CAPÍTULO 51

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“Somos ensinados desde cedo a crer que tudo na vida depende das decisões que tomamos. Particularmente, acho que é uma responsabilidade e tanto. É mesmo esperado que alguém ainda em seus primeiros anos de vida consiga fazer as melhores escolhas? Tomar as melhores decisões a respeito de tudo e de todos? A margem de erro está bem ali, e é enorme. Não faço a menor ideia de para onde ir ou o que fazer quando a escola acabar. É assustador pensar em estar em um lugar diferente, com rostos completamente desconhecidos e longe dos meus avós. No entanto, sei que vou ter que fazer isso mais cedo ou mais tarde, então só posso torcer para que, quando a hora chegar, a minha decisão não faça com que eu me arrependa depois.”

Diário de Amélia, 20/09/2020

Amélia

No dia seguinte à cirurgia de segmentectomia feita por vovô, ele imediatamente já deu início a prática de algumas condutas de fisioterapia respiratória, sobretudo aquelas que eram técnicas reexpansivas (que basicamente consistiam em comprimir o tórax na expiração e descomprimir rapidamente para permitir a ventilação e o melhor funcionamento das vias pulmonares que foram comprometidas pelo tumor). Ele teve que passar por um período de observação para que o ritmo e a profundidade da sua respiração fosse avaliado pelos médicos em seu pós-operatório, a fim de checarem as melhorias e possíveis consequências do procedimento. Contudo, com pouco mais de três dias de exames e testes, a alta dele já havia sido prevista para o final de semana.

— Eu já contratei uma fisioterapeuta especializada para atender o seu avô quando ele voltar para casa — vovó disse, enquanto arrumava alguns dos livros favoritos de vovô em sua bolsa. Ela havia se acostumado ao hábito de ler para ele no hospital e agora a atividade já tinha se tornado uma coisa deles: várias das vezes em que eu entrava no quarto de vovô eu os pegava lendo em voz alta e rindo juntos. Era adorável. E, no que diz respeito a mim, era impossível não ficar radiante de felicidade ao vê-los bem de novo, sem que a sombra de uma doença pendesse sobre a nossa família. — Quero que ele tenha o melhor tratamento que puder mesmo quando deixar o hospital.

— Eu tenho certeza de que vai, vovó — falei, dando-lhe um beijo na bochecha. Peguei meu copo térmico com iogurte natural em cima da mesa, enquanto alcançava a alça da minha mochila. — Os médicos disseram que o quadro dele está apresentando uma melhora muito significativa desde a cirurgia. Logo, logo ele vai ficar curado. A senhora vai ver.

— Ele vai, não vai? — ela disse, soando mais como quem fazia uma afirmação do que com quem fazia um questionamento. — Eu tenho fé nisso. Sinto aqui dentro de mim que o seu avô ainda tem muita coisa para ver nessa vida.

— É claro que ele tem. Vocês dois têm — eu falo, tendo um leve sobressalto ao ouvir o som da buzina do lado de fora. — Parece que a minha carona chegou. Vejo a senhora no hospital depois da aula. Mande um beijo pro vovô.

— E você mande um beijo para a Ali. E não pule nenhuma refeição na escola. — ela advertiu, enquanto eu me encaminhava até a porta da frente. — Tenha um bom dia, querida! Eu te amo.

— Também te amo! — acenei, antes de ir para o lado de fora, dando de cara com Alison sorrindo loucamente dentro de um sedan prateado.

— Olha quem finalmente decidiu voltar para escola! — ela comentou, quando eu deslizei no banco do passageiro ao lado dela. — Melody está bem? Como estão as coisas com o seu avô?

— Graças a Deus, melhorando a cada dia. Ele vai estar em casa no final de semana — sorri de volta, empolgada com a expectativa de ter vovô em casa tão em breve. — E vovó te mandou um beijo. Mas e aí, qual o motivo da sua carinha tão energicamente alegre?

Relatos de uma garota que não liga pra você Onde histórias criam vida. Descubra agora