Capítulo 4 | Café com medo.

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Mesmo sendo sua segunda semana trabalhando na Entre linhas e café, o perfume que os livros exalavam era tão arrebatador quanto da primeira vez em que o garoto colocara os pés na livraria, e, tirando o fato dele ter um patrão chato, preconceituoso, narcisista e arrogante, Otávio havia concluído que estar no meio dos milhares de exemplares era fugir da realidade, mesmo que por poucas horas ao dia, e isso era o suficiente para ele continuar a trabalhar ali.

O exterior da livraria mesmo tendo apenas dois andares, era de tirar o fôlego, iguais aos prédios que Otávio via em filmes americanos. O edifício octogonal de paredes cor de rubi e janelas largas impecavelmente limpas era um verdadeiro deleite aos olhos, mas era o interior da livraria que chamava realmente a atenção; Era como se ali fosse o Taj Mahal dos leitores assíduos. O catálogo da livraria era o mais completo da região, contendo enciclopédias, livros didáticos, romances clichês e romances aclamados pela crítica. Possuía também um vasto catálogo com obras narradas em diversos idiomas. Também havia livros raros e itens de colecionador, mas eram guardados a sete chaves por Emílio. Otávio nunca conseguiu entender como a livraria arrecadava tanto dinheiro com livros em um país onde a população não possuía, infelizmente, o hábito da leitura. O alto valor em dinheiro que a livraria recebia não fazia sentindo algum, e Otávio até pensou em Emílio sendo responsável por algum esquema de lavagem de dinheiro, mas rapidamente descartou a ideia, pois em suas palavras o patrão era um bundão e não teria coragem para agir de modo criminoso.

No extenso salão e em cada uma das paredes havia estantes tão altas que quase tocavam o teto, sendo somente possível pegar os livros lá de cima com escadas. Espalhadas pelo salão haviam dezenas de estantes lotadas de exemplares. No teto, presa à finas correntes, havia placas indicando cada gênero: Terror, fantasia, suspense, drama, investigativos, HQs e livros didáticos. Nos fundos da loja havia uma bela escadaria de mármore que dava acesso ao segundo andar, onde funcionava a cafeteria. A livraria era grande demais para que Emílio e seu único funcionário tomassem conta, por isso a cafeteria ficava aos cuidados de Marcos Vetiver, seu irmão. Marcos era totalmente o oposto de Emilio e a diferença era nítida; Ele tem 48 anos, ou seja, sete anos mais novo. Seu corpo não era atlético, mas comparado ao de Emílio, era bem mais vistoso. Sua barba rala e um pouco descuidada dava um toque charmoso ao seu rosto pouco arredondado. Ele não era calvo como o irmão, seu cabelo era curto e castanho. Otávio gostava muito de Marcos por ele ser gentil, brincalhão e pouco responsável em relação a trabalhar, já que quase todos os dias o homem aparecia no prédio com os olhos avermelhados, carregando uma sacola cheia de pães e salgados, e sempre dizendo coisas sem nexo e logo em seguida gargalhava atoa. Emílio parecia não notar ou se importar, mas seu irmão era um maconheiro de carteirinha e não fazia questão de esconder.

Após marchar pesadamente até a cozinha da cafeteria Otávio foi até a máquina e preparou uma grande xícara de café expresso. Ele aproveitou que o chefe estava organizando o caixa na entrada da loja e sentou-se em um dos vários bancos perto do balcão. Degustou sem pressa alguma a sua xícara de expresso, fazendo questão de erguer o dedo mindinho conforme a xícara subia para deixar todo o líquido descer.

- Café é minha religião. Puta que pariu! - Ele comentou bastante satisfeito e com um pouco mais de ânimo.

Quando terminou a degustação ele foi até o banheiro ao lado da escadaria.

Na frente do espelho seu rosto exalava cansaço mesmo após o expresso quente. Seus olhos estavam fundos e seu rosto parecia mais magro do que de costume. Sua pele branca como algodão, possuía um leve brilho umedecido por conta do calor. Otávio ainda não havia percebido, mas seu corpo havia começado a transição e passaria por algumas etapas antes de estar totalmente pronto.

Guardiões de Éter - O Filho do ArcanjoOnde histórias criam vida. Descubra agora