J de Jogo

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Sinopse: naquele cassino, Marco deixou muito além de suas fichas.

Aos 43 anos, tudo o que Marco desejava era não ser um maldito viciado em jogos de azar, mas por infortúnio do destino, quando menos esperava estava caminhado para o cassino de sempre, gastando seu salário com fichas e jogos aos quais em algum momento sempre acabava perdendo.

Dessa vez optara pelo poker, não por ser um exímio jogador de cartas ou por saber blefar, muito pelo contrário, apesar de dominar as regras na palma de sua mão era péssimo em mentir, não tinha o mínimo de vocação para os blefes.

Na verdade optara pelo jogo pelo novo funcionário que estava como dealer daquela mesa. Nunca o vira antes e se surpreendeu ao notar a beleza radiante que ele emanava, não só isso, o jovem tinha uma aura de pura confiança que parecia transpassar para os demais ao seu redor, além dos olhos obscuros e misteriosos que o instigavam a desvendar cada pequeno segredo de suas íris flamejantes.

O loiro sentou-se a mesa onde a rodada estava prestes a começar, as fichas estavam a sua frente assim como o dealer moreno de belas sardinhas respingadas aleatoriamente em suas bochechas e nariz.

Pode ler o nome do rapaz na pequena placa presa em sua roupa, um nome que certamente combinava com o que fazia. As cartas rapidamente foram distribuídas, as orbes celestes não abandonavam por um segundo sequer os dedos delgados e ágeis deslizando pelas cartas, fazendo-as percorrer a mesa e parar em frente aos jogadores, aquelas mãos eram delicadas e pareciam flutuar no ar conforme virava as cartas.

Quando a voz macia se dirigiu a si questionando-o sobre sua aposta, o loiro perdeu a fala, sentindo um súbito calor subir por sua face, fazendo o dealer rir baixo de sua reação e lhe direcionar um singelo, mas intenso sorriso.

A primeira rodada de apostas fora feita, pelos olhares já era possível vislumbrar qual dos homens ali a mesa era o maior apostador de todos, as orbes ferinas deram seu bet [1] e o loiro soube naquele momento que era uma draw dead [2] para si, não escaparia daquele jogo tão fácil.

As três primeiras cartas foram viradas, durante o flop [3] a infinitude negra se voltou para o loiro, um brilho indefinido brincando em suas íris, fazendo-o desejar não parar com as apostas, como se por aqueles instantes tivesse a falsa ilusão de que pudesse ganhar com um straight flush [4].

Não precisou de palavras para que o loiro soubesse que o dealer apostara suas fichas em seus olhos, naquela intensa troca de olhares, nos pequenos e discretos sorrisos que lançava, entendendo perfeitamente que a cada rodada tinha o loiro cada vez mais preso em suas mãos.

Marco continuou a apostar, mesmo tendo o conhecimento de que perderia, jogou suas fichas sobre a mesa, viu-as sumir pouco a pouco até não lhe restar mais nada, nenhuma única ficha, nenhuma só nota, havia apostado tudo naquele jogo e perdeu.

Os demais jogadores saíram da mesa, alguns felizes com suas apostas, outros desolados e de mãos abanando. Marco foi o último a se levantar, seus olhos acompanhando o moreno a embaralhar as cartas enquanto sustentava o choque entre suas orbes.

Outro sorriso lhe foi direcionado e por não ter mais nada o que apostar, Marco deu como bet o seu coração.

Aquela fora a última noite de apostas para o loiro, havia perdido tudo e saíra só daquele cassino, nem ao menos a pulsação de seu coração lhe pertencia.

Tudo fora levado pelo grande vencedor da noite, o rapaz bonito e atraente com nome de carta: Ace.

[1] Aposta

[2] Quando o jogador não tem mais chances de ganhar uma mão mesmo antes de acabar.

[3] refere-se as três primeiras cartas comunitárias do poker.

[4] melhor mão do poker, uma sequência de mesmo naipe.

Marace - alphabet projectOnde histórias criam vida. Descubra agora