Eu só me meto em furada, puta que pariu! Além de ajudar e tratar dos ferimentos do garoto zumbi, preciso dormir no chão, porque não me sinto confortável em dividir a cama com ele.
O colchonete é duro e pinica, porém, sou vencido pelo cansaço e acabo dormindo. À noite, ainda mais nos dias mais estressantes, eu lembro de tudo. Recordo dos toques. Dos palavrões. Eu não queria. Ele me forçava.
— Não quero! — gritei, levantando assustado e suado, mesmo a porra do termômetro marcando 9º graus. — Puta que pariu.
— Você está bem? — perguntou uma voz fraca, que fez o meu corpo estremecer, porque pensei se tratar de um espírito.
— Cacete! — fiquei em pé.
Demoro mais do que o normal para lembrar do "defunto" que dorme na minha cama. O tico e teco não funcionam sob pressão. Na penumbra do quarto, consegui ver a silhueta dele deitado.
Recuperado do susto, mas ainda desconfiado, ligo o abajur e uma luz amarela ajuda a identificar o rapaz. A única coisa que consigo ouvir é sua respiração ofegante.
— Cara, quem é você? — perguntei me aproximando.
— Onde eu estou?
— Não se responde uma pergunta com outra. — me controlei para não disparar um palavrão. De acordo com a Izzy, o meu único defeito é a boca suja e, infelizmente, não consigo ser de outro jeito.
— Desculpa. Eu estou com sede. — avisou o rapaz.
Respiro fundo e sigo para a cozinha. Encho um copo de vidro com água e caço o canudinho de bambu que a Izzy comprou na sua fase natureba. Volto para o quarto e o garoto continua na mesma posição, porém, os seus olhos fitavam cada parte do meu quarto, acho que procurando uma rota de fuga.
— Toma. — falei me abaixando e colocando o canudo em sua boca.
O garoto toma a água do copo desesperado. Não imagino o que ele passou e estou começando a me arrepender em tê-lo ajudado, afinal, ser um Garoto de Programa já é ruim aos olhos da sociedade, imagina ajudando algum pilantra.
— Olha, eu não quero confusão. Eu apenas te ajudei. Seja lá o que vou aprontou, Garoto Zumbi, eu não me importo. — avisei deixando o copo sob a mesa de cabeceira.
— Eu não sou um marginal. — ele respondeu. Agora, pude reparar um pouco mais na voz dele. Um tom doce e pacato. O tom de alguém que não se meteria em confusão. — Digamos que é um problema de família. Realmente, não quero te envolver. Eu só peço um tempo. Posso te ajudar com dinheiro, não se preocupe.
— Puta que pariu. — soltei, impaciente. — Mas, preciso de um spoiler, cara.
— Spoiler...
— Drogas? Mulher? Acerto de contas? — fiz uma sequência de perguntas com possíveis motivos para ele ficar naquele estado. O menino pareceu confuso e apenas negou com a cabeça.
— Nenhum deles. Digamos que cobiça. — ele se limitou a dizer, puxando o cobertor contra o seu peito.
— Eu posso saber a sua graça? — perguntei de forma irônica. — Não aguento mais te chamar de Garoto Zumbi.
— Miguel. Miguel Arnault. E o seu?
— Cacete, que merda de nome difícil. Opa, desculpa o meu modo. — soltei. — Eu me chamo Stefano, mas pode me chamar de Stef.
— Obrigado, Stefano.
— De nada. — falei esfregando minhas mãos por causa do frio. — Bem, vamos dormir? Pela manhã, conversamos mais.
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Apenas uma regra
RomanceA madrugada de São Paulo é viva. Pessoas vêm e vão, algumas em busca de diversão, outras de prazer ou em busca de uma nova perspectiva de vida. E é justamente quando a cidade dorme que o jovem Stefano Arcanjo se transforma em Alejandro, o Garoto de...