Onze

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Allita

Tanta raiva, era só isso que eu conseguia sentir.Raiva de mim, raiva pelos meus pais que mentiram pra mim, raiva pela minha avó me obrigar a fazer essas coisas...ridículas, raiva pela minha bisavó ter me passado isso.A chuva tinha começado novamente dessa vez mais forte um tremenda tempestade, mas o pior da situação não é o tempo ruim e sim o fato de eu não poder entrar na minha casa. Meu corpo está todo molhado e gelado possivelmente vou pegar um resfriado aqui, meus dedos já estavam brancos de tanto que eu apertava meu corpo em busca de algum calor, meus cabelos molhados caiam sobre meu rosto e minhas roupas encharcadas começavam a me incomodar.

— Quanto tempo eu tenho que ficar aqui?—meus dentes batiam forte pelo frio.— Está muito frio aqui fora.

— Até você entender—minha avó repete a reposta novamente, das minhas perguntas anteriores.

O único problema ali e que eu não conseguia entender, nem sei o que eu tenho que entender, nada faz sentindo.Eu vou morrer de hipotermia.

— Você vai matar a garota assim—Mabel reclama com a minha avó que finge não ouvir suas palavras.

Talvez meus pais tivessem razão é a minha avó fosse louca mesmo. Ninguém nunca entendeu o motivo pelo qual ela saiu da minha cidade antiga, deixando seus dois filhos para trás para vir morar no meio do nada, vivendo em uma cabana solitária e sombria, aprendendo alguma coisa misteriosa e possivelmente perigosa.Os anos sozinha podem ter deixado a coitada louca, ou, até homicida.

— Qual seu problema? Em me diz?—grito já cansada de toda essa palhaçada.— Eu quero entrar, não quero mais ficar aqui.

— Pessoas ruins vão vir atrás de você e essas pessoas não vão querer saber de você está com frio ou fome.O seu corpo pode fazer coisas incríveis, e eu estou te ajudando a perceber isso— sua fala me deixa sem resposta e continuo ali no frio.

Meus pais não estavam em casa e meu irmão ainda não tinha chegado, fiz uma nota mental de perguntar ao meu irmão se ele sabia de tudo isso. Já tinha perdido a conta de quanto tempo eu estava debaixo da chuva, aos poucos  a água que caia sobre mim não me incomodava mais e nem o frio, meu corpo aos poucos se acostumou com a situação e meu frio se foi,  foi ai que eu entendi. Meu corpo poderia se acostumar com o frio e com essas sensações incômodas.Entrei em casa e ao lado da porta estava minha prima me esperando com uma toalha e um sorriso gentil.

— Eu sinto muito— ela me ajuda a me secar.— Sei que está brava, mas estou sempre aqui com você.

— Eu também sinto muito—digo apenas isso.

Fui para o quarto sendo seguida pela loira, ninguém ousou quebra o silêncio que se formou e eu agradeci mentalmente por isso.Eu precisava de espaço e tempo para pensar, toda aquela situação beirava a loucura e me fazia questionar minha lucidez como tudo aquilo podia ser possível? Chega a ser engraçado todas as vezes em que vemos um filme e desejamos ser aquele personagem, mas quando finalmente chega a nossa hora de experimentar algo novo e surreal não conseguimos sair da bolha que é nossa vida. Eu não pedi por isso mais era algo bom ou talvez não seja, tudo isso faz minha cabeça latejar.

— Você ainda está brava comigo?— por algum tempo eu tinha realmente esquecido a presença de Mabel naquele quarto.

— Não, é só confuso entende em um dia você está triste pois vai morrer e no outro você percebe que além de poder ficar viva você é algo...estranho, já nem sei que palavras podem descrever o que eu estou sentindo— me deito na cama e pego o travesseiro trampando meu rosto, eu só queria gritar.— E tem tantas coisas que eu não entendo, essa sensação é horrível.

— Me desculpe mentir, mas tente entender que não cabe a mim te contar essas coisas mais peço que fale com os meus tios, foi difícil pra eles isso também— Mabel por um lado tinha razão, meus pais sempre me protegeram e essa situação deve estar sendo difícil para eles também.

— Amanhã eu falo com eles eu só quero tomar um banho e dormir.

— Amanhã temos aula não se esqueça disso—ela sai me deixando sozinha novamente com meus pensamentos.

Decido tomar um banho rápido.E tão louco saber que de alguma forma eu estou ligada a água, que ela faz parte de mim e não digo isso pelo fato do nosso corpo ter água e uma ligação mágica que vai além do compreensível.Essa sou eu agora, vou muito além da compreensão e do considerado normal.

Como eu tinha comprado algumas tintas mais cedo apenas me ajeito perto da janela, com meu pequeno quadro em branco e meus pincéis.

— Você está bem?—continuou pintado sem dar muita atenção para o meu irmão.

— Depende, o que você quer dizer com bem?—pergunto.— Veio mentir pra mim também?

— Não seja assim— me viro para o meu irmão que se senta na minha cama e me olha com um olhar culpado.— Todos tivemos nossos motivos.

— Não me diga eu vou adivinhar, era para que eu pudesse ter uma vida normal—falo sarcástica com um sorriso debochado.

— Só espero que não fique brava.

— Que pena, eu já estou brava— falo voltando a minha pintura.—Pode me deixar pintar em silêncio por favor.

Ele deixa um beijo em meus cabelos e sai sem dizer mais nada.Continuo pintando e quando termino deixo em cima da mesinha para que possa secar.Me deito e coloco meus fones de ouvido esperando o sono me dominar, a música ao menos ajudava a esquecer meus pensamentos e me dava um pouco de paz.

Tinha alguém na minha cabeça.

Foi a primeira coisa que pensei assim que eu acordei. Alguns fios do meu cabelo estavam grudados na minha testa devido ao suor, minha respiração estava rápido como se eu tivesse percorrido alguma maratona, assim como meu coração que parecia querer sair do meu peito.O relógio do meu celular marcava duas da manhã e o frio naquele quarto pareceu aumentar.Me levantei da cama em passos calmos tentando não acordar minha prima e me sentei de frente para a janela, eu não conseguiria dormir agora, lá fora o vento soprava forte balançando os galhos das árvores e lua iluminava um pouco.Eu não me lembrava do sonho que tive mais eu podia sentir que tinha alguém na minha cabeça me chamando, essa era minha única certeza.

Calçei meus tênis e vesti um casaco grande, abri devagar a janela para não fazer barulho e sai em passos apressados.Minha casa não ficava tão distante da praia La push e eu poderia ir andando.Depois com toda certeza quando eu estiver mais ciente das minha ações vou querer me bater por sair a essa hora, mais o instinto em mim prevaleceu impedindo o lado racional de agir.

Me sentei em um dos vários troncos que tinham ali e apenas fiquei observando o mar, e algo realmente lindo chega a ser de tirar o fôlego.Fiquei alguns minutos ali e o frio já nem me incomodava tanto assim, mais fiquei em alerta assim que ouvi um barulho, não poderia ser outra pessoa a essa hora eu acho.Me virei vendo perto das árvores um lobo enorme, quase do tamanho de um cavalo, me assustei tanto que acabei caindo do tronco na areia molhada.

— Puta merda!—foi tudo que eu consegui dizer.

Um animal daquele tamanho não é possível, isso é loucura. O lobo se aproxima mais me fazendo recuar e me arrasta pela areia, ele parecia vidrado em mim, possivelmente pensando o quanto a minha carne deve ser gostosa.

Ele vai me matar.

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