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No dia anterior do vôo recebi uma mensagem do Gustavo, que passaria para me buscar às 17 horas. Desde aquele dia que ele chegou não tínhamos mais nos visto e aquela era a segunda mensagem que ele me mandava.

Continuei arrumando minha mala, não podia esperar que ele viesse como uma melhor amiga tão próximo. Existiam 5 anos de separação e tantas coisas já tinham acontecido na vida dos dois. Ele poderia estar mais longe também por essa questão do Benjamin e o beijo que aconteceu antes dele ir embora. As vezes me perguntava se realmente tinha acontecido ou se era só uma imaginação muito real.

No dia seguinte ele ligou 16h50, já estava em frente ao prédio. Não, não iria subir. Desci com minha mala e tendo aquele misto de ficar sem chão com o mundo parando quando o vi em pé ao lado do carro me encarando.

Sim, não tinha sido um susto do dia. Ele estava ainda mais bonito. Usava agora o cabelo mais comprido, de forma que tinha um movimento jogado para o lado e uma franja que caía nos olhos verdes conforme o vento batia. E aquela barba? Estava maior, só que era muito mais bigode do que no resto do rosto e ia junto com o sorriso me cumprimentando. Nunca imaginei que acharia um bigode tão bonito.

Agradeci ter colocado os óculos escuros, talvez disfarçasse meu desconcerto quando saí e ele me deu um abraço perguntando se não tinha esquecido nada. Neguei, forçando um sorriso, entrando no carro antes dele pra respirar.

_Você está em uma ótima localização, quase na entrada do campus.

_Sim, uma pena que não deu tempo de você subir pra conhecer. Lá da sala temos uma boa vista.

_É, venho outro dia com calma. Não consegui parar desde que cheguei em São Paulo, estou ficando no apartamento o Murilo, lembra dele? - concordei, era um dos poucos amigos dele da época da faculdade que eu conhecia - ele mora próximo daqui e tem um acesso rápido para obra... Mas quando voltar desse recesso quero ver se alugo um pra mim lá no centro.

_Não sabia que obra parava nessa época de final de ano.

_Na verdade não vai parar, mas como eles estão atrasados com as aprovações das plantas, nos dispensaram esses 20 dias pra correrem com isso - concordei, reparando que aquela ansiedade já estava diminuindo e que começava uma música da Baiana System. Sorri, tinha conhecido pelo Benja e era apaixonada pela banda. Comecei a bater os dedos na perna no ritmo, ele aumentou o som - Não sabia que você gostava deles.

_Fico surpresa de você conhecer, não sabia que já eram famosos na Europa.

_Conheci em um festival em Nova Iorque ano passado. Virou uma das minhas bandas preferidas, quero ver se consigo ir ao bloco deles enquanto estiver aqui no Brasil - encarei-o surpresa, outra coisa que não poderia imaginar. Me dei conta que não sabia nada sobre aquele homem dirigindo ao meu lado.

_Uau. Conheci mês passado pelo Benja e já estava me sentindo super à frente dos lançamentos.

_Fui ao show para outra banda, assisti ao show deles na surpresa se isso te conforta - ele riu, cantarolando junto com a música e trocando a playlist pra continuar tocando os outros discos deles, cortando qualquer assunto com os dois cantarolando no ritmo. Ele quem quebrou esse silêncio - Desde quando vocês estão namorando?

_Agosto. Aquele dia que você foi nos meus pais eu tinha levado ele para todos se conhecerem.

_Ele parece um cara legal.

_Sim, ele é mesmo - peguei o celular tentando uma distração, não tinha muito o que falar com ele sobre esse namoro. De manhã a conversa com o Benja não tinha sido uma das melhores. Ele claramente tinha ciúmes do Gustavo e falou que não estava à vontade de eu ir pra Porto com ele, mesmo dizendo que encontraria toda minha família lá.

Nisso começamos uma discussão de que ele tinha que confiar em mim, já que eu não reclamava dele sair todos dias para beber com os amigos por lá e terminamos a chamada concordando que esse tempo todo que eu ficaria off-line até chegar na minha madrinha em Porto seria um bom momento para pensarmos melhor sobre o que estávamos fazendo.

_São Paulo mudou bastante nesses últimos anos não? - olhei de canto, ele dirigia olhando pra frente sem parecer ter mudado a expressão. Mas claramente tinha percebido que eu não queria falar sobre aquele namoro e mudou de assunto.

_Demais, até eu que estava aqui perto fiquei apaixonada quando mudei ano passado. Você comentou de procurar um apartamento no Centro...

_Sim, quero ficar ali próximo do Centro histórico. Me lembra muito da Espanha e ainda sim dá pra saber que estamos em São Paulo.

_Ano passado eu ia todo final de semana pra lá, realmente tem muitas coisas novas... E sempre apareciam outras que eu não fazia ideia de que existiam!

_Mas você não tem ido mais?

_Não tanto, sábado é dia de treino de vôlei e depois sempre ficamos com todo mundo - dei de ombros, olhando o celular sem noticia nenhuma. E que provavelmente seguiria assim pelas próximas horas - mas você já viu apartamentos por lá?

_Sim, mas a maioria precisava de reformas maiores que não consigo fazer agora. Tenho uma ideia clara do que quero em um apartamento, só não tenho tanto tempo assim.

Chegamos no aeroporto cortando a conversa com toda a logística para despacharmos as bagagens e irmos até a área de embarque. Sentamos em um café próximo do nosso portão. Descobri que ele tinha trocado de curso e se formou em engenharia civil, já tinha feito alguns projetos e o mestrado na área de saúde, era quase uma referência para o tipo de hospital que estavam construindo aqui e por isso tinha vindo para São Paulo para assumir uma posição mais consultiva. Ajudava muito a Vanessa, mãe dele, ser médica e ter aberto uma clínica em Madri depois que ele se mudaram.

Contei um pouco sobre minha ideia de entrar no curso de Administração e como trabalhar com a Consultoria me conquistou, era incrível ver como usar todas aquelas burocracias organizacionais pra realmente conseguir ajudar pessoas.

Ainda éramos um pouco estranhos, mas já havíamos reduzido àquela distância e estranhamento. Ele realmente tinha mudado em tantos sentidos naqueles anos! Fora todas aquelas viagens que ele comentava no meio de uma frase ou outra, como se fosse tão simples conhecer tantas cidades pela Europa.

Chegando em Porto ele pegava outro vôo para Madri, voltando na véspera do Natal com os pais dele. Quando perguntei por que ele não tinha ido direto deu de ombros, dizendo que de toda forma teria que fazer alguma conexão e daquele jeito pelo menos nós íamos juntos.

Já estávamos sentados no avião quando ele disse isso, um pouco depois dormiu e o frio na barriga voltou. Pra ele era tão natural estarmos ali e eu continuava com aquela mistura de sentimentos.

Claro que aproveitava que ele não poderia me ver para observá-lo melhor e desvendar se eu estava só surpresa com essa volta. Ele com certeza estava ainda mais interessante do que antes. Nas poucas vezes que nos soltamos um pouco nos assuntos via como ele tinha uma empolgação em falar do que gostava, que puxava com outros tantos temas e eu fazia listas do que precisava pesquisar pra acompanhar todas aquelas referências. Reparei que ele sempre falava muito sobre lugares, mas pouco sobre ele mesmo. Não tinha comentado quase nada fora as especializações e esses trabalhos na área da saúde.

Formulava algumas perguntas, mas desistia antes que elas chegassem perto de serem ditas. Só concordava com o que ele dizia e acabava contando muito mais sobre mim, pensando sempre nesse tempo antes do Benja, que ainda não tinha mesmo dado sinal de vida.

E se terminássemos mesmo nesse período? Eu tentaria me aproximar de uma forma diferente do Gustavo? Ele não tinha dado nenhuma abertura nesse sentido, eu não tinha nenhuma pista sobre como estavam as relações dele. Nesses dois encontros o único contato físico foram aqueles abraços.

Olhei novamente para o lado e sim, se pudesse puxaria o braço entre nossas poltronas pra me aconchegar nele e continuar cochilando.

Amores de MonaOnde histórias criam vida. Descubra agora