Capítulo Doze

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Todos já tinham ido dormir, Abigail começou a roncar na cama de cima. Pensei milhares de vezes se aquilo seria uma boa ideia ou não, mas meu coração que me guiou.

Calcei minhas botas de forma silenciosa, dessa vez eu ainda estava com a mesma roupa que sai a tarde, peguei a bolsa da loja com cuidado e sai do quarto sem acordar Abigail.

Andei pelo corredor, subi as escadas indo para o convés de cima. O céu estava completamente escuro e com estrelas, a lua brilhante cheia no céu. O navio era iluminado por velas em suportes, Jack cuidava do timão.

Fui a cabine de Crosswell que ficava no convés, levantei a mão para bater na porta mas hesitei, estava tudo silencioso, apenas o som do mar.

Respirei fundo e bati três vezes na porta, não de forma forte. Dei um passo para trás e apertei com mais força a alça da bolsa da loja.

Passos se aproximaram e Crosswell abriu a porta, para minha sorte ele estava sozinho, isso tornava menos constrangedor. Ele não usava o casaco, apenas a blusa azul escura, mangas arregaladas até o cotovelo, calças marrons escuras e botas até metade da panturrilha.

- O que foi?

- Eu...eu...- não sabia o que falar.- Eu queria saber se você quer beber comigo, uma coisa diferente do que rum, só tem rum nesse navio.- ele apoiou o braço na porta.

- O que seria?- tirei da bolsa uma garrafa com o líquido transparente, ele olhou o rótulo.- Nunca tomei.

- Prometo que não vai se arrepender, comprei mais duas para a tripulação depois.

- E eu aqui achando que você era uma simples garota, uma que se comportava perto dos pais.- ele disse entrando dentro do quarto e pegando dois copos limpos.

- Se continuar com esses comentários, eu bebo sozinha e quebro a garrafa vazia na sua cabeça.- já vi um homem fazendo isso em uma briga de taverna, Crosswell deu um sorriso sem mostrar os dentes enquanto fechava a porta.

- Fofa...vamos.- ele passou por mim e eu o segui até as escadas para o convés superior na ponta da frente do navio.

Nos sentamos no chão, ele apoiou as costas na madeira da borda do navio. Coloquei a garrafa na minha frente, tirei da bolsa os limões e o saco com sal, Crosswell olhou curioso.

Cortei um limão no meio com a faca que tinha pegado escondido de Abigail e depois em duas fatias, abri o saco de sal e a garrafa enchendo nossos copos.

- Tá, é simples. Você vai colocar o sal na sua mão.- coloquei um pouco de sal nas costas da minha mão.- Depois a regra é simples, você vai lamber o sal, tomar a bebida e depois chupar o limão.

- Por que?

- Apenas confie em mim.- ele me olhou e depois fez o mesmo que eu, na outra mão eu segurei meu copo.

Lambi o sal, bebi a bebida e depois coloquei o limão na boca chupando o líquido. O áspero e o picante da bebida desceram pela minha garganta mas o sabor suavizou com o suco do limão, fiz uma pequena careta e ri fraco tirando o limão da boca.

- Viu? É fácil.- Crosswell fez o processo, ele colocou o limão na boca mas logo o cuspiu.

- Puta Merda!- disse fazendo carente e virando o rosto de lado.

- O limão.- enfiei a fatia na sua boca e ele mordeu a mesma.- Fez errado, tem que tomar logo o suco do limão, se não só vai ficar o picante da bebida.

Crosswell fez de novo, mas dessa vez mordeu o limão no momento certo.

- Conseguiu? Gostou?

- É...interessante. Nunca provei uma bebida picante, parecia que eu tomava pimenta pura. O sal não fez muita diferença mas o limão ajudou.- jogou a casca do limão no espaço para o lixo.- Mas definitivamente quero outro.- sorri.

Tomei outro e depois parei para cortar mais limão.

- Onde aprendeu isso?

- Essa bebida está famosa no continente todo, vi meu pai tomando dessa forma com os amigos na minha casa, não é algo difícil. Quando meus pais dormiram, fui para a cozinha e provei sozinha.

- Levada, que feio.- apontei a faca para ele e ele sorriu fraco.- Devo dizer que eu fiquei surpreso com você na minha porta. Por que está fazendo isso?

- Para você provar um pouco de como é o continente,  na próxima parada, eu posso trazer alguns doces e salgados, qualquer coisa.- disse, essa foi a ideia que eu tive no começo, quando vi seus olhos tristes enquanto eu saia do navio.

- Eu nasci no navio, meu pai era o capitão, minha mãe era uma mulher que entrou no navio durante uma das paradas. Eles se apaixonaram e me tiveram, como não temos um equipamento adequado, minha mãe morreu no parto.- ele engoliu a seco.- Meu pai me criou junto com os seus tripulantes, ele foi o melhor pai do mundo. Mas morreu quando eu fiz dezoito, então eu virei capitão e assumi a responsabilidade de achar o santo.

- Meus pêsames.

- Tudo bem, é passado. Não gosto de revivê-lo, prefiro o presente.- ele tomou outro gole da bebida.

- Então essa tripulação...

- Muitos são filhos e alguns pais, outros são pessoas aleatórias que entraram no navio sem saber da maldição.

- Bom, quando ela for quebrada, você vai estar livre.- tomei outra bebida e chupei o limão.

- Eu sei, eu gosto do navio, amo o mar. Mas quero conhecer as montanhas, vilarejos e cidades, coisas que meu pai, minha avó e meu bisavô não conseguiram conhecer.

- O seu trisavô, ele...- desisti de falar quando percebi que Crosswell fechou o rosto e segurou o copo com força.

- Meu trisavô e sua tripulação que causaram a fúria dos Santos.

A Maldição dos SantosOnde histórias criam vida. Descubra agora