Justin

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Raven não se desculpou. Melhor assim mesmo, não preciso ficar me preocupando com a culpa depois. Já sei exatamente o que vou fazer com ela.

Estou levando ela para minha casa agora, ela está concentrada mexendo no celular. Estaciono o carro na garagem e acompanho ela até a porta. Mel sabe o básico de libras, ensinei um pouco a ela quando era mais nova. Raven foi a minha motivação para aprender libras, mas depois que aprendi, percebi que todos deveriam saber esse tipo de comunicação. As pessoas se esquecem os princípios de empatia pelo próximo e acabam vivendo no próprio mundo onde não precisam se humilhar para tentar se comunicar com alguém. Já vi várias vezes Raven ficando decepcionada com alguns dos nossos colegas que nunca se esforçaram para aprender a se comunicar com ela, eles tentaram falar em voz alta algumas vezes quase gritando, Raven ficava desconfortável e depois os alunos perderam a paciência e passaram a ignora-la.

Abro a porta de casa e Mel vem correndo em minha direção como sempre. Abraço ela e deposito um beijo no topo da sua cabeça.

- Fiz tudo sozinha! Se a Sônia dizer alguma coisa é mentira! – ela fala tão rápido que começo a rir

"Ratinha, por favor fale em libras. Lembra da Raven?" – Raven se aproxima de nós

-Hãaaaaam, calma! "Oi, Raven." – Mel faz os sinais devagar.

"Oi, Mel. Como é ter um irmão convencido?" – Reprimo a vontade de revirar os olhos. Agora as duas vão se juntar contra mim, o que eu fiz para merecer isso?

"Ele fica mexendo o tempo todo no cabelo na aula também? Ele é obcecado eu juro" - Mel diz enquanto dá uma gargalhada.

Raven começa a rir para minha irmã. E eu entro em casa enquanto as duas ficam criticando minha paixão pelo meu cabelo. Qual é? Estamos no século 21, homens também cuidam da pele, gostam de se vestir bem, manter a casa organizada, e são obcecados por seus cabelos. Tudo bem que é essa minoria, e eu me encaixo nessa minoria.

Sônia avisa que deixou jantar para nós e os bolinhos ela deixou no forno. Logo se despede e vai embora. Sirvo a mesa e nós sentamos e comemos.

Quando terminamos, vamos para o sofá assistir enrolados, o filme que Mel pediu, coloco com legendas para nós. Mel busca o cobertor no quarto enquanto Raven usa nosso micro-ondas para esquentar a pipoca.

Mel dorme com a cabeça no meu ombro quando o filme acaba. Direcionou meu olhar a Raven.

"Ei, você tem caderno para nós anotarmos as ideias" - pergunto a ela.

Ela afirma com a cabeça e vai até sua mochila no chão. Meu Deus, ela está fazendo uma bagunça espalhando seus materiais pelo chão, reprimo minha vontade de chamar a atenção dela. Ela achou as coisas e sentou de novo no sofá.

"Bom, não quero forçar a barra com nada. Nós temos que nos conhecer melhor, então vamos fazer isso sem forçar a coisa, temos que marcar lugares para ir, coisas para fazer..." - Digo

"Tudo bem, contanto que nós não vamos para a praia, balneários, piscinas... para mim tudo bem."

"Por acaso você não gosta de tomar banho e tem problema com a água?" - Pergunto ironicamente.

Raven desvia o olhar, mas percebo um lampejo de dor nos seus olhos. Ela balança a cabeça como se quisesse afastar algo do pensamento e volta a olhar pra mim. Eu realmente não entendi o que aconteceu agora.

"Você sabe a regra, banho no sábado! É um dia sagrado."

Começo a rir tanto que Mel acorda resmungando, mas logo volta a dormir.

"Você quem sabe. Mas vou avisando, você vai perder a visão divina que é eu correndo pela praia peladão." - Digo brincando

"Primeiro, se eu te visse correndo peladão na praia, eu iria ligar para a polícia e você iria ser preso por prática de ato obsceno, não iria ser muito legal." 

"Pelo menos os policiais iriam apreciar minha visão divina."

Nós dois começamos a rir 

Fazemos nossa lista e ficamos a vontade um com a presença um do outro. Já passa das onze horas e a mãe de Raven está mandando mensagem. Me ofereço para levá-la para casa e Raven hesita um pouco, mas depois que explico que é mais seguro voltar comigo do que com um desconhecido a levando ela cede.

Pego Mel no colo e atravesso a sala até a porta da frente. Entro na garagem e abro a porta de trás para colocar Mel enquanto dorme, coloco o cinto nela e fecho a porta.

Raven já entrou e sentou no carona do carro.

Entro, fecho a porta e começo a dirigir. Raven colocou o endereço do apartamento no GPS, ela parece estar com sono e observa a paisagem pela janela.

Quando chegamos ela fica me encarando por alguns segundos.

"Tá tudo bem?" - pergunto.

"Você mandou o carro para a tinturaria?" 

"Sim, mandei." - desvio o olhar do seu rosto para que ela perceba que não quero continuar com esse assunto.

Ela toca gentilmente meu braço e uma onda de eletricidade passa pelo meu corpo. Odeio como meu corpo reage ao toque dela, e acabo olhando para Raven.

"Eu posso pagar o valor que você gastou." 

É sério isso? Ela acha que a porra de um dinheiro vai pagar a merda que ela fez. Eu passei noites pensando na minha mãe, na falta que ela fez. O que a Raven fez foi um gatilho do caralho pra mim me sentir um lixo.

"Não, não quero falar sobre isso. Apenas vá para sua casa, eu fico olhando enquanto você entra."

Ela assente e sai do carro. Observo enquanto ela entra e fecha a porta. Dou partida no carro e vou para casa.

Ouço as batidas do seu coraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora