Capítulo 20- Cacos pelo Chão

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Capitulo 20

Cacos pelo chão

THIAGO

Desde que quebrei, tento juntar os meus pedaços. Busco pelos cantos obscuros da minha alma, cada traço de mim espatifado pelo chão. Quando meus dedos tocam os cacos da minha existência, eles se cortam. Dos cortes, mais feridas. Flagelos de uma dor que não me deixa. E sempre que busco esconde-la, ou fingir que essa dor não está ali, alguém aparece e me mostra que ela ainda existe.

Estou exposto. Toda verdade está diante de nós, da maneira mais egoísta. A verdade é a mentira que escondi ao longo desses meses. A insegurança de não ser amado. De ser olhado pela minha sorologia, e não pelo que de fato sou.

Por trás de toda mentira, existe uma verdade. E por trás de toda verdade, existe o medo, as inseguranças, as mazelas jamais reveladas. Que agora da forma mais agressiva, Gustavo pode olhar e contemplar os cacos, as feridas e o sangue que escorre de dentro de mim, denunciando cada traço da minha não aceitação.

***

O choque assume as feições de Gustavo. Aquele momento se paralisa diante de mim, e eu consigo sentir a tensão em cada um de nós no meio daquele apartamento. Ele encara Ju, que está rígida  pelo o que acabou de dizer. Depois seu rosto se vira para mim, completamente sem vida. As lagrimas escorrem involuntariamente, e eu não consigo identificar o que dói mais nele, nesse momento; a mentira, ou saber que sou soropositivo e que de alguma forma, ele pode estar infectado.

Seus olhos procuram por uma direção, até encontrar os meus. Eles ainda estão perdidos. Vagueando por cada canto da sala, meio que digerindo cada palavra dita por Julaila.

Nesse momento não consigo enxergar ninguém além de nós. Eu e ele, diante de tudo que vivemos. Mas também diante de toda verdade, que pode apagar os meses mais lindos da minha vida em um instante.

Vou dando passos curtos em sua direção, mas Gustavo se afasta com lágrimas nos olhos. Eu tropeço e caio de joelhos, quando dou conta de mim estou agarrado a suas pernas, com toda força que ainda me resta. Minhas lagrimas empoçam no lugar onde meu rosto está encostado.

— Me perdoa. — É tudo que consigo dizer.

Ele se abaixa devagar, se desvencilhando de meus braços envolvidos em suas pernas, até estar no chão olhando para mim.

— Me deixe ir.

Eu seguro em sua mão com toda força. Busco o ar para formar qualquer frase ou palavra, que o convença me escutar, mas falho miseravelmente. Meus pulmões estão ocos. Eu estou oco.

— Por favor, me deixe ir embora. Eu...

Ele chora. Um choro honesto, e doído. Os soluços o impedem de continuar. Ele beija minhas mãos e se levanta, me deixando no chão sozinho. Sua silhueta desaparece nos umbrais da porta. 

Ao ouvir o barulho da porta se batendo, a dor aumenta dentro de mim. Tento me levantar, mas o corpo não responde a nenhum comando que tento emitir. Mais uma vez os cacos estão espalhados pelo chão. Mas desta vez, me faltam forças para me recolher. As feridas dos meus dedos ainda não cicatrizaram dos cortes anteriores.

***

O silêncio que permeia, pesa todo o ambiente. Levanto a cabeça para me certificar de que Laila se foi, e percebo que de fato estou sozinho. Todo o meu corpo dói. Cada articulação, cada membro, cada osso. Tudo em mim geme, com a ferida que foi aberta. Revezo entre chorar, e sentir cada pontada que perfura minha alma.

Não encontro meios de amenizar tudo o que estou sentindo. Não quero encarar os fatos. Não quero encarar os mares revoltos do meu interior que durante tanto tempo eu evitei. Preferi fingir não existir. Não quis mexer nesses lugares.

Como seguir em frente?

Vou andando até o quarto, abro meu guardo e alcanço minha caixa de remédios. Meus olhos procuram pela solução da forma mais simples e definitiva na sua essência.

Ali está minhas cartelas de remédios para dormir. Vou tirando cada comprimido da cartela. Cada capsula que cai na palma de minha mão parece o anuncio do alivio eterno. Não consigo contar quantos comprimidos estou segurando, apenas o encaro. Mais uma vez busco pelo ar. Quando não o sinto, coloco todas as capsulas em minha boca e os engulo em seco. Elas descem como pedra arranhando as paredes da minha garganta. Eu as forço para dentro, com a ajuda da minha saliva.

A vista embaça, tentando encontrar o seu foco. Meus olhos pesam. Pesam até a escuridão assumir o seu lugar. Até tudo em minha volta se tornar negro como a minha alma. Até o sono sem sonhos me tomar.

******
Oi, gente !!!
Tudo bem ? Espero que esteja.
Estou passando por um processo muito dolorido de separação, então está muito doído continuar escrevendo. Espero que vocês entendam. Eu tô demorando super, mas vai saindo aos poucos.
Beijo no coração de vcs e fiquem bem ❤️

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⏰ Última atualização: May 06, 2021 ⏰

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