Capítulo 19- Nua e crua

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Nua e crua

THIAGO

A verdade é sempre um caminho mais difícil e doloroso de seguir. Naturalmente buscamos pela omissão e as "meias verdades". Parece eficaz. Uma forma menos doída de encarar os fatos como são. Mas no fim, tudo se esclarece de uma forma ou de outra.

E agora ela está aqui, em carne e osso. Com os olhos carregados de dúvida e raiva.

— Por que...? Vocês...— Julaila dá alguns passos para trás, com um olhar enojado. Suas mãos tocam os lábios em sinal de surpresa.

Durante alguns minutos o silencio entre nós preencheu todo o espaço. A falta do que dizer, a traição entalada na garganta de Ju e a minha covardia tiveram a voz.

Eu não conseguia encara-la. Meus olhos passeavam por cada canto daquela sala, buscando por um lugar onde eu pudesse afundar meu rosto, e fingir que aquela situação não estava acontecendo. Eu tento me afastar de Gustavo, em lagrimas. Mas ele segura em meu braço firmemente. Nos seus olhos eu encontro algo inesperado; segurança. A certeza que eu não tinha de que tudo iria se resolver, estava em seus olhos. E de alguma forma aquilo me serviu de consolo.

Ele se levanta ainda meio tonto, e anda em direção a Ju. Quando ela se vira e o encara, ele para no meio do caminho.

— Há quanto temp...? — A voz embargada, a impede de completar uma frase.

Silêncio.

— RESPONDE — Sua voz estridente, me corta do dentro. — Há quanto tempo vocês estão mantendo essa nojeira debaixo do meu nariz?

— Eu vou pegar uma água, pra você se acalmar. — Gustavo diz.

— Eu não quero água, eu quero respostas. — É possível sentir toda a amargura no tom de sua voz. Ela dá alguns passos para trás, parando ao se esbarrar, na cômoda próximo a janela. — Eu quero saber, há quanto tempo o meu melhor amigo fica com o meu namorado. — Ela solta um sorriso sarcástico, limpando o rosto inchado de tanto chorar, e se volta para mim. — E você "Best"? Não tem nada pra dizer?

Minhas vistas queimam com as lágrimas que escorrem por meu rosto. A culpa de ter escondido tudo isso, e não ter sido sincero com ela, recai em minhas costas. Formulo mil frases. Tento pensar em mil coisas, mas não consigo. Não consigo pensar. Não consigo dizer nada. Balanço a cabeça, olhando para o teto. Passo os dedos por entre meus cabelos, e olho para o chão novamente.

— Aconteceu. — É tudo que sai de minha boca.

— Aconteceu? Só isso? "Aconteceu...". E os nossos anos de amizade? A nossa troca? A lealdade que existia entre a gente? Você resume tudo isso, em apenas uma palavra? "aconteceu"?

— Ju mas a gente não tinha mais nada. Você escolheu ficar e seguir com o seu intercambio, e eu voltei. Voltei separado. —Gustavo fala.

Ela ri. Uma risada cheia de escarnio. Completamente fora de controle.

— Não sobre nós, Gustavo — ela se vira para mim e completa. — é sobre a gente. É sobre ter honestidade, que você como amigo não teve. Preferiu sumir e fingir que estava sempre sem tempo. Preferiu ignorar mensagens e ligações. Me colocar em um lugar esquecida. Era melhor do que me encarar, e dizer que estava dando para o meu namorado. Ou melhor, meu "ex" namorado.

— EU NÃO QUERIA QUE FOSSE ASSIM. — Grito. — Mas nos... nos envolvemos.

— Então isso é tudo? — Ela diz. — Vocês se envolveram...

— O que mais podemos dizer? Não planejamos ficar. Eu voltei confuso... perdido. E de repente encontrei alguém que me desse o mínimo de atenção. Alguém que me enxergasse além de um corpo. Alguém que se importasse. — Gustavo meneia os olhos marejados, assumindo lugar na discussão.

Ela se vira de costas novamente, e o silêncio mais uma vez ganha lugar entre a gente. Ouço a respiração cansada de Julaila e o soluço diminuindo aos poucos. Quando nos encara novamente, suas mãos tocam a barriga na altura do útero. Ela se vira para mim e diz;

— Ele já sabe?

Meu corpo se enrijece. Olho para Gustavo, que franze as têmporas e em seguida encaro Julaila, ainda sem entender a pergunta.

— Me responde. Você foi capaz de dizer a verdade, ou foi para cama com ele sem contar sobre sua condição?

— Do que você tá falando? — Gustavo se vira para mim. —Thiago, o que ela quer dizer?

— Bom... eu não sei por quanto tempo, vocês estão "juntos". Então preciso saber se vocês se preveniram. Afinal de contas, não quero que meu bebê nasça infectado.

Automaticamente sinto as palmas da minha mão suarem. Mais uma vez me sinto exposto.

— Você é louca, garota? O que você está falando?

— Eu estou esperando um filho de você. E não quero que essa criança venha doente. Então que...

— CALA A BOCA — Uma repulsa se revira em meu estomago. Não consigo pensar. Quando vejo, meus dedos estão afundados em seu pescoço e só consigo sentir os braços de Gustavo me envolvendo por trás, e tentando me desvencilhar de Julaila. — CALA A BOCA CALA A PORRA DA BOCA.

Com sua força, ele consegue me tirar de cima dela. Julaila ri como louca. Seu rosto é uma mistura de dor e amargura. O som de sua risada me assusta. Minha respiração acelerada, não consigo reagir. Tudo que eu quero é sumir daquele lugar.

— Ele tem AIDS, Gustavo. O THIAGO É UMA BICHA INFECTADA COM A AIDS.

Aquelas palavras cravam em minhas costas como uma punhalada. Estou descoberto. Toda verdade derramada em minha frente.

Não tenho controle de nada, nem de mim mesmo.

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Gente, muito obrigado por continuarem acompanhando essa história. Faltam apenas mais alguns capítulos pra que esse conto chegue ao fim.
Eu tô liberando e não tô revisando, então me perdoe os erros. Mais tarde vou reler pra corrigir possíveis erros.

Um Hétero na minha camaOnde histórias criam vida. Descubra agora