perdas

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CAPÍTULO 3
Perdas

Eu tinha toda certeza do mundo que o Kangbuk não era um hospital qualquer. A negatividade que ele tinha sobre mim era absurdamente estranha.

Minha áurea que antes era perfeita chegou a se despedaçar no primeiro dia de internado, decepcionado com as atitudes que eu vi dos outros médicos. Quando conheci Mina eu consegui me reergui um pouco, mas com certeza depois de passar por esse hospital eu não seria o mesmo de anos atrás.

Eu não repúdio minha carreira, pelo contrário, adorava ver as oportunidades que tinha de aprender milhares de coisas que, com certeza, fazendo outras faculdades, eu não aprenderia.

Mas Kangbuk parecia um submundo, a terra após o apocalipse. Zumbis que não se cumprimentam, só ligam pro próprio umbigo e a necessidade de sobrevivência.

Mas nem sempre a sorte está do nosso lado.

A perda de Taekwon, aquele menino que veio há alguns dias atrás por conta de um acidente, me abalou. Sua recuperação estava sendo normal, mas no segundo dia após a cirurgia, o babaca do pai entrou por aquela porta infernal que eu nunca quis tanto que estivesse fechada.

O Senhor Kim brigou com o menino, desenfreadamente. Gritou, esbravejou e quase bateu em Taekwon alegando que ele era um inconsequente por ter batido a moto. E consequentemente a imunidade decaiu até que uma pneumonia o atacasse. E todo esse show do pai dele foi explicado por uma simples frase;

- Eu estava com tanto medo de perder ele!

Dizia isso chorando na cadeira quando Hoseok foi dar a notícia para eles e a mãe que já tinha começado a entender o quadro de seu filho horas atrás, não ficou tão surpresa mas sim, destruída.

Aquela cena me cortou o coração, revirou meu estômago. Perder alguém era sentir uma dor inexplicável. Depois de sair da sala e fechar a porta, meus passos rápidos correm pro jardim do hospital, lágrimas inevitáveis escorriam pelo meu rosto. Mina me olhava atrás do balcão já sabendo o que tinha acontecido, me acompanhando até onde eu iria.

Empurrando a porta com toda força que me restava, pingos de chuva forte que nem sabia que estavam caindo me molhavam ao pisar na grama úmida que tinha um cheiro adorável, mas repugnante nesse momento.

Mina segura minha mão e com a outra eu finco a unha na árvore que tinha me aproximado, e meu estômago fez menção em me ajudar. Me fazendo colocar tudo pra fora ali, com a enfermeira me acariciando enquanto eu chorava lágrimas pensando no caso perdido, em uma vida perdida.

Eu não sabia que horas eram, que dia era, se ia parar de chover ou não. Eu mal sabia meu nome.

Taekwon era um menino doce pelo pouco que eu havia o conhecido. Sua mãe o chamando de Tae tentando o fazer parar de chorar pelos berros do pai, agarrando o corpo frágil do garoto que cambaleava de fraqueza. Poucas horas depois aconselhamos que os progenitores saíssem do quarto para que pudéssemos entubá-lo novamente.

Menos de vinte e quatro horas depois, Hoseok e eu estávamos enfiando adrenalina naquelas veias novas e carregando o desfibrilador em trezentos, tentando ao máximo salvar aquele menino.

O que visualmente não deu certo.

Meu estado não era dos melhores ao voltar a adentrar o hospital, meu rosto estava molhado, meus cabelos úmidos e minhas roupas coladas ao corpo completamente enxadadas com a água da chuva que geralmente lavava a alma, mas só pesou a minha.

Minhas narinas se dilatam ao respirar o ar gélido do hospital, estava diferente.

Minha avó brigava com minha mãe quando precisava me levar ao hospital, alegando com todos os seus fios de cabelo que as almas das pessoas que morriam no hospital ficavam ali, vagando pelos corredores. E um arrepio na espinha me faz sentir a presença de Taekwon.

FLUTUA-ME  ˒ kth + jjkOnde histórias criam vida. Descubra agora