Raven

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Decido evitar Justin por um tempo, até esclarecer melhor como podemos fazer esse trabalho sem que ele saiba muito sobre minha vida. Estou longe de confiar nele para isso, seria como entregar todas minhas fraquezas nas mãos do inimigo. A qualquer momento ele vai usar tudo contra mim, e eu vou lamentar por não ter confiado no meu instinto.

Estou guardando algumas coisas no armário da universidade quando olho para o lado e vejo Marcos vindo em sua cadeira de rodas na minha direção. Ele está com um moletom preto e uma calça jeans com um all star. Com o seu cabelo escuro sua pele clara fica em destaque.

Que maravilha, ele não mencionou que estudava na mesma universidade que eu. Pensando bem, nem tinha como ele adivinhar mesmo.

“Oi, garota misteriosa que chuta assediadores” – Ele diz em libras, contenho a risada para não ser receptiva, mas o cara é legal. Até agora pelo menos.

“Oi Marcos, está me seguindo agora?” – guardo minhas coisas e vou em direção ao refeitório da universidade com ele vindo ao meu lado.

“Na verdade você é linda e tudo mais, mas não faz meu tipo.” – Mas que merda? Por acaso eu pareci interessada em algum momento? Contenho esse pensamento.

“Claro, obrigada por me explicar. Eu realmente tinha dúvidas se tinha chances com você. E quem faz seu tipo mesmo?” – Sou irônica e ele percebe pelo seu sorriso em resposta. Marcos é bem bonito, mas não estou no clima para romance com ninguém.

“Na verdade sou gay” - Me sinto mais à vontade com Marcos agora, normalmente vivo na defensiva porque preciso me proteger todos os dias, Justin nunca tentou nada e nem me deixou desconfortável e admiro isso nele, na verdade ele faz o básico que é respeitar uma mulher, mas nós estamos tão acostumadas a ser maltratadas que quando algum homem hetero faz o mínimo, nós ficamos admiradas.

“Certo, vamos comer enquanto listo os garotos que talvez você possa gostar?” – Isso foi a coisa mais agradável que eu disse para alguém que não seja a minha mãe no último ano.

“Vamos” – Diz enquanto sorri para mim.

Sentamos na mesa e conversamos sobre Marcos. Ele me conta que se mudou para cá tem um mês, e não estava se sentido muito à vontade com seus colegas, eu disse a ele que era uma questão de tempo, ele é uma pessoa sociável e bacana, normalmente as pessoas gostam de manter pessoas assim por perto. Como se todos os problemas fossem desaparecer por um instante porque a pessoa sociável faz tudo parecer mais fácil, com piadas, observações engraçadas, é tudo muito confortável.

Marcos presta atenção em todos meus gestos com libras, como se tudo que eu dissesse fosse importante para ele tal ponto que não pode perder nenhum detalhe. Me pergunto quando ele vai perceber que não sou como ele, não consigo manter relações por muito tempo. Não sei ser gentil e amigável, tenho medo de deixar as pessoas se aproximarem demais e quando virem a pior parte de mim, elas vão se afastar. Por isso busco ser o mais desagradável possível, para ninguém ter esperanças em mim. Faço acompanhamento com psicólogo, meu psicólogo me ajudou a sair da depressão, me ensinou a ser autossuficiente, a nunca depender de outras pessoas afetivamente, ele me ensinou a amar minha presença.

Nem percebi que sentia falta de um amigo até agora. Pela primeira vez me permito respirar um pouco perto de alguém que não é minha mãe, não vou por expectativas nele. Mas sinto um pouco de esperança vindo do meu coração.

Ouço as batidas do seu coraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora