Hoje é sexta-feira, não tenho faxina, a Patrícia desmarcou, então abro a matéria de hoje e começo a estudar mas não consigo ler nem uma linha do texto, cinco minutos depois tento ocupar minha mente para não pensar no saldo da minha conta, não posso pedir dinheiro para o painho, ele já está atolado em contas da casa, e o extra que ganhei no mês passado já usei quase todo, não sei mais o que fazer.
"Vai, dispensa serviço de novo, cara de tixé, poderia muito bem tá lá naquela cobertura lavando as cuecas do tesudo, mas preferiu vir pra casa coçar o rabo, agora vai ficar aí lamuriando sobre a falta de grana, acho é pouco" Dou um tapa na minha testa para afastar essa maldita consciência, um emprego fixo era tudo que eu precisava.
Meu telefone toca e o deixo cair antes de atender o número sem identificação, um arrepio percorre meu corpo ao escutar a voz grave e sexy, se é que uma voz possa ser considerada sexy, enfim.
- Rayssa... Está aí?
- ah o-oi estou sim, o senhor gostaria de falar comigo?
Dããã, não ele tá te ligando porque gostaria de falar com a rainha, perdeu o cérebro aonde Rayssa?-Sim - Ele responde em tom de pergunta e sinto que sorri do outro lado da linha, e sei que é de deboche pelo meu nervosismo. - Minha proposta Ainda está de pé... Eu ainda estou aqui do outro lado da rua e sei que você não saiu de casa ainda, o ônibus acabou de passar e você não veio para a parada.
Porra ele tá me vigiando, será? Não importa, você precisa aceitar Rayssa, olha a faculdade.
- Tudo bem eu aceito.
Me vi concordando com a loucura de ficar cada vez mais próxima a ele.
Esse homem é um perigo ambulante para a sua sanidade Ray, tem certeza? A insegurança e a dúvida faz minha consciência me atazanar.
-Só por um mês, se ficar impossível eu saio.Saio do quarto falando sozinha e assustando minha mãe que varre a casa sem parar.
-Que é minina tá doida, vá assustar otro vice.-Estou indo trabalhar mãe, só volto à noite, se eu for dormir fora aviso, vice?
- Olha lá hein Rayssa, não quero fia minha embuchada solteira não, te cuida que seu pai te arranca o côro.- Tá bom mainha, eu tenho essa nova patroa que é um pouco exigente e talvez eu precise dormir na casa dela mais vezes esse mês.
- Patroa..., Sei, pensa que num vi você acordar de madrugada esses dias? Que num vi que você anda com a cabeça na lua? Pensa que sou besta Rayssa? sou sua mãe, quando você prepara a massa eu já tô com o cuscuz pronto, minha fia, só não deixa isso atrapalhar seus estudos e nem seu pai saber, você conhece o cabra, é pior que jumento quando empaca, quero ver você formada.
- Sim mainha, não vou desistir e nem deixar nada me atrapalhar, pode deixar.
- Deus te acompanhe minha fia.
- Fica com Deus também.
Saio de casa e vejo o carro que me trouxe parado na esquina, algumas vizinhas fofoqueiras em frente a nossa casa começam a falar.
- Você soube que a filha do Matias está grávida? Minina foi o maior bafafá, ela só tem dezesseis, o Matias pegou ela e jogou junto com os panos de bunda na casa do pai da criança, pelo visto outro pai daqui uns dias vai fazer a mesma coisa.
Eu sou uma pessoa paciente, não gosto de confusão, meus pais se orgulham do meu comportamento tranquilo, mas nesse momento estou descendo das tamancas.
- Porque a senhora dona Juleuza e a senhora dona Dulce não vão procurar uma trouxa de roupa pra lavar, a pia de vocês devem estar merejando de bicho, umas véias das idades das senhoras, fuxicando da vida dos outros.
Saio sem me despedir, cansei dessas bruacas ficarem inventando mentiras ao meu respeito, se eu fosse garota de programa como elas falam com certeza não precisaria pegar ônibus e ficar faxinando casa alheia. Essa fofoca já deu até briga, pois mainha ficou sabendo e quebrou o pau da barraca, só não deu polícia porque os maridos são amigos do meu pai, que não gostou nada da fofoca e fizeram as duas pedirem desculpas, que eu aceitei apenas por causa do painho.
Dobro a esquina e ignoro o moreno que me segue no carro devagarinho acompanhando meus passos, e quando estou fora do alcance dos olhos das linguarudas das minhas vizinhas entro no carro.
-Por que você não entrou logo? Tentando se esconder de alguém?
-Porque as fofoqueiras estavam me espiando e não queria dar motivos pra fofocas, elas vivem dizendo que eu me vendo nas praias.
- Pensei que estava com medo de entrar e alguém da sua família ver. Ele fala um pouco sombrio, me deixando nervosa.
- Painho também é muito ciumento, e como eu moro com eles tento no máximo respeitar suas regras.
Ele concorda com um aceno e dirige calmante, e enquanto isso observo seu perfil bonito.
Seu telefone toca no suporte e ele ignora, começa a tocar novamente e ele atende, seu carro tem um sistema de comunicação que conecta o telefone no painel e ele pode atender e dirigir ao mesmo tempo.
- Fala Isaque... Estou acompanhado por uma dama e o telefone está no viva voz.
- Senhor, quando puder falar retorne a ligação.
Desvio o olhar e me encolho contra o banco de couro macio do carro, mal respiro, para não incomodar o homem ao meu lado.
- Pode falar agora Isaque. Ele fala incomodado.
- A Patrícia Soares esteve aqui, está a sua procura, como não o encontrou foi direto para o seu apartamento.
Escuto sua respiração pesar, nervoso ele tira uma mão do volante e passa na cabeça, por um momento não associo o nome à pessoa, mas me lembro de quem se trata e um arrepio agourento sobe por minhas costas e passa para os meus braços, conheço a Patrícia há algum tempo e já a vi em uma crise com ciúmes de um ex namorado com a própria irmã, ela é do tipo obcecada, tentou esconder mas já vi alguns dos seus processos judiciais que moveram contra ela, é uma mulher muito bonita, loira, olhos azuis, mas parece muito carente.
O homem ao meu lado me olha como se eu fosse sua salvação, e minha boca amarga, pois não gostaria de entrar em uma briga com essa mulher, eu faço faxina na casa dela e sei do que pessoas como ela são capazes.
-Por favor...
- Não, essa mulher é louca, se pôr na cabeça que estou interessada em você minha vida se tornará um inferno.
- Se eu soubesse que ela era assim, teria me afastado na sua primeira aproximação, ô mulherzinha grudenta.
Me sinto mal por ele falar assim de outra mulher.
- Não me olha desse jeito, eu cheguei ao Brasil duas semanas atrás, só que não falei para a Manu, fiquei hospedado em um resort de um amigo meu que quer se tornar meu sócio e assim que cheguei fui dar um passeio pela praia e ela se aproximou como quem não quer nada, conversa vai conversa vem... Bem, desde então ela não para de me ligar, conseguiu meus endereços com alguém e agora não tenho paz, por favor, me livra dessa por enquanto.
-Eu não, não mandei você baixar a cueca pra qualquer uma, agora guenta, vice.
Falo de picardia e já sabendo da encrenca que ele se meteu, meu telefone vibra com o som de uma mensagem."Por motivos de força maior as aulas de hoje estão suspensas, estaremos repondo assim que possível.
Att. Direção da Faculdade Federal de Recife."O carro dá uma derrapada, meu celular voa e bate na painel do carro e cai em baixo do banco, o cinto de segurança trava e evita que eu bata a cabeça no painel, meu corpo começa a tremer com a adrenalina e o nervoso, o olho e ele está com o semblante fechado, mas não parece nervoso com a mudança brusca de direção, eu ao contrário...
- Seu filho de uma égua chocadeira... - o fi de rapariga abre um sorriso.
- Não fala assim da minha mãe, ela não teve culpa de colocar um gostoso como eu no mundo.
-Convencido dos infernos, pra onde tá me levando cabra da peste.
- Secret. - Seu sorriso dobra de tamanho e eu me perco por alguns instantes.
- Para o carro...
- Não, vou precisar de você lá.
- Eu não quero mais ir, se você não parar o carro...
- Vai gritar? Não adianta, na velocidade que estamos ninguém vai ouvir, e já estamos pegando uma rodovia.
Olho assustada para fora do carro e fico surpresa.
- Você vai gostar de lá.
- Isso é sequestro. Falo emburrada.
- Não, não é, você aceitou vir, mesmo sem saber pra onde.
O ignoro, mas ele coloca uma música internacional extremamente romântica, do Brian McKnight, 6, 8, 12. e começa a cantar fazendo minha pele inteira se arrepiar com sua voz afinada, meu coração acelera tanto que perco o fôlego.-Nem tente me conquistar com músicas românticas.
Já estou arriada por você.
-Porque? Funciona?
- Reservo ao meu direito de ficar calada.Incomodada troco a música, e coloco uma da atualidade, um brega funk "Na ponta do pé" e começo a coachar a letra da música dissipando a atmosfera romântica, mas caindo em outra duplamente perigosa, a sensual, ele para o carro na beira do asfalto, o olho sem entender.
- Desse jeito não dá mulher - ajeita o volume da sua calça. - Se continuar com isso não chegaremos lá vivos.
Fico quieta impressionada com sua reação, ele volta a acelerar entrando numa estrada estreita e sem asfalto.Será pra onde Apollo está levando Rayssa?
E a Patrícia será que ela vai deixar Apollo em paz?
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Nos Braços De Apollo
Literatura FemininaUma nordestina do pé rachado que tenta a todo custo focar na faculdade de fisioterapia, para pagar seus estudos ela faz diária de faxineira, e quando conhece Apollo tenta fugir para não se apaixonar pelo moreno café. Apollo por outro lado é um homem...