Luar Carmesim

Capítulo 24: Embriagados pelo delicioso vinho do amor

O garotinho de cabelos pretos e curtos ainda tentava recuperar o fôlego. Ele encontrava-se sentado juntamente com um menino de cabelos prateados em um colchão surrado.

"Está doendo muito?" O pequeno Mu Qing perguntou baixinho ao passo em que esticava seus dedinhos até que conseguisse alcançar a bochecha avermelhada de Feng Xin.

"Não dói nada, eu já estou acostumado." O menino de cabelos pretos sorriu abertamente, pondo em sua face uma expressão alegre para tentar consolar o outro "Vamos, coma logo, não quero te ver com fome."

Entregando um dos bolinhos de carne cozido no vapor que estava em sua mão, ele viu Mu Qing timidamente pegar o alimento, começando a mordê-lo de forma ávida em seguida.

Cenas como aquela eram comuns em algumas das madrugadas do orfanato. Mu Qing sentia fome por comer pouco ao longo do dia e Feng Xin não media esforços para saciá-lo. Ele, decididamente, se esgueirava até a cozinha do local, furtando o que conseguia achar de imediato. Contudo, muitas vezes era pego pelas servas do orfanato e punido fisicamente por seus atos.

A bochecha avermelhada ainda latejava pelo tapa que havia recebido, mas Feng Xin não via como necessário choramingar suas dores, visto que o objetivo principal fora atingido: ele conseguiu fugir das agressões e trouxe os bolinhos, um para si e um para seu pequeno Mu Qing.

Observando a criança de fios prateados comendo, Feng Xin sorriu e começou a mordiscar lentamente o seu próprio bolinho, sentindo o rosto arder. Ele, tendo mais idade que os outros meninos com quem dividia o quarto, sentia-se no dever de cumprir o papel de irmão mais velho. E era assim que eles eram denominados ali, como irmãos.

Feng Xin tomava para si a responsabilidade de cuidar de todos, preocupando-se com o bem estar de seus 'irmãos'. Depois dele, o mais velho era Xie Lian, com o qual possuía uma relação de carinho, visto que estavam ali há mais tempo que os outros e já haviam enfrentado muitas adversidades juntos.

O menino de cabelos curtos e pretos, em tão pouca idade, já atribuía a si mesmo papéis de tamanha responsabilidade, sempre cuidando dos outros, mesmo que não houvesse alguém para cuidar de si mesmo...

Mu Qing finalizou o bolinho primeiramente e o olhou com grandes olhos negros e brilhantes, agradecendo enquanto suas bochechas coravam. Feng Xin apenas sorriu e apressou-se para terminar de comer também, intencionando dormir em breve.

"F-Feng Xin... você poderia dormir aqui comigo?" O olhar baixo e os dedos das mãos que nervosamente se entrelaçaram denunciavam a timidez de Mu Qing ao fazer tal pedido. Não era incomum que ambos dormissem juntos, no entanto, Mu Qing sempre se sentia imensamente envergonhado por pedir tal coisa.

Feng Xin não respondeu, apenas juntou os colchões e se deitou, esticando o braço à espera de que o pequeno Mu Qing se aconchegasse contra si. Assim ele o fez, deitando de costas para o garoto e sentindo o braço livre de Feng Xin o rodear. O mais velho ainda permaneceu acordado por certo tempo, observando seu 'irmãozinho' até que ele dormisse. Ele queria poder sempre cuidar de Mu Qing e de seus outros irmãos, mas, em seu âmago, ele também desejava receber o cuidado de alguém...

... ...

Caminhando de encontro ao pôr do sol, direcionando-se ao alojamento, a mente de Feng Xin se revirava diversas vezes no intuito de compreender os sentimentos mais profundos e intensos que descansavam no inconsciente do arqueiro.

Mais alguns dias se passaram desde o almoço com Mu Qing e estar próximo ao soldado fazia seu corpo efervescer e sua mente se nublar. Ao perceber que as características que o encantavam em Jian Lan, na realidade, eram aspectos de Mu Qing admirados por ele, Feng Xin começou a questionar a si mesmo de diversas formas.