Capítulo 8

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- Mariana? O Luís já saiu. Queres falar? - a minha irmã apareceu satisfeita.

- Neste momento só quero desaparecer. Não preciso de falar...

- Olha, a coisa que eu mais quero é que tu fiques comigo agora e para sempre. Queiras falar ou não, eu quero-te aqui sempre! Já perdi uma irmã. Não vou poder voltar atrás. Mas eu ainda te tenho, e podes ter a certeza que és minha. Nunca te vou abandonar. Por isso não sejas injusta comigo. Por favor. Não queiras ficar sozinha. Eu adoro-te e não te posso deixar sozinha. - dizendo isto começou a chorar compulsivamente e soluçava sem parar.

- Também te adoro. - abracei-a procurando consolo, mas mais uma vez, nada consolava. Era a mesma coisa que tentar por cor em cima do preto. Não funcionava. O preto é preto para sempre. A única coisa que podemos fazer, é colocar algum branco, para tentar aliviar temporariamente. Mas o preto é preto para sempre.

#DIA SEGUINTE#

Acordei a gritar. Todos se rodeavam da minha cama, com medo. Eu apenas tinha tido um sonho. Um sonho em que a minha irmã Beatriz aparecia, mas desta vez era ela que me dava o estalo. Um estalo que provocava sangue na minha cara, e depois ela desaparecia. Eu só conseguia gritar desesperada.

- Está tudo bem Carolina! - o meu pai tentava acalmar-me.

Eu continuava a gritar. Consegui ouvir a minha mãe a dizer ao meu pai "é melhor ela ficar em casa, ela não pode ir ao funeral.".

- NEM PENSEM! EU VOU! EU TENHO DE IR MESMO! TENHO DE LHE PEDIR DESCULPA, TENHO DE FALAR COM ELA!

O funeral estava a deixar-me desmoronada. Mas eu tinha de ir.

Preparei um saco com as coisas que queria oferecer-lhe. Na realidade, seria oferecer coisas à terra, já que ela estava morta. Mas mesmo assim, preparei tudo.

O saco continha a minha carta, para eu a ler e a enterrar com ela. Levei a moldura da nossa foto. Levei ainda o livro, para que ela o acabasse de ler. E além de tudo levei-lhe um diário, para que ela escrevesse tudo aquilo que visse, tudo aquilo que sentia.

Passados 20 minutos dirigimo-nos todos ao carro, em direção ao funeral. Fazia muita confusão estar num carro que habitualmente estava cheio, um carro de cinco lugares. Agora apenas quatro estavam preenchidos. Porquê?

Chegámos. Caminhámos por um trilho marcado por pedras e andámos até um sítio onde estavam várias pessoas reunidas. Mais à frente, o caixão. Caixão. Que palavra tão forte.

Fui ouvindo o discurso de várias pessoas, e de alguns amigos da Bea, Mas nenhuma dor dessas pessoas se assemelhava à minha. A única dor parecida era a da Mariana.

Chegou a vez de o meu pai falar.

- Filha, quero apenas dizer-te que durante os anos que viveste, me ensinaste muita coisa. Muita coisa que os crescidos não ensinam às crianças. E eu estou muito agradecido por isso. Peço-te ainda muita desculpa por te ter deixado ir.Deixei-te sozinha. Desculpa meu amor. - o meu pai parou o discurso porque já não conseguia. Chorava imenso. Então afastou-se e voltou a sentar-se no seu lugar.

A minha mãe apenas se dirigiu ao caixão e pediu desculpa de tudo também. E deu um beijo no caixão na esperança que a Bea o recebesse como se fosse na sua cara. E acabou por recuar também.

Antes de mim, foi a Mariana.

A Mariana levantou-se da sua cadeira e ajeitou o cabelo enquanto caminhava em direção ao caixão.

- Foste uma das duas melhores coisas que aconteceu na minha vida. Apareceste, e fizeste com que o meu mundo mudasse. Uma coisa eu te digo. Eu faria de tudo para estar no teu lugar e para te dar a vida. Dava tudo. Mas eu não posso dar nada. Como todos os outros, só te posso dizer o que gostava. E gostava muito, mas mesmo muito, que me desses um abraço agora Bea. Mas não vais dar. E não estás a ouvir. Por isso desculpa. Eu amo-te demasiado Beatriz. Obrigada por tudo.

Antes de se sentar, abraçou-me. Engraçado. Ambas nós tentávamos satisfazer a vontade de abraçar a Beatriz, abraçando-nos uma à outra.

Era a minha vez.

Fui ter com o corpo dela colocado no caixão e retirei a carta do saco. Li a carta toda mantendo-me firme e sem chorar. Depois de acabar, reparei na multidão imensa que chorava. Acabei por colocar o diário e o livro juntamente com a carta, junto do caixão, para que fosse enterrado com ela. Ao retirar a moldura, hesitei. Senti uma grande dor e olhei para a fotografia. Tive de a guardar. Precisava daquele sorriso junto de mim. Eu precisava da moldura. Por isso acabei por a guardar no saco e fiquei com ela.

Ao sentar-me, uma data de pessoas veio ter comigo elogiando as minhas palavras e a minha coragem. Mas eu não queria que elogiassem. Eu não era corajosa, eu era fraca. E não eram bonitas as coisas que eu houvera dito. Eram tristes e magoavam. Mas mesmo assim eu agradeci a toda a gente. A minha irmã veio ter comigo.

- Nós temos muita sorte em te ter como irmã. Mesmo muita. És a outra das duas coisas que mais amo na vida. Amo-te muito Carolina. Amo-te muito, muito, muito. "Amo-te por ti" - disse citando a última coisa que eu referia na carta.

Abraçámo-nos e dissemos adeus à Bea. Custou o mais que podia custar. Custou-me existir. E disse-mos adeus à espera que ela dissesse "olá". Mas não. Foi mesmo um adeus. Um adeus para sempre.

Sempre que eu puder voltarOnde histórias criam vida. Descubra agora