t e r c e i r o

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→ amnesia

Sentia-me mais confortável no quarto do meu irmão do que no meu próprio quarto. Por isso, assim que chegámos a casa, eu e Luke decidimos ir diretamente para o quarto dele. Trancámos a porta, fechámos as persianas e deitámo-nos na cama de casal dele. Eu fiquei a ler o meu livro com a cabeça pousada nas pernas do meu irmão enquanto este via qualquer coisa no seu computador.
Era estranho; seria normal que, em qualquer família que tivesse acabado de perder um dos seus mais importantes membros, todos estivessem de luto e a chorar. Mas para mim e para Luke, este era um dos dias mais felizes das nossas vidas - era o dia em que todo o sofrimento, discussões e ansiedade acabava. Estávamos prontos para avançar como família, para nos tornarmos ainda mais unidos, algo que o nosso pai tentara impedir desde a sua primeira discussão com Luke.

"Queres beber alguma coisa?" Abanei a cabeça em resposta à pergunta de Luke. "Nem comer?" Voltei a abanar a cabeça e o meu irmão revirou os olhos. "Vou trazer-te qualquer coisa à mesma."

Saiu da cama num salto e foi lá abaixo à cozinha.
Ele era sempre o mesmo. Desde pequena, quando eu me recusava a comer, ele simplesmente não queria saber. Obrigava-me a comer até ao fim e apesar de isso me ter ajudado a entender a importância da comida desde tenra idade, tinha também contribuído para o facto de eu nunca ter assim tanta fome.

Gostava muito de Luke, isso era impossível de evitar. Gostava que ele cuidasse de mim, que ele me abraçasse, que ele se preocupasse, que ele dormisse comigo. O meu irmão era o meu anjo da guarda, mesmo que o seu temperamento fosse um bocado violento de vez em quando, contrário ao dos anjos da guarda dos livros e dos filmes. Mesmo assim, ele sempre fora correto e cuidadoso comigo, talvez até demais.

O quarto estava demasiado silencioso e o silêncio perturbava-me. Percebera, com o passar dos anos, que o silêncio me obrigava a pensar em coisas que não queria. Saltei da cama e coloquei um CD dos Scorpions a tocar na aparelhagem mais próxima de mim.

Quando ia voltar para a cama, reparei em algo debaixo da sua estrutura de madeira. Luke tinha um problema qualquer com as limpezas, o seu quarto nunca estava desarrumado e estava sempre tudo no sítio. Isto acontecia desde que ele era pequeno, e ao mínimo sinal de migalhas o Luke passava-se, virava empregada doméstica e começava a limpar tudo o que era sítio. Além do mais, as nossas empregadas não costumavam deixar os nossos quartos sujos. Olhei para a porta, com medo de ser apanhada. Luke não gostava muito que eu mexesse nas suas coisas, mas era mais forte que eu...

Mesmo assim, arrisquei e agachei-me, de forma a tentar apanhar o que quer que estivesse no chão. Éramos irmãos, éramos melhores amigos, não tínhamos de ter segredos.
Assim, estiquei-me e quando toquei no objeto, um arrepio percorreu-me a espinha.

Era um bocado de papel higiénico e estava todo amarrotado. Mas o problema nem era o facto de estar amarrotado mas sim o facto de estar coberto de sangue. Torci o nariz; talvez o meu irmão se tivesse cortado por alguma razão e tivesse mandado o papel para ali por ser demasiado preguiçoso para o apanhar... O que não tinha nada a ver com ele. Será que Luke se tinha magoado ou teria simplesmente acontecido alguma coisa? Não sabia o que fazer com o papel mas, assim que ouvi o meu irmão a subir as escadas, a minha primeira reação foi pôr o objeto no bolso. Algo não batia certo. Será que Luke se tinha metido noutra briga? Depois de tantas vezes que lhe implorara para evitar problemas?

Mas havia coisas que deixavam de interessar quando estava na companhia do meu irmão e, quando Luke entrou de novo no quarto com comida e me levou de volta para a cama, esqueci-me, por momentos, do papel misterioso.

⏩⏩

As horas seguintes foram estranhas. Estávamos ambos sozinhos em casa (a minha mãe deveria ter ido dormir a casa de Herrickson, ou algo assim), e apesar das suas palavras não me saírem do pensamento, estava mais interessada em jogar às cartas com o meu irmão. Isto é, até que o seu telemóvel tocou e ele combinou em ir sair à noite com Michael.
Eu gostava de Michael; apesar de um pouco estouvado, ele era simpático e fazia-me rir. Mas o grande problema é que eu nunca podia ir sair com Luke - "não vou levar a minha irmã a um bar e acabar fechado na esquadra por ter morto alguém à estalada" dizia ele, várias vezes, sempre que lhe pedia para ir com ele. Como a resposta era sempre a mesma, eu simplesmente deixara de pedir.
Depois de meia hora de abraços, recomendações e muitos "adoro-te" proferidos de ambos os lados, Luke deixou-me sozinha.
Bom, eu não estava propriamente sozinha. Os seguranças estavam lá fora e ainda havia gente a trabalhar nos jardins, mas todas essas pessoas trabalhavam para a minha mãe e, bom, a companhia delas não era a mais apetecida.
O pensamento de que amanhã já era dia de voltarmos à escola apoderou-se de mim e bufei, chateada. O Verão tinha sido horrível, com clima extremamente instável e estava sempre a chover e frio. Cassidy, a minha única amiga, estava de férias ainda e eu estava, bom, ali. 
Amanhã começaria o meu segundo - e penúltimo ano - no colégio. Merecia alguma coisa para me recompensar, certo? Já podia sentir que aquele ano ia ser stressante, por isso decidi fazer o óbvio para levantar o meu astral: encomendar uma pizza.

[editing] for the love of my brother ¦ LUKE HEMMINGS ¦Onde histórias criam vida. Descubra agora