Afraid - Medo Invisível

Novos sentimentos

A escuridão infinita era o vazio que me preenchia. Sentia uma completa exaustão impedir-me de abrir os meus olhos. As imagens, os sons e os cheiros dissolveram-se aos poucos me abandonando, me esquecendo, me deixando à deriva na solidão íntima e silenciosa de mim mesmo.

Ao longe, fora dos meus estados confusos e exaustos, um timbre conhecido e familiar me invocava novamente para a vida, no entanto, o sono persuadia-me a continuar parado e inativo. Era muito mais confortável e fácil, do que acordar. Mas aquele timbre, daquela voz com seu tom grave e seguro, ao ser soado dizia que eu poderia despertar sem receios em uma confissão quase secreta. E assim eu fiz.

Sentia ter despertado de uma hibernação, quando abri meus olhos e acordei no meu quarto. A primeira pergunta foi: como eu tinha chegado ali? Com os olhos vagando ao redor do espaço, as chocantes imagens que eu tive que presenciar ressuscitaram repentinamente assombrando-me outra vez.

O corpo de Yuta sendo jogado na piscina, seus misteriosos olhos me focando do lado da morte, o sangue tingindo as águas de vermelho e aquela figura, que tornou-se a concretização dos meus maiores medos, tentando me dilacerar com sua lâmina.

O coração voltou a bater forte, minha respiração desregulou mais uma vez, os olhos vermelhos que já estavam cansados de chorar começou a lacrimejar e a profusão de sentimentos e sensações repetiram seus tormentos.

Antes de me alastrar em completo pânico e desespero levantei rapidamente da cama e respirei fundo. Buscando o mínimo de concentração voltei a escutar a voz que havia me despertado ecoando até mim e eu a reconheci de imediato. Era Lucas.

Descalço, andei a passos cuidadosos saindo do quarto, e seguindo pelo corredor desci as escadas com cautela em direção ao living. Os passos silenciosos pararam quando percebi que Lucas falava ao telefone enquanto distraidamente tocava a fileira de discos na minha estante.

Vê-lo ali, vivo e aparentemente bem, provocou em mim uma sincera sensação de gratidão, foi o primeiro sentimento bom que eu estava tendo desde que tudo começou a virar um completo caos na festa. Não tentei entender o porquê do meu coração se sentir aquecido com a simples visão de Lucas, mas foi o suficiente para eu me emocionar.

— Eu estou bem Xiaojun! Eu já lavei os cortes e fiz um curativo, não precisa ficar preocupado, de resto deve ter sido alguns hematomas somente. Eu já disse que estou bem!

Era mentira, de onde eu estava dava para ver que ele só tinha enrolado desajeitadamente o braço com um tecido sujo e os ferimentos feitos pela lâmina encharcaram-se de sangue. Ao notar aquilo o sentimento de culpa voltou sobre mim, se eu fosse mais forte e reagisse de outra maneira, nada daquilo teria acontecido.

— Não voltarei hoje, tudo bem? Ele ficou em estado de choque, acabou desmaiando e eu o trouxe para casa. Será melhor ficar aqui para mantê-lo seguro e eu estarei mais despreocupado assim. Por isso, se possível, eu ia pedir que você levasse as flores hoje, ontem eu levei girassóis, mas acho que ele gostaria de rosas.

A voz de Lucas entristeceu-se como eu nunca tinha visto, a fragilidade que eu sempre via em mim em poucos segundos reproduziu-se nele destoando completamente do homem forte e seguro de sempre. Mas de quem ele estava falando? E o que eram essas flores?

— Do que você está falando? - Wong gaguejou e pareceu desconcertado, me lembrou de como Xiao o deixava desestabilizado da pose artificial de oficial, agora que eu os olhava apenas por meio da relação de irmãos eu conseguia imaginar o médico nervoso dando broncas no quase irmão por coisas banais e corriqueiras, e isso era engraçado, ao passo que transformava Lucas em uma criança crescida.

— Não é nada disso que você está pensando, eu só estou preocupado com a segurança dele! - Acabei corando ao ver o oficial sem jeito, pois já imaginava com o que Xiao estaria o provocando. - Não tenho tempo para essas coisas Xiao! Eu vou desligar, você imagina coisas demais!