O que leva alguém, com menos de 13 anos, ao extremo de pedir pela sua própria morte?
Para a maioria deve ser inconcebível pensar em algo assim. Nós vivemos nossas vidas agarrados à ideia de viver e vamos encontrando motivos como posses, pessoas, conhecimento, lembranças ou até poder pra fortalecer nossa vontade de continuarmos vivos.
Mesmo em condições extremas, expostos à dor, aos maus-tratos, à fome e à exploração, nosso instinto nos diz pra viver e nós pisamos na nossa moral e no nosso orgulho pra seguir esse instinto.
Enquanto o que nos afasta da morte é o medo do desconhecido, o que nos aproxima dela é a ideia de que esse desconhecido não é tão ruim quanto a sua própria vida.
E pra você ter esse tipo de pensamento com 12 anos, como foi a sua vida até agora? O que você conheceu que te fizesse se segurar à sua vida?
Nem mesmo eu sei a resposta exata pra isso... Por que eu decidi continuar vivendo? Não foi poder, laços e com certeza, não foram lembranças. Talvez por ter chegado perto demais da morte? Talvez algo dentro de mim que eu ainda desconheço?
Cada um tem uma resposta pra isso, mas no caso da Nina, acho que sempre foi a família dela. Mesmo nascendo e crescendo em um lugar desses, ter alguém pra dividir seu sofrimento e compartilhar das pequenas vitórias faz toda a diferença.
Só que ela perdeu isso. Há pouco tempo ela ficou sem a mãe e quase em seguida, a avó que não conseguia mais trabalhar, foi jogada viva em meio aos corpos e depois recolhida como lixo.... Ela ficou só com o pai, mas depois do acidente que machucou o braço dela, ele mesmo fez questão de se livrar dela.
A Nina ficou sem nada.
O pior é que parece que ela se sente culpada por tudo isso. Ela disse que quer viver, mas no momento essa vontade de viver não é maior do que a culpa que ela sente por se sentir um fardo para os outros carregarem.
Foi tudo isso. A culpa, o medo, o sofrimento contínuo, a desvalorização da própria vida e a ausência de algo pra se segurar que levaram a Nina a pedir pela própria morte.
Eu não me assustei com o pedido dela, mas uma tristeza inexplicável me atingiu quando ela o fez. Pra ela ter chegado nesse estado, muita coisa aconteceu... e eu não sei se eu consigo ajudá-la de alguma maneira.
E eu não quero fazer o que ela pediu.
— Nina...
— Não, não tenta me fazer mudar de ideia! – Enquanto ela fala, seus olhos começam a encher de lágrimas. – Vai ser melhor assim, Zet! Eu não aguento mais tudo isso! Dói muito... Eu não sei mais o que fazer e eu não vou conseguir fazer isso sozinha! Você é a única pessoa pra quem eu posso pedir. Por favor... Faz tudo isso acabar, não deixa eles me levarem pra lá.
Mesmo sem saber o que dizer, eu seguro Nina num abraço enquanto ela chora.
Demora um tempo pra ela se recuperar, mas o choro vai parando aos poucos e ela se recupera na medida do possível. Nesse momento, ouvimos o som do sino anunciar o fim do primeiro período.
— Nina, você não está mais sozinha. Eu não vou deixar ninguém te pegar e eu não pretendo deixar você morrer também. Vamos pensar sobre isso e sair disso juntos, tá bom?
Ela não diz nada e apenas acena com a cabeça deitada no meu colo.
— Obrigada... – Ela murmura tão baixo que eu quase não escuto. Isso me faz sorrir.
Ela parece ter adormecido no meu colo e eu me distraio sem ver o tempo passar até começar a escutar passos dentro do túnel novamente. Eu a acordo e sem dizer nada, aponto para a carriola ainda virada. Ela entende e se esconde.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Aço Carmesim - As Paredes de Ferro Negro
FantasySe a esperança é o combustível da vida, o desespero seria o combustível de que? Pior do que ter memórias que te assombram, talvez seja não lembrar de nada enquanto um passado desconhecido te persegue. Quanto sangue ainda precisa ser derramado? Todo...