezes eu tenha sido pertinente, era apenas um mecanismo de defesa para me defender de qualquer coisa incomum para mim. Entretanto, eu não tinha liberdade de ir e vir, sempre havia um guarda em meu encalço, espiando os meus passos.

Como em um susto me sentei na cama. Meus pensamentos foram longe demais, reabrindo feridas que estavam começando a se fechar de modo violento. Eu tinha que odiar tudo no palácio, eu fui arrastada até aqui, vou me casar contra a minha vontade, virei alvo do rei e da rainha, e provavelmente todos aqueles que um dia sentiram afeto por mim estão na mira do nosso governante. Eu precisava fugir o mais rápido possível, e não me preocupar em como o príncipe de Monteblack estava agindo na minha presença. Isso era ridículo até mesmo para mim. Fiquei em pé e peguei meu robe, precisava de uma caminhada, e de ar para que pudesse refletir melhor.

Comecei a vagar pelos corredores, uma discussão interna estava começando a ser travada dentro da minha mente. Eu deveria ter mandado uma carta a Nicolas e falado sobre minha situação, e lhe pedido alguma ajuda, porém isso era ainda mais perigoso, seria como se eu colocasse a vida dele diante de uma arma carregada, e esperasse enquanto se preparavam para puxar o gatilho. Eram tão estranhas essas coisas que rodeavam a meus pensamentos ultimamente, eu não tinha muita coisa para me entreter aqui no palácio, então eu sempre me perdia nas mais profundas reflexões. Minha mente sempre ia a lugares absurdos e escuros, que muitas vezes eu não sabia se eu encontraria um caminho de volta.

Eu estava tão alheia que mal notei, quando escutei certo murmúrio pelo corredor a minha frente, justo no momento em que viraria para ele. Vozes ecoavam pelo ressinto, e meus ouvidos logo reconheceram o som. Era Elian e o pai dele. Mas o que estavam fazendo ali há essa hora? Meus olhos vagaram pelo local, nem mesmo percebi que estava nos corredores que davam para o escritório do herdeiro da coroa. Estar distraída junto ao fato de nenhum guarda me seguir ou me parar enquanto eu andava, fez com que eu perdesse completamente a noção dos limites do palácio.

— Elian eu já disse para você que isso é loucura! — O rei Richard esbravejou irritado. Seu rosto se contorceu, e ele estava vermelho.

— Eu não me importo para o que você pensa. — Ao contrario da voz de seu pai, Elian estava falando mortalmente baixo, com uma voz incrivelmente fria, que eu jamais o ouvi usar.

Passaram-se alguns minutos de repleto silêncio. Os dois se encaravam de igual para igual, até o rei recuar com apreensão. Então era verdade o que falavam... Que até o próprio pai temia o filho.

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