No dia seguinte, eu voltei ao trabalho no horário de sempre. Lara estava distraída com uma revista e nem me viu chegar. Guardei minhas coisas no gancho com o meu nome embaixo e, ao lado dele tinha um bilhete com coisas a serem feitas, deixado por Francesca.
Aquele dia ela ficaria fora, mas jamais deixaria de dar as ordens. Minha vida era parecida com a da Cinderela ou era só uma coincidência?
Comecei trocando os lixos e esvaziando a despensa. Depois eu teria que jogar fora os produtos vencidos e organizar tudo novamente nas prateleiras, por ordem de data de validade. Instruções bem claras diziam que eu deveria limpar seu escritório sem tirar nada do lugar, o que era um desafio. Depois limpar as janelas, mesas e piso.
Tudo normal.
Comecei os trabalhos pelo escritório, pois eu sabia que lá estaria uma zona, era capaz de Francesca picar os papéis e jogar no ar só para eu ter que juntar um por um depois. E eu não estava errada.
O carpete vermelho desbotado estava cheio de manchas de lama, sucos e comida. Os vidros, cheios de marcas de dedos e cocô de passarinho. A sala cheirava a cigarro. A mesa de madeira que ficava ao centro estava abarrotada de papéis e a cadeira (a qual um dia fora preta) que a acompanhava estava... SUJA.
Enfim, uma bagunça imunda.
Limpei e abri as janelas e os armários primeiro, aquele ambiente precisava de um ar. Depois organizei os papéis e os coloquei em uma pasta, tirei o pó e o lixo, passei aspirador no chão e por último, me concentrei em tirar aquelas manchas do carpete e da cadeira.
Cerca de duas horas depois estava tudo limpo, e eu rezava para que permanecesse assim, porém, minhas preces seriam em vão.
Preparei a solução com água e limpador de pisos e coloquei em um balde e preparei outra com água e sabão para as janelas.
Quando estava levando os baldes para o ambiente de clientes ouvi:
— Desculpe, ela ainda não chegou, mas se quiser esperar, ou que eu avise que esteve aqui... — Era a voz de Lara.
Pensei que era alguém à espera de Francesca, até ouvir a voz e a resposta.
— Não não, tudo bem, eu ligo para ela depois...
Andei mais depressa e ainda confusa pela intenção de sua presença ali, o chamei.
— Levi? — Soltei os baldes no chão e tirei as luvas da mão.
Ele se virou surpreso e sorriu.
— Bri Bri, achei que não estava aqui...
— Eu estava lá nos fundos — respondi e me virei para Lara que observava a situação com interesse — Aliás, bom dia amiga! Estou aqui a mais de duas horas e você não notou. — A provoquei.
— Estava lendo meu horóscopo — justificou. — Ele disse que eu iria conhecer o amor da minha vida hoje, isso significa que o John e eu estamos perdendo tempo — continuou com suas teorias. — Mas parece que li o seu por engano... — piscou para Levi que sorriu em cumplicidade.
O Levi, amor da minha vida? Esses horóscopos são bem exagerados!
— Então... — Me virei para Levi ignorando os olhos atentos de Lara. — O que faz aqui?
— Vim te dar bom dia, não posso? — Ele ergueu a sobrancelha.— No meu horário de trabalho?
— Tem hora melhor?
— Pare de responder minhas perguntas com perguntas!
— Pare de ser chata e venha me dar um beijo!
Semicerrei os olhos e cruzei os braços, estava pronta para levar aquela disputa a diante quando minha saia do uniforme foi puxada levemente por uma boca canina.
— Titan! — sorri e me abaixei para ficar na sua altura. — Bom dia pequeno. — Ele me abraçou com as perninhas e eu fiz carinho atrás de sua orelha e nas costas.
O pequeno usava um cachecol verde no pescoço, o meu cachecol, e estava uma graça.
— Aí amiga, se eu fosse você beijava o cachorro e o gato, quem perde tempo se arrepende!
Olhei brava por cima do ombro para Lara que comentava com descaso.
— Lara, você pode fazer um café com açúcar e chantilly para mim enquanto eu falo com o dono deste cachorro fabuloso, por favor? — falei distraidamente enquanto acariciava Titan.
— Só se for agora!
Ela levantou da banqueta com um entusiasmo impressionante e foi preparar o café. Andei até uma mesa e Levi me acompanhou.
— Ah, eu já ia esquecendo, isso é para você! — Me estendeu uma margarida amarela.
— Por qual motivo? — perguntei aceitando-a.
— Pare de ser tão desconfiada de tudo mulher — provocou. — Eu tenho que conquistar minha futura esposa de um jeito ou de outro né?!
Eu ri e senti o cheiro da linda flor. Deixando para contrariá-lo depois, apenas aproveitei a sua breve companhia.
— Com licença... — Aguém tocou no meu ombro.
Voltei a minha atenção para o dono daquela mão envelhecida e calejada, provavelmente de trabalhos pesados durante sua longa vida, e sorri o reconhecendo de imediato.
— Ah, olá! Como vai o senhor? — perguntei animada e me levantei para cumprimentá-lo com um aperto de mão.
— Muito bem querida — beijou as costas da minha mão. — Emely, é essa a senhorita que lhe enviou os cookies que você adorou.
Uma senhora, de cabelos brancos encaracolados, suéter estampado e calças claras, tinha a feição serena e corada de frio, além de um belo sorriso.
— Sério? É um prazer conhecê-la! — Me deu um abraço caloroso. — Héber não via a hora de te apresentar para mim, ele disse que conheceu uma bela moça com um dos corações mais bonitos que já vira, e eu como a curiosa que sou, tive que conhecê-la também.
— Fico muito feliz que o senhor tenha voltado! E é uma honra conhecê-la! Seu marido me falou muito da senhora e eu estava ansiosa para conhecer a mulher que faz ele se apaixonar cada dia mais...
— Ah. — Ela sorriu e apertou carinhosamente o braço do marido. — Ela é um amor mesmo!
Eu sorri, encantada com aquela prova do tempo e amor. Aquele casal era de se inspirar e eu já estava completamente apaixonada por Héber e Emely.
— Você é o moço das flores né? — Emely se virou para Levi.
— Flores? — perguntei antes que ele respondesse.
— Sim, posso me sentar?
— Claro!
Puxei a cadeira para que ela se sentasse e Héber se sentou ao seu lado, me sentei ao lado de Levi e a adorável senhora continuou sua narração.
— Tinham dois irmãos órfãos aqui pertinho, eles estavam vendendo margaridas amarelas para poder pagar a pensão em que estavam morando e comprar comida. Eu e Héber íamos comprar algumas, para ajudá-los, quando este belo rapaz — apontou para Levi — esvaziou a carteira e deu todo o seu dinheiro para os meninos, que foram embora saltitantes e com lágrimas nos olhos. Depois ele se virou e distribuiu as flores para as pessoas que passavam na rua, inclusive para mim — sorriu. — Vocês dois tem belos corações, não me admira que sejam namorados.
Eu estava perplexa demais para responder. Alguém que sempre usava de motivos supérfluos para se justificar (como por exemplo: o motivo de ele me dar a flor era para me conquistar) estava somente encobrindo suas verdadeiras ações, suas belas ações, as quais teriam me conquistado de primeira se eu soubesse antes.
— Nós ainda não somos namorados...

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𝙏𝙞𝙩𝙖𝙣, 𝙤 𝙘𝙖𝙘𝙝𝙤𝙧𝙧𝙤 𝙘𝙪𝙥𝙞𝙙𝙤
ChickLitUma visita inesperadamente fofa e peluda aparece à porta de Brianna, com a língua de fora, olhos brilhantes e em busca de carinho. Curiosamente ela decide cuidar de seu novo amiguinho. Até que o nome e endereço do cachorro aparecem escritos na colei...