Será que eu grito a noite durante meus pesadelos? Nunca pensei sobre isso, mas a ideia está em minha cabeça agora, porque Dakota gritou a noite toda. Em um momento ponderei ir até ela, acordá-la, fazer algo para acalmá-la, eu sei muito bem os efeitos colaterais dos pesadelos, mas não tive coragem. Cheguei a ir em seu quarto sim, cheguei a sentar na cama em que está dormindo, cheguei a passar a mão sob seu rosto macio, mas não consegui acordá-la, porque quando estava do seu lado, ela parou de gritar. Fiquei a noite toda ao seu lado e me arrependo disso, não posso me simpatizar com a garota, não se terei que matá-la depois.
Quando amanheceu, sai em silêncio de seu quarto, sem deixar vestígios de que estive ali, ela não precisa ficar confusa em relação a mim, eu disse que não me importo com ela, disse que não sou segurança, então não deveria cuidar dela desse jeito. Passo a mão pelo rosto cansado e suspiro fundo, ajeito novamente o terno em meu corpo e encaro a parede branca a minha frente, a porta do quarto que estou dormindo está à direita.
- Bom dia, grandão – A garota me encara, seus olhos varrem meu rosto e por um momento acredito que ela sabe que estive em seu quarto essa noite – Eu já posso ir na praia? – Ela pergunta finalmente, assinto com a cabeça, andamos juntos até o andar de baixo – Então te aconselho a trocar de roupa, porque vou caminhar pela praia depois do café.
Mordo o lábio e impeço minhas palavras de sair, escoro na estante da cozinha atrás de mim e a mulher senta na mesa e agradece senhora Grassi por colocar seu café da manhã na mesa. A senhora está com a máfia há anos, ouvi dizer que ela é filha de alguém que devia Gusman, seus pais fizeram um acordo e ela teve de pagar pelos pecados do pai. Senhora Grassi nunca falou nada, mas sei também que se casou com um Soldato, teve um filho que também virou Soldato e perdeu os dois. Senhora Grassi é uma mulher forte com uma história triste.
- Vai ficar aí? – A voz ainda mais rouca, por ter acabado de acordar, de Dakota me desperta, a encaro, seus olhos estão ainda mais claros essa manhã – Não vai me acompanhar?
- Já comi – Ela revira os olhos.
- Não gosto de comer sozinha.
- E eu com isso? – Ela bufa e arrasta o prato com as omeletes e a xícara com o café para longe.
- Então não vou comer – Reviro os olhos, a mulher levanta e ameaça passar por mim, seguro seu pulso e faço-a retornar à mesa.
- Eu te acompanho – Não gosto de receber ordens assim, por meio de ameaças, observo seu sorriso vangloriando-se.
- Então, dormiu bem? – Ela pergunta, limito a apenas encher uma xícara com café.
- Aham.
- Não vai perguntar se eu dormi bem? – Respiro fundo e a encaro, seus olhos me observam com cuidado, sua boca diz uma coisa e seus olhos outra.
- Dormiu bem, Dakota?
- Não, porque alguém invadiu meu quarto ontem à noite – Seu tom é ríspido, tento esconder a tensão em meus ombros – Acha que eu deveria trancar a porta do meu quarto?
- Não, atrapalharia caso formos invadidos – Coloco a xícara na boca, o cheiro gostoso do café invade minhas narinas.
- Então o que eu faço? Porque não gosto que invadem meu quarto sem minha permissão – Suspiro fundo.
- Você estava gritando, Dakota – Meu tom é baixo, não sei o porquê – Estava me atrapalhando a dormir, ia te acordar – Não é totalmente verdade, mas dou de ombros, ela passa a língua pelos lábios e volta a comer.
- Eu tenho um sono leve, acordei quando me fez carinho – Inclino a cabeça em repreensão.
- Não te fiz carinho.
- Aquilo era o que, então? – Seu sorriso é sarcástico – Para mim aquilo foi um carinho, acho que você não está sendo muito sincero com você mesmo, grandão.
- Será que dá para parar de me chamar de grandão? – Sua risada faz meus pelos se arrepiarem.
- Não – Ela diz sorrindo – Combina com você, acha não? – Reviro os olhos e fico calado, preciso manter a calma.
Dakota parou de falar também, seu olhar ficou distante e ela focou sua atenção na comida a sua frente, terminei meu café e esperei a dondoca terminar o dela. A loira está com um vestido branco que esvoaça assim que chegamos na areia, encaro a outra casa um pouco mais atrás e vejo alguns Soldatos treinando, todos absortos de nós dois, agradeço por isso. Tiro meu sapato e o terno, não vou passar calor por capricho, não tem necessidade, a loira desce os óculos e tampa seus olhos bonitos, caminhamos juntos.
- Eu costumava andar pela praia toda manhã quando era menor – Seu sorriso está distante, assim como suas memórias, perdidos numa pequena Dakota que não pode mais voltar – Corria pra lá e pra cá, era perigoso, mas não me importava nem um pouco – Ela encara o pé e a água ao seu lado – Hoje eu tenho medo de uma sombra – Sua risada é sombria.
- Quando eu disse que não precisa fingir comigo, não quis dizer para se abrir comigo – Não gosto do meu tom, não gosto das palavras que acabei de cuspir, não gosto de ser assim.
- Eu sei, grandão – Ela sorri – Mas minha mãe dizia que falar é importante e já que você não se importa comigo – Suas palavras me atacam sem eu nem perceber – Pensei que seria uma boa ideia.
- Faz sentido – Admito, talvez ela tenha razão mesmo, eu não estou sendo totalmente sincero comigo.
- Posso continuar falando então? – Seu sorriso é sarcástico, seu tom é irônico e seus olhos me observam, não importa qual resposta eu lhe der, ela vai continuar falando.
- Á vontade – Reviro os olhos, sua animação é propositalmente falsa.
- Você quebrou o clima, não tenho mais o que falar agora – Seguro a risada e nos calamos, Dakota continua a andar para lugar nenhum e observo-a brincar com a areia em alguns momentos, o sol começa a me incomodar.
- Você quer ter um cronograma? – A loira me encara, os óculos voltam a tampar seus olhos – Podemos arrumar algumas atividades para você.
- Obrigada – Seu sorriso é simplista – Mas não precisa, gosto de fazer as coisas do meu jeito e aqui tem tudo que eu preciso.
- Só não tem a civilização – Ela volta a andar.
- Isso são detalhes – Dakota diz, mas consigo perceber que não acredita em suas palavras – Tenho os soldados aqui – Reviro os olhos, eles foram instruídos a fingir que a mulher não está aqui – E tenho você, quero que treine comigo – Ergo a sobrancelha, ela me encara por cima do ombro, suas madeixas invadem seu rosto – Quero voltar a lutar.
- E quer que eu treine com você?
- Óbvio – Seu tom me irrita.
- Acha que consegue? – Sua risada é levemente convencida.
- не думай так много, здоровяк*
*Não se ache tanto, grandão
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A Máfia - Soldado Renegado
RomanceHernanez Lancellotti encantou os corações de todas as leitoras no primeiro livro de A Máfia, mas ele tem sua história para contar, seus segredos para esconder, seus ideias para omitir e os amores proibidos que o perseguem. Hernanez não é só um simpl...