Capítulo décimo primeiro

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— PERDEU, PIVETE, PERDEU!

— Calma… eu só vou…

— BORA, DESGRAÇA! — O de trás desceu e se aproximou de mim, encostando sua arma na minha cabeça. — BORA, PORRA! — Ele passou a revistar meu corpo até achar a minha carteira no bolso de trás, e então jogou para outro. — Seu merda.

— O fila da puta tem dinheiro. — O motorista abriu a carteira, dando um sorriso e pegando o dinheiro para depois jogá-la no chão. — Pega o celular desse merda aí no bolso da frente.

O outro pegou o celular e rapidamente montou na moto. Logo depois cantaram pneu e  se distanciaram tanto que sumiram na escuridão da noite. Alguns segundos depois, um ônibus passou: 0102 – Iguatemi. Era o ônibus que eu teria que pegar, fiz o sinal e ele parou já abrindo as portas.

— Boa noite, motor. — Falei enquanto subia as escadas. — Tudo na paz?

— Rapaz… — O motorista olhou para mim. — Eu e o Matheus aqui a gente viu o que aconteceu. — Ele apontou para o cobrador que tinha ódio nos olhos. — Pode pegar carona aí de boa, cê vai descer aonde?

— Bando de filho da puta. — O cobrador roubou minha vez de falar. — Aí tem que pegar e encher de porrada um sem mãe desses. — Ele olhou para o motorista. — Né não, Balofo?

— Ô véi, não me fale não. — Ele fechou as portas do ônibus e começou a acelerar.  — Dá uma paz da porra descer vagabundo na porrada. — Ele olhou para mim. — Né não, pivete?

— É… tô ligado…

Falei isso apenas para não causar um constrangimento no local. Não concordo e nunca concordarei com isso, o motivo? Já fui quase linchado no meio da rua, se eu não estivesse carregando o meu distintivo para provar quem sou, tudo isso por causa de um "pega ladrão" enquanto eu estava correndo atrás do meu buzu. No Brasil, preto parado é suspeito e correndo é culpado, não é nada raro ver notícias de vidas inocentes perdidas por linchamento.

Sentei na parte da frente do ônibus, antes da catraca, e resolvi responder à pergunta que me foi lançada antes desse papo.

— Vou descer no Campo Grande.

— Beleza, irmão.

O caminho até o Campo Grande foi uma tortura. Parecia que o  tempo não andava, ou então que o motorista não queria passar de 20 Km/h. Após aquela eternidade, desci no ponto em frente ao  Teatro Castro Alves, atravessei a praça Dois de Julho e encarei meu caminho pelo escuro e vazio Corredor da Vitória. Ele apresentava um silêncio que precedia o perigo e, por conta disso, meus passos foram mais rápidos. 

No meio do caminho passei pelo hotel Sol Vitória Marina, lembrei de Luciana, e acelerei o passo até minha casa. Não consegui passar muito tempo na frente daquele hotel depois de tudo o que aconteceu.

Continuei o caminho até o Largo da Vitória, número 50. Assim que cheguei, não precisei nem apertar o interfone para que o porteiro abrisse o portão. Entrei no menor espaço possível em que eu pudesse passar e continuei o meu caminho.

— Boa.

— Boa.

Esse foi o diálogo que tive com ele durante minha breve passagem para o estacionamento, estava com tanta pressa que não aguentaria esperar pelo elevador. Então peguei a escada que fica no estacionamento e pouco tempo depois, após um mísero lance que eu subi correndo, já estava abrindo a porta do meu apartamento. 

— Oi bê. — Letícia respondeu enquanto lia um livro. — Como você tá?

— Tô bem. — Fechei a porta do apartamento e ela, o livro. — Mas fui assaltado.

Cama de gatasOnde histórias criam vida. Descubra agora