{2}

452 34 1
                                    

Logo que começaram as aulas oficiais senti a diferença dos cursos, tínhamos muito mais leituras complementares e um grupo maior de pessoas envolvidas em projetos de pesquisa. Agradecia demais por só estudar e poder passar a tarde na biblioteca tentando entrar no mesmo ritmo que os outros alunos.

Em uma dessas tardes a Franscesca puxou uma cadeira próxima de mim, se oferecendo pra me passar alguns resumos dos semestres passados e ser minha dupla. Ela tinha iniciado no terceiro semestre e sabia bem como era ser uma aluna nova.

A Fran era espanhola, conseguiu uma bolsa lá e se mudou. No início do ano apresentou uma proposta de pesquisa cientifica e recebia um valor do governo para desenvolver o tema. Acho que naquela tarde já viramos amigas e alternávamos os estudos contando sobre a vida.

_Mas o mais importante que posso te contar sobre mim é que minha avó fazia parte do grupo Mulheres Livres. Qualquer dia te conto a história completa delas, mas adianto que isso tudo que vocês engatinham hoje na América Latina sobre o feminismo já aconteceu aqui em 1920 junto com a Guerra Civil Espanhola.

_Ela ainda é viva? Não é estranho te falar que queria conhecer ela né?

_Não, se ela estivesse viva eu com certeza te levaria. Todo mundo deveria ter a oportunidade de conversar com ela. Mas qualquer feriado podemos encontrar com as amigas dela ou mesmo minha mãe, que nasceu nesse meio.

_E o que seria mais importante pra saber sobre esse grupo? Admito que só quando comecei a Universidade que me aproximei do feminismo... Não sei te dizer se antes conhecia.

_Você já respondeu! - ela bateu na mesa, sorrindo e ignorando os olhares atravessados das pessoas em volta - Uma das coisas que elas traziam muito forte é que desde pequena já tivéssemos essa educação igualitária. Não se diziam feministas, mas tinham muito forte que a mulher não deveria ser submissa ao homem e que seríamos vistas como uma força de trabalho tanto quanto eles.

_Que legal! Meus pais me criaram sempre com essa proposta de que eu deveria conquistar o mundo, mas conheço algumas mulheres que estavam estudando pra conseguir um marido.

_Claro, mesmo mulheres nascidas desse grupo ainda ficam com essa ideia. É uma desconstrução de muitos anos.

_Nossa Fran, eu realmente não tinha ideia disso na Espanha. Não tem nenhuma matéria que a gente possa estudar essa história ao invés de estatística?

_Infelizmente não, mas vou te contando um pouco mais. Você vai ver como muda a tua vida Mona. Fora que nunca mais vai conseguir se relacionar com um cara que fica te dizendo o que fazer.

_Ah, mas isso eu já conseguia ficar de olho.

_E se for mais sutil? Minha pesquisa é sobre empresas tradicionais administradas por mulheres. Quando entro na história delas e vejo algumas travas ali em tomadas de decisão da pra entender que essa submissão às ideias masculinas.

_Como assim?

_Por exemplo, uma das executivas que conversei semana passada contou uma história que na empresa anterior ela e o marido estavam em cargos equivalentes, áreas totalmente diferentes, mas o mesmo salário. Rolou uma movimentação e ela foi promovida. Alguns meses depois ela começou a perceber que o sexo não era mais o mesmo. Aumentou a frequência, mas era muito mais rápido do que prazeroso, percebe?

_Talvez.

_Ok, esqueci uma informação. Eles já vinham falando de ter um bebê e ela parou de tomar o anticoncepcional um pouco antes da promoção, mas ainda não tinha engravidado. Leva um tempo pros hormônios sairem do corpo.

_Certo, até aqui entendi. Mas não peguei da frequência do sexo.

_Ele queria que ela engravidasse pra desacelerar na carreira. Começou a virar um sexo justamente pra isso do que pra eles se curtirem.

Amores de MonaOnde histórias criam vida. Descubra agora