Noble examinou o estrago em seu violino preferido e suspirou. Droga! Os filhotes de Torrent acabaram com seu violino, o primeiro em que colocou os dedos. Ele tinha outros três, não ficaria sem infernizar seu pai e encantar sua mãe com suas músicas, mas o violino estava longe de qualquer recuperação. Torrent, com certeza lhe prometeria um novo, e James encomendaria o mais caro que encontrasse na internet, mas não seria a mesma coisa, nunca seria.
Aquele violino tinha história. Um trabalhador humano o esqueceu no terreno onde agora estava a casa deles. Noble o encontrou e sem nunca ter visto nem ouvido ninguém tocar um daqueles, tirou um som estranho nele. Foi como um grito estridente, mas convenceu sua mãe de que ele tinha talento. E para desespero de seu pai, ela comprou um violino para Noble na internet. Esse violino ainda estava na caixa, Noble só o tocava quando ela pedia, era quase um ritual deles dois.
O caso é que quando Tammy foi devolver o violino no dia seguinte, o humano disse alguma coisa sobre a beleza dela e seu pai ouviu. A sorte é que Vengeance, Slade, Leo e Torrent estavam por perto e conseguiram tirar seu pai de cima do pobre humano, mas não antes de seu pai quebrar as duas mãos do cara. Slade teve um trabalhão para conseguir que o humano aceitasse a indenização sem procurar a imprensa. E o violino acabou esquecido. Noble o recolheu e começou a aprender a tocar sozinho escondido. Isso aconteceu na infância dele, quando tudo era bom e sua vida era perfeita. Agora?
Agora sua vida era uma droga. Uma merda sem fim, onde os dias se arrastavam e ele era obrigado a conviver com a família, em meio a briga de poder entre James e Simple, as crises de sede de sangue de Pride, a recente ameaça que Daisy e Violet eram para o super faro de Simple e, se não bastasse, os filhotes de Torrent e Grace quebrando, mordendo e babando em tudo, até em seus violinos. O quarto dele estava sempre trancado, os pestinhas chegaram ao absurdo de baterem na porta. Noble, surpreso, abriu e agora segurava os destroços de seu amado violino.
Tempest e seu irmão o olhavam sérios. Eles eram calados e carrancudos como o idiota do pai deles.
"Música?" Storm disse piscando os olhinhos azuis. Eles eram muito precoces, tinham acabado de completar um mês, falavam um monte de palavras e já corriam.
"Não, sem música. Como vou tocar se vocês destruíram meu violino?"
Ele acenou, virou as costas e saiu correndo seguido pelo irmão. Noble fechou a porta do quarto.
Colocou os pedaços do violino na caixa, talvez conseguisse algum tipo de reparação. E quando o dia parecia ser o pior em muito tempo, tudo piorou.
O cheiro dela chegou ao seu nariz. Noble se dirigiu a janela, saltaria sem fazer barulho e ficaria o resto do dia na zona Selvagem.
"Nem pensar. Eu disse que você estaria aqui. Ela estava triste, pensando no que poderia ter feito para você evitá-la desse jeito. Eu disse que não era nada e que você estaria em casa hoje. Então deixe de ser um bundão e desça. Ou, ela pode vir ao seu quarto, o que acha?"
Pensar nela ali, num lugar onde poderia lancá-la na cama e fazer todas as coisas que tinha vontade de fazer, o fez rosnar.
"Não. Ela não pode entrar aqui."
"Então desça."
"Não posso, Simple! Hoje não! Tempest e Storm pegaram cada um de um lado do meu velho violino e o quebraram. Hoje o dia já está uma merda. Não preciso piorá-lo."
Simple não tinha coração, pelo contrário, se divertia com o sofrimento alheio. Ele riu.
"Ela está subindo as escadas ao lado de mamãe. Você não tem saída."
Como se ele não pudesse ouvir e a localizar a distância! A voz doce dela soava nos ouvidos dele, como notas musicais.
Noble era um músico. Ele não se importava com os dramas de sua família. Ele os amava e daria sua vida por cada um deles, mas não gostava de interagir com eles, principalmente com os trigêmeos. Mas aquela era uma situação de emergência. E teria de fazer algo que odiava: chantagem.
"Eu vou saltar e você vai cobrir minhas costas." Estavam falando no volume que humanos não conseguiam ouvir, então foi difícil imprimir um tom de comando.
"Ou...?" O tom dele foi mais frio e ameaçador. Droga! Como um macho adulto como ele, com dezessete anos, podia sentir medo de um filhote de seis?
"Ou todos saberão que Candid e Honest não existem, que todos os três são Simple." Pronto, falou. Agora era aguardar. Os passos delas pararam ante sua porta. Os irmãos também apareceram no corredor.
"Oi. Procurando Noble? Tempest e Storm quebraram o violino preferido dele. Que bom que você veio, assim pode deixar esse dia triste mais alegre."
Desgraçado.
A mãe deles ofegou. Ela sabia o quanto o violino era importante. Noble fechou seu punho. Simple iria se arrepender.
"Querido? Abra, somos nós." Mesmo depois de dez filhotes Nova Espécie, sua mãe ainda os tratava como se fossem humanos.
Ele abriu a porta e sua mãe, Simple, Candid, Honest e ela entraram. Os trigêmeos o olhavam desafiantes. Eles gostavam de adrenalina, os safados.
"Não precisa se preocupar, querido, vou olhar na internet e achar o melhor restaurador de violinos do mundo, o seu vai ficar como novo."
Sua mãe falava, mas ele tinha os olhos cravados nos dela, como sempre. Era por isso que ele fugia dela.
Sua mãe se aproximou e o beijou na bochecha. Era bom, o fazia se focar na importância de lutar contra a ereção que formaria uma tenda no meio de sua pernas. Droga de moletom!
"Noble quer te contar uma coisa, mamãe." Honest falou. Eles estavam alertas e tensos. Candid inclusive tinha as mãos em punhos. Porra! Eles viviam falando que não reagiam bem a ameaças. Noble blefou e perdeu.
"Não precisa arrumar o violino, mãe. Eu vou usar o seu presente. Só espero que Tempest e Storm fiquem longe dele."
Tammy não olhava para ele, mas sim para os trigêmeos. Ela não era boba, provavelmente sabia que havia algo estranho com eles. Na verdade, qualquer um com um faro um pouco mais apurado sentiria que eles mudavam de nome e personalidades a cada mês, mas o cheiro permanecia.
"Eu queria saber se poderíamos continuar com as aulas. Já falei com papai e ele concordou que seria melhor eu vir pra cá. Se estiver tudo bem pra você, tia Tammy."
A mãe abriu seu sorriso de raposa, que era como seu pai chamava quando Tammy mostrava seu lado casamenteiro. O que ela estava pensando?
"Eu estou ocupado. Preciso estudar para uma audição que pretendo fazer para o conservatório. Eu quero me formar, você sabe. Minhas composições precisam de um diploma para serem patenteadas como minhas." Era mentira, ou uma meia verdade, pelo menos, mas ela não sabia.
"É claro. Eu sei que sou um desastre tocando, mas todos dizem que posso melhorar se praticar." Ela baixou os olhos. Noble se sentiu um imbecil.
"Sei que não somos tão bons quanto nosso irmão, mas podemos praticar com você. Desde que seja aqui."
Candid disse. Os olhos eram os olhos calmos e doces, mas o tom estava diferente.
"Que maravilha! E você pode ajudar um pouquinho, Noble. Uns minutos não vão te prejudicar." A mãe tinha um sorriso de orelha a orelha.
"E desde quando vocês tocam?" Até onde Noble sabia, eles não sabiam tocar. Se sabiam, significava que mexiam nos violinos dele escondido.
Honest sorriu se aproximou do armário onde as caixas com os violinos ficavam, tirou um deles, justamente o que tinha sido presente de sua mãe, e começou a tocar a nona sinfonia. Sem erros. Noble não se decidia entre aplaudir ou estrangulá-lo com uma corda do violino.
"Que lindo, meu filho!" Tammy o abraçou e beijou na bochecha. Honest não gostou muito, mas não disse nada.
"Seu pai não vai acreditar." Ela sorriu. Sua mãe era malvada às vezes. Seu pai odiava que Noble tocava. Ele dizia que música era frescura. Os trigêmeos viviam pela aprovação do pai deles. Era algo que Noble ia gostar de ver: sua mãe informando a Valiant que ao invés de um filhote músico eles tinham quatro. Noble sorriu para Honest, que de acordo com o cheiro era mesmo Honest desde o mês passado. Noble daria tudo para entender porque eles faziam isso.
"E quando começamos? " Ela tinha os olhos brilhantes e as bochechas coradas.
"Hoje já está tarde. Que tal amanhã?" Foi sua mãe que respondeu. Ela balançou a cabeça e saiu abraçada com Tammy. Elas conversavam e saíram na direção das escadas.
"Não reagimos bem a ameaças, irmão. Sorte sua que sabemos que suas bolas só têm tamanho." Simple disse e iam saindo.
"Aprenderam sozinhos?" Noble indicou o violino. Honest guardou o instrumento com carinho e reverência.
"Começamos por que era divertido usar seu violino pelas suas costas, mas até que é legal tocar." Candid disse.
"Pride vai te fazer esquecer. Isso não está em negociação." Simple disse.
"Ele poderia me fazer esquecer o que sinto quando estou perto dela?"
"Você sabe que não, a menos que queira que ele te mate depois. Nós podemos, mas não vamos." O irmão sorriu, eles saíram.
Sozinho no quarto, Noble se sentou na cama, a cabeça entre as mãos. Era um desejo tão forte que quase a beijou ali, no meio do quarto, do mesmo jeito que fez meses atrás, quando percebeu que ela não era mais só uma menina. Foi o melhor dia de sua vida, os lábios dela tinham gosto do sorvete que eles tomaram antes. Noble nunca pensou que frio e calor pudessem se juntar num beijo, mas era possível. Desde então, a evitava. Simple tinha notado e agora o forçava a fugir toda vez que ela viesse.
Seu pai tinha que ter feito como Slade ou Fury que tiveram apenas um filhote.Quem vocês acham que tocou o coração do nosso músico?
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TORRENT
أدب الهواةTorrent tinha tudo que um macho poderia querer. Morava num lugar bonito, calmo e tranquilo na Zona Selvagem, longe do caos que era a área familiar. Ajudava Leo com seus animais, curtia o melhor de ser celibatário: não ter que lidar com as frescuras...