Capítulo 03

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Após o choque inicial, silenciosamente resolvemos ignorar o que tinha acontecido e que nos conhecíamos. Assim que Laura virou as costas, nos sentamos atrás de nossos computadores e não trocamos nenhuma palavra. Eu sentia que a minha mente ainda não estava de volta ao meu corpo, e eu só tive certeza que estava de fato lá (e não numa projeção astral de um pesadelo) quando olhei meu rosto tão vermelho quanto o meu cabelo, refletido nos monitores desligados à minha frente. Se fosse para sonhar com ele, eu estaria reprisando a madrugada de sábado e não vivendo isso. Afinal, quem seria o roteirista de um sonho tão filho da puta capaz de criar uma situação constrangedora dessa maneira como boas-vindas ao trabalho?

Abaixei a cabeça e a apoiei em minhas mãos por algum tempo até sentir meu rosto suavizando o rubor. Eu deveria fazer uma caminhada de reconhecimento, procurar pelo banheiro e o café, mas eu só queria ficar petrificado na minha cadeira. Para a minha felicidade, em cima do teclado havia uma folha com orientações básicas sobre como criar meu próprio usuário no computador, ativar meu e-mail e todas essas coisas corporativas que devem ser feitas antes de se iniciar o trabalho propriamente dito. Eu sabia que eu estava adiando o inevitável, e ele também deveria estar pensando o mesmo. Mas desfrutei do tempo que pude.

Aos poucos, me familiarizava com meus arredores e os sentimentos dentro de mim foram se substituindo, um a um. A primeira perturbação foi se esvaindo e abrindo lugar para a raiva. Assim que tive acesso à plataforma de comunicação interna, digitei "Frank" na busca e lá estava: "Frank Anthony Thomas Iero Jr.", nada de Antônio. Eu conhecia o nome dele e o seu trabalho, já tinha lido algumas coisas, mas nunca tinha visto seu rosto. Por que ele tinha mentido o nome para mim? Eu realmente estava disposto a simplesmente esquecer essa história, mas agora a história em questão estava sentada a um metro de mim e eu teria que vê-la quase todos os dias pelos próximos meses.

Eu não aguentaria simplesmente não falar com ele para tirar satisfação. Ok, na prática ele não me devia nada, mas eu me conhecia e aquilo voltaria na minha cabeça. E como se não bastasse o lance do nome, ele ainda tinha me encontrado no metrô hoje de manhã (e duvido que não tenha me reconhecido) e resolveu ser gratuitamente grosso comigo. Será que fui tão ruim assim a ponto de ele querer fugir de mim igual o diabo foge da cruz? Além de irritado, ele já estava fazendo com que eu questionasse as minhas habilidades. Não havia nada que eu detestasse mais do que duvidar de mim mesmo, não importasse qual setor da minha vida.

Não muito tempo depois, Laura voltou para minha mesa e me levou para um tour inicial pelo escritório todo, me apresentando mais algumas pessoas, outras partes da redação, processos e tudo o que funcionários novos precisam saber em um novo lugar; pediu inclusive desculpas por não ter feito aquilo antes.

— Eu esperava que o Frank fizesse isso com você. Eu precisava resolver umas coisas logo cedo... Tadinho. Você ficou lá sem nem saber onde era o cantinho do café!

— Relaxa, Laura. Sei como são as coisas.

— Você e o Frank já conversaram? Imagino que ele já tenha começado a te passar as coisas.

— Bom, na verdade.... Ainda não. — Pigarreei, limpando a minha garganta. O normal de fato seria que logo de cara já conversássemos, mas estávamos ocupados tentando nos ignorar. De um jeito ou de outro isso iria ter que se resolver, afinal, iríamos trabalhar juntos. — Depois que você foi embora, eu comecei a arrumar as minhas coisas, e ele não falou mais nada.

— Que estranho. Ele é tão animado quando chega alguém novo, já quer fazer parte do comitê de recepção se possível... Se bem que ele chegou com uma cara emburrada hoje. Mas não se preocupe, até onde eu sei daqui meia-hora vocês terão reunião de núcleo. Vai ver ele preferiu falar tudo de uma vez...

Beleza do Caos [FRERARD]Onde histórias criam vida. Descubra agora