Relatos de uma garota que não liga pra você

CAPÍTULO 6

"Eu nunca leio as sinopses dos filmes. Sei que é estranho, mas gosto de me surpreender. Quando era mais nova, acabava assistindo uns filmes muito tristes sem querer e ficava pensando sobre eles durante semanas a fio, até assistir um outro que me impactasse tanto quanto o anterior. Hoje em dia, quando decido o que vou ver, já tenho um sexto sentido a respeito de se vai ou não me trazer lágrimas no final. Na vida, acredito que também seja assim: tudo é uma surpresa, mas depois de um tempo acabamos desenvolvendo um senso de autopreservação que nos possibilita escolher o que nos afeta. O que nos deixa mal, o que nos deprime. Preservar nossa saúde mental é um cuidado que todos deveríamos ter com nós mesmos. "

Diário de Amélia, 10/01/2019.

Sebastian

Em meu coração, ainda não acredito no que está acontecendo. A sensação é de ter um desejo realizado. Me sinto eufórico e ao mesmo tempo sei e não sei o porquê. Há pessoas que não acreditam em amor à primeira vista, e eu provavelmente seria uma delas, caso não tivesse acontecido comigo há tantos anos atrás.

Lembro como se fosse hoje: as cadeiras da sala estavam todas organizadas em um círculo e a aula era de artes. O sinal para o início do primeiro tempo havia tocado há cinco minutos quando uma menina de macacão jeans azul, camiseta rosa claro e all stars brancos entrara, o olhar fixo no chão.

Mesmo se não fosse tão bonita, ela ainda teria se destacado por ser a única sem o fardamento da St. Davencrown. Os cabelos divididos em duas tranças e a franja que ela nunca parara de usar. Até aí, só era mais uma garota bonita. Mas o professor perguntara seu nome e seus olhos cor de mel se ergueram diretamente para os meus quando ela respondera, em voz baixa:

Amélia.

Não sei a causa, não sei o motivo, mas me apaixonei perdidamente por ela. Meu coração bateu forte no peito e eu simplesmente soube que iria gostar daquela menina de macacão azul pelo resto da vida. Me pareceu certo. E de fato era certo; por nenhuma razão além de sermos Sebastian e Amélia.

E apesar de ser bom em falar com todos que conhecia, nunca me senti seguro o bastante para falar com ela. Nunca fui do tipo que tinha medo de ser rejeitado, mas com Amélia era diferente. Sempre que eu tomava uma decisão, uma voz surgia na minha cabeça dizendo que provavelmente ela não iria querer ouvir qualquer coisa que eu tivesse a dizer e que eu só estaria fazendo papel de bobo. Que era melhor continuar observando-a de longe do que tentar conhecê-la e fazê-la pensar que eu era um idiota qualquer.

Mas então ela aparecera no pub e olhara para mim. Para mim, com aqueles olhos adoráveis sob as luzes coloridas transparecendo admiração e foi o bastante para que não pudesse adiar mais.

O que eu ganharia gostando dela em silêncio? Verdade seja dita, observá-la de longe era uma tortura. Vê-la sozinha, vê-la melancólica. Indefesa e sem ninguém para tomar seu partido durante a confusão no bar. Não queria que ela se sentisse perdida, nem sem ter a quem recorrer. Queria que ela soubesse que tinha alguém que se importava, que desejava vê-la feliz.

E se ela acabasse por não gostar de mim, eu sabia que sofreria, mas não seria pior viver me perguntando o que poderia ter sido se eu tivesse sido mais corajoso e dito "olá"?

E quando finalmente tomo uma atitude, tudo dá mais certo do que jamais imaginei? Acompanhei a garota que gosto até em casa e deitei a cabeça no travesseiro sabendo que para ela não sou mais apenas Sebastian Dubrov, o cara que estuda na mesma escola e mora há duas casas de distância, mas sim Sebastian, um amigo.

Não consigo evitar o sorriso que insiste em se formar em meu rosto desde que estive com ela. Sou o primeiro amigo de Amélia Ruschel. Tenho até um título.

Sabendo que não vou conseguir dormir agora e nem tão cedo, saio da cama e pego minha guitarra ao lado do violão e teclado. Acendendo a luminária em cima da minha escrivaninha, me sento só de cueca na minha cadeira giratória e começo uma nova música.

Algo sobre uma menina de poucas palavras e olhares profundos.