Amherst, Massachusetts. 1868.
....
Alguns anos depois...
Coração, nós o esqueceremos!
Eu e ti, hoje à noite.
Devo te esquecer do acalento que ele nos deu,
que eu me esquecerei do fogo.
Quando houveres o feito, diga-me
te suplico
Que aos meus pensamentos encobrirei.
Apressa-te! Que enquanto te tardas,
dele ainda me lembrarei.
Termino de ler, vendo a pequena Mattie ao meu lado exibir uma expressão desentendida das minhas palavras. Ainda era jovem demais para compreendê-las, mas mesmo assim, amava escutá-las.Estava com dez anos, a mesma idade que eu tinha quando conhecera sua mãe. Espevitada e belíssima, usufruindo de seu cabelo em corte curto e uma franjinha, a qual tinha se tornado sua marca registrada. Quanto mais o tempo passava, mais ficava parecida com Sue, o que me levava a agradecer a Deus sempre que podia. Também era inteligente e possuía um coração invejável, solidário e amoroso, como poucos na família. Era a alegria da casa, correndo para lá e para cá com seu vestido godê o dia inteiro, girando e girando, parecendo até uma bailarina. No momento, estamos sentadas abaixo da macieira como fazemos todas as manhãs, geralmente, sou acordada por ela para irmos passear. Tenho um bolo dos meus poemas em mãos e já li quase todos, a pedido dela também. Dizia que queria escrever como eu, pois apreciava o gênero poético. Eu sabia que sim e também sabia que seria tão poetisa quanto sua tia futuramente.
一Por que devemos esquecer o coração? 一ouço sua voz doce quebrar o silêncio que se instala após eu terminar de ler.
一Não é que devemos, mas às vezes precisamos.
一Por quê?
一Digamos que o coração não é tão habilidoso quanto a fazer escolhas certas. Sempre que nos deixamos levar por ele, somos apunhalados pelas costas.
Ela continua aparentando não entender nada, o que me faz querer rir.
一Mas... Do que a senhora está falando? É sobre se apaixonar?
一Não só isso, minha amada, mas ainda é cedo para que entenda. Te garanto que um dia irá ler esse poema novamente e entender tudo.
一Vai dá-los para mim?
一Para ser sincera, não costumo dá-los para ninguém. Nunca nem os mostrei para alguém que não fosse a sua mãe. Mas, quem sabe...
Bagunço um pouco seu cabelo com a mão, a vendo sorrir.
一Ah, então vocês estão aí 一ouço a voz de Sue, levantando a cabeça para vê-la caminhando em nossa direção.
一Sente-se, mamãe, a tia Emily está lendo os poemas dela!
一Eu adoraria, mas estou atarefada. Só vim checar se estavam bem.
一E por que não estaríamos? 一pergunto.
一Não sei, foi uma precaução.
一Mães são mesmo precavidas.
一Tia Emily, por que a senhora não tem filhinhos?

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Com amor, Emily.
Romance1857. O ano em que Emily Dickinson (Hailee Steinfeld), uma poetisa na qual o mundo nunca viu igual, se encontra em um particular dilema: encontrar um marido ideal para enfim sair da casa de seus pais. É claro que a mesma nunca quis nada disso, óbvi...