Pedro olha pra mim e tudo que eu consigo ver em seus olhos é decepção. Como se ele esperasse mais de mim por algum motivo. Ele respira fundo e começa a falar.
— Se é assim que você se sente, eu acho que não tem nada que eu possa falar agora pra fazer você mudar de ideia, né?
Eu fico em silêncio.
— Bom, se é assim, então que seja. – Ele bufa e se senta de volta no lugar dele. – Mas eu falei sério, Zet, você faria a diferença por aqui. Se quiser, as portas estarão sempre abertas.
Eu continuo em silêncio.
— Eu não sei bem o que você tá pensando, mas pra provar minha boa-fé, eu quero te dar duas coisas... – Ele diz – Há um tempo atrás teve um túnel nosso que começou a dar cada vez menos cristais. Pensando no jeito que a gente faz as coisas eu acabei tirando meu pessoal de lá e trazendo pro 137 pra ajudar por aqui. O túnel tá abandonado e não tem muita coisa, mas ele ainda é nosso e deve ser o suficiente pra você e seu amigo elfo trabalharem sem ninguém atrapalhar. Pode levar ele lá, o túnel é o 242.
— Eu...
— A outra coisa... – Ele me interrompe antes que eu consiga dizer qualquer coisa. – É um conselho. Você não sabe direito como as coisas funcionam por aqui e eu espero que isso mude logo, mas faça o que for, não tenta se envolver com o Don. Ele é perigoso. Se você começar a trabalhar com ele, não tem como sair e se irritar ele... bom, não irrita ele. É isso. Você tá livre pra ir agora.
Eu tento dizer alguma coisa, mas não consigo. Eu não sei muito bem o que eu estou sentindo agora. É orgulho, determinação? Talvez arrependimento? Eu não sei bem. Eu só sei que eu não consigo dizer nada mais do que um agradecimento meio murmurado antes de sair com alguma vergonha.
A verdade é que mesmo querendo aceitar a proposta, eu neguei. Eu não sei o porquê, mas neguei.
Pedro parecia uma pessoa boa com bons objetivos. Claro, ele exagerou um pouco no começo, mas até me deu comida depois como desculpas.
Parece que meu coração vai sair pela minha boca.
Eu saio do túnel 137 e começo a ir em direção ao 242. Enquanto isso eu vou tentando me acalmar. Eu não sei direito porque eu fiquei assim ou porque eu neguei a proposta do Pedro. Já me chamaram de aberração algumas vezes e não parece ter me afetado tanto.
Mas dessa vez... E isso que nem foi comigo. Teve alguma coisa que me incomodou tanto que eu...
Aaaah, deixa pra lá! Não vai mudar nada agora!
Eu ainda posso voltar lá e aceitar a proposta, certo? Talvez se eu for lá...
Calma! Deixa eu pensar melhor sobre isso.
Eu respiro fundo.
Mesmo não sendo a melhor, a situação de agora também não é ruim. Eu vou ter um lugar tranquilo pra pegar os cristais longe do julgamento dos outros. Eu também fico pensando no Arthion. Talvez sendo só eu e ele, as pessoas não venham atrás dele também.
Entre uma situação na qual eu só me ajudo e outra na qual eu ajudo eu e ele, acho que ainda é melhor ajudar duas pessoas ao invés de uma só.
Nem precisa pensar muito pra perceber que eu ainda saí ganhando. Eu entrei nas minas sem nada e agora eu tenho meu próprio túnel! Emprestado... mas só pra mim!
Ai, ai...
Tá, agora eu me acalmei.
É melhor ir logo pro túnel 242 e começar a trabalhar, senão eu não vou conseguir comer mais tarde. Hoje quando voltar pra cela eu aviso o Arthion sobre tudo isso e vejo se amanhã ele quer vir comigo.
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Aço Carmesim - As Paredes de Ferro Negro
FantasíaSe a esperança é o combustível da vida, o desespero seria o combustível de que? Pior do que ter memórias que te assombram, talvez seja não lembrar de nada enquanto um passado desconhecido te persegue. Quanto sangue ainda precisa ser derramado? Todo...