O DEPENDURADO

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As coisas estavam tão estranhas: Dinheiro escasso, divórcio roubando tudo que restou de mim, indo de trabalho em trabalho, procurando alguma escapatória... conspirações do universo contra mim? Talvez. Enxergar a luz no fim do túnel? Não... Com certeza é um trem vindo finalizar o serviço. As únicas coisas que restaram da separação de bens foram o sofá e um relógio que ficava pregado na parede do lado direito do primeiro móvel. Tic, tac... O clichê do relógio batendo virou o meu clichê. Nem sei se ele marcava o horário correto. Paralisou nas 19:45. Pelo menos existia uma forma de distração em meio ao silêncio.

Tão estranho... Como as coisas desandaram daquela forma? Uma pergunta ainda sem resposta. Pedir por orações? Isso é coisa de gente no fundo do poço... Eu não havia chegado lá, até aquele momento. Um falante que ficou mudo, e um analfabeto virando escritor de acontecimentos da própria vida.

Fraqueza? Não, não... Ainda sou um homem de flagelos infinitos, os quais ainda marcam os pesadelos de alguém que nunca teve um sonho bom. Metáforas perseguem uma mente vazia, presa num local vazio, perto do eterno vazio. 

O bom fica mau. O fogo fica gelado. O frio esquenta. A alma para de clamar. E o bem aventurado se perdeu nas próprias expedições. Qual a graça de viver uma vida de ponta cabeça? Não faz sentido ser tão otimista quando a própria existência permanece na melancolia.

Existe esperança? Não para os oprimidos... Mais uma característica que define o homem deste relato. Mulheres esquecem do amor, assim como homens esquecem de amar. Poderosos estão caindo, enquanto idiotas crescem. Humildes viram ignorantes, e ignorantes falam a verdade. Acredita mesmo que tudo está como deveria ser?

Olhe para o espelho: o que você vê? Seu reflexo? Ah, meu caro! Vejo um hipócrita recheado de intermédios e dúvidas?... HA! Agora eu sou o ignorante?! Faça-me o favor! Todos temos ideais opostos, valores diferentes. Entramos em conflito com nós mesmos... O problema é o fato de eu ser o maior hipócrita de todos.

Mentiras, badernas, brigas, a porra toda! Eles que se fodam! Apresentei todas as possibilidades quando me pediram para realizar tal tarefa. Depois, voltam raivosos por não ter dado certo... NÃO SOU UM MILAGREIRO! Entendam que sinceridade não é carta branca para ser xingado de nomes horríveis. Deviam parar de me pedir tantas coisas no momento em que estou sem nada... Quero só escutar o barulho dos ponteiros do relógio: Tic, tac... Tic, tac... Tic, tac... Verdadeiramente, eu cansei de tentar.

É perda de tempo persistir no erro. Algo básico que demorei aprender... Saiam da minha vida! Preciso de um pouco de paz! Querem me comer vivo! Querem me comer vivo!... É difícil voltar pra mim depois de tanta insistência? 

Ela deixou tudo para trás, como se fosse algo fácil. Deixou apenas o relógio para eu não perder a hora... Perda de tempo... Os ponteiros estavam de cabeça para baixo e nem eram 19:45. O 12 virou 6 e, de vez em quando, os ponteiros formavam uma cruz... Achava engraçado ficar o dia inteiro fitado no relógio daquela parede branca, a qual foi manchada por vermelho há pouco tempo atrás... Crucificar uma mulher de cabeça pra baixo? Nunca me pareceu má ideia. Talvez os acontecimentos passados ainda estejam guardados dentro de uma mente vazia.

O que as cartas me escondemOnde histórias criam vida. Descubra agora