A semana se inicia atribulada, faculdade consumindo o que resta da minha sanidade e na empresa as coisas estão ainda mais aceleradas. Namjoon está nervoso ao extremo com a expansão planejada do site, nos colocou para rever contratos e fornecedores até não podermos mais. Acho que Hoseok e eu vamos vomitar se vermos mais uma vez a mesma planilha de fornecedores.
Eu também não ando o primor do humor, não quando sei que fim de semana presenciarei a felicidade da família perfeita, da família que a minha mãe escolheu, do marido e do filho que a fizeram se esquecer de mim. Saber que a marrentinha vai estar comigo é um conforto e tanto, mas ainda assim não consigo deixar de ficar ansioso, principalmente porque a última vez que minha mãe me viu não estava limpo. Seu olhar de nojo, de vergonha, de aversão está cravado em mim como uma droga de uma nova tatuagem. Uma da qual não gostaria de ter.
Tento não pensar nisso, tento seguir firme na minha rotina, sem me desesperar com os prazos e pressões no trabalho e na faculdade. Sigo religiosamente todo o esquema terapêutico, converso com os meus companheiros do grupo de apoio, frequento os encontros com a terapeuta, medito em uma brecha do dia, descarrego o máximo que posso das minhas frustrações na academia, porém ainda assim... Essa merda de inquietação, essa merda de voz, essa merda de interruptor.
Não tenho conseguido pregar os olhos à noite, me reviro a cada centímetro do colchão, lembro de coisas que não queria lembrar, de diálogos dolorosos e momentos que nem lembrava que existiam ou que doíam. Minha mente fica a 300km/h como a porra de um carro de fórmula 1 e é inevitável não pensar na euforia e no momento em que as coisas pareciam tão certas apenas com uma dose.
Odeio que ainda tenha esse corredor no labirinto dos meus pensamentos que remeta a essa merda. Odeio que ainda acorde vez ou outra encharcado de suor, coração acelerado e desespero queimando em todos cantos da minha alma. Odeio a sensação de que tudo depende unicamente de mim, o cara mais fodido que conheço, ou melhor, o segundo, porque esse título é inegavelmente do meu pai.
Nos momentos em que a cama pareceu uma realidade distante e que meu quarto virou uma cela claustrofóbica, pude recorrer a voz serena da marrentinha do outro lado da linha enquanto olhava pela janela, focando no passar dos carros pela rua e respondendo sua pergunta sobre como foi o meu dia.
O bom é que nossas conversas são sempre naturais, parecem que sempre existiram, sempre tiveram essa intimidade e casualidade que só anos poderiam dar. Em um momento estamos conversando sobre como derrubei café no teclado do notebook e em outro discutindo e devaneando sobre como seria se a eleição presidencial fosse feita em um reality show.
- Você está ansioso? - ela pergunta em uma das videochamadas, consigo ver a ruga de preocupação que surge na sua testa.
- Um pouco. - admito, porque sinto que é difícil esconder as minhas mãos nervosas de seu olhar atento, mesmo que não estejam no seu campo de visão. - Ansioso para que esse fim de semana passe. - assim que termino de dizer, me arrependo. Vai parecer que não quero estar com ela. - Não que eu não queira ficar com você. - acrescento rapidamente, mas logo sou interrompido.
- Eu entendi. - ela me tranquiliza. - Vai dar tudo certo, coelhinho. Eu vou estar lá do seu lado, se qualquer coisa ruim acontecer, nós vamos embora. - seu sorriso se alarga quando ela se permite dizer: - Nós fugimos juntos.
O meu sorriso espelha o seu, principalmente ao pensar que antes acreditava que ela queria fugir de mim e agora o plano que me oferece é fugirmos juntos. Apesar de toda a merda, essa simples frase é capaz de melhorar o meu dia, é capaz de trazer o pouco de coragem que deve bastar para usar nesse fim de semana ao olhar na cara da minha mãe.

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Uma noite. //// Jjk
FanfictionEra para ser apenas uma noite. Era para nunca mais acontecer novamente. Era para perder a virgindade e não vê-lo mais. Pelo menos, esse era o plano. Agora ele está parado na porta, pedindo por mais essa noite. Em andamento.