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"Você me abraçou tão apertado
Agora outra pessoa pode também
Mas você foi o primeiro homem que realmente me amou."
FIRST MAN — CAMILA CABELLO

Entre todas as coisas ruins do mundo, não havia nada que Madison odiasse mais que tempestades. E, temerosa como era quando o assunto eram elas, sabia bem que os raios cortando o céu e a umidade no ar só podiam significar que uma tormenta se aproximava. E das grandes.

Ela não queria sair de onde estava, soterrada pelas cobertas no sofá da sala. Bingley estava ao seu lado, fiel como sempre, mas Madison tremia a cada barulho infernal que vinha precedido por um clarão horrível.

Tempestades a lembravam de como tinha destruído tudo que era bom para ela. Não havia como ativar memórias piores.

Em casa, quando estava somente em companhia de Bingley e as tempestades começavam, ela tinha a boa e velha opção de tomar o remédio que seu médico a receitara para dormir, quando precisasse. Ela se refugiava debaixo das cobertas e permanecia por lá até adormecer. No dia seguinte, não restava nada além das calçadas molhadas e a vaga lembrança do que a atormentava há tanto tempo.

Não tinha levado remédio algum para a viagem, porém. E os relâmpagos continuavam a cair. Uma, duas, três vezes, e então a contagem se reiniciava, e tudo que restava a Madison era fechar os olhos com força.

Ela não sabia a quanto tempo estava naquele estado, tentando ignorar a realidade ao seu redor. Ouviu um pigarro e abriu os olhos.

Era Flynn, é claro. Ele estava com os cabelos molhados e um conjunto grosso de moletom. Madison se perguntava como ele tinha coragem de tomar banho com o mundo caindo do lado de fora. Era perigoso em qualquer circunstância, não somente porque ela tinha medo.

Ele franziu o cenho.

— Tá tudo bem, Bradford?

Madison assentiu, embora a última coisa que estivesse sentindo fosse bem-estar. Vontade de vomitar, talvez. Mas não iria encher Flynn com sua história triste. Nunca tinha falado sobre ela com ninguém, exceto Beverly, e só o fizera depois de muitas taças de vinho e uma necessidade de dividir com a melhor amiga os piores meses da sua vida.

Não é que não quisesse contar. Ela só não queria jogar o peso de tudo aquilo em cima de outra pessoa, quando o fardo era somente dela.

Flynn suspirou diante do silêncio.

— Não acredito em você, mas não vou ficar insistindo e muito menos sem fazer nada. Você parece mal de verdade, Bradford. Quer um chocolate quente? Depois disso a gente pode, não sei, conversar.

Ele estava sendo tão gentil. Nem parecia que viviam trocando farpas há semanas. Na verdade, quanto mais parava para pensar no seu relacionamento com Flynn, mais Madison tinha certeza do que vinha crescendo dentro de si. Amizade, sem sombra de dúvidas. Um pouco além disso, talvez, mas ela evitava esbarrar no assunto.

A companhia dele era cada vez mais benquista para ela e, enquanto ele esperava a sua resposta, Madison soube que não queria ficar sozinha naquele dia. Nem que fosse somente para falar qualquer coisa sem sentido e sem relação alguma com tempestades. Por somente uma vez, se permitiria uma distração.

— Quero. Obrigada.

Flynn exibiu uma expressão confusa diante da resposta curta dela — Madison tinha uma tendência à discursos longos que muitas vezes não faziam o menor sentido —, mas não disse nada e saiu rumo à cozinha. Bingley partiu com ele, deixando Madison em companhia somente dos clarões que iluminavam as paredes.

Luzes congelantes | CONCLUÍDAOnde histórias criam vida. Descubra agora