Mais um capítulo minhas leitoras. Não se esqueçam de por fabro votar e comentar, é muito importante para mim saber o que acham e se gostam.
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A sua cama estava ainda quente, mesmo tendo se passado uma semana desde a sua morte, o lugar parecia ter absorvido o seu calor humano para sempre, e eu só queria ficar aqui. Enrolada pelo cobertor azul desbotado de tanto se lavar.Ainda tinha o seu cheiro impregnado , e agradecia por isso. Agradecia por ainda ter um resto de lembrança sua comigo, me fazendo lembrar das noites frias em que tinha medo do escuro e de escutar os trovões brigando lá fora, corria para este quarto, batia com os nós dos meus pequenos dedos na porta, emitindo o som de sempre, e ele já sabia que era eu. Me enrolava nos seus braços, colocava-me na cama e contava uma história até eu dormir. Ah pai! Que saudades.
Meus olhos estavam focados no pequeno diário , sobre a mesinha ao lado da cama, de capa avermelhada, envelhecido pelo tempo, preenchido pelas suas letras rabiscadas e correeiras que eu tanto queria imitar. Um velho hábito meu, focar minha visão em algo, e viajar em pensamentos . Os olhos já ardiam pelas lágrimas secas, eu sentia como se elas endurecessem em meu rosto pálido. Tentava não fechar os olhos por muito tempo porque eu sabia que assim que se fechassem as lembranças iriam chegar, e trariam mais e mais lágrimas.
O câncer é tão estúpido. Por que pessoas tão boas tem que nos deixar ? Eu serei a responsável da casa agora, cuidar da minha pequena irmã Nina e de mim mesma. Serei eu capaz disso?
Não há escolha, se não for eu a cuidar de nós , quem mais será ? Nossa mãe é uma bêbada que não nos ama, nem se quer se importa conosco, nos abandonou e voltou pra Irlanda, pra sua cidade natal, deixando a Família que construiu. Sempre foi eu, meu pai e a Nina , e agora sem ele é como se estivesse perdida em um labirinto sem saída. E ainda mais agora, que teremos que ir morar com ela, deixar essa casa e todas as lembranças boas. Queria tanto ficar , mais ainda não completei meus 18 anos para não poder depender de alguém , e ainda tenho que cuidar da Nina, a minha pequenina, tão inocente e alheia ao mundo cruel, quero sempre estar a protegendo. Farei de tudo para que nada lhe aconteça. Eu sei que morar com uma bêbada não é nada bom pra ela, mas se não for com a nossa mãe a Nina iria acabar por ter que ir pra adoção, longe de mim, longe de alguém que lhe ame. Pelo menos nisso agradeço a minha mãe pelo momento em que a assistente social foi a inspecionar ela estava sóbria o suficiente para a mulher achar que ela é uma boa mãe.
Pergunto-me se a vida alguma vez me dará a oportunidade de fazer escolhas, uma única oportunidade.
- Lilli ! Lilli! Olha o desenho que eu fiz ! - a pequena entra correndo no quarto, os cabelos ruivos parecendo incendiar por onde ela passava. As bochechas tão gorduchas e rosadas, os olhos azuis como um lago numa caverna, meio acinzentados, já os meus eram de um azul meio estranho, pareciam mais que eram apenas cinzas, como um céu numa tempestade.
Endireito-me na cama para recebê-la em meus braços. Apenas com quatro anos já é tão esperta. Puxo o seu pequeno corpo para meu colo e me mostra o seu desenho, num papel branco ela desenhou o que parece ser um garoto de olhos fechados deitado na grama o que ela pintou com o giz verde assim como tudo ao redor , com muitas árvores .
- Oi minha pequena! - beijo sua bochecha. - quem é esse ?
- o Lally.
- Quem é Lally?
- É o garoto que fala com eu de noite.- ela diz olhando para o desenho.
-Como assim pequena? É seu amiguinho? - pergunto. Talvez esse seja um amigo imaginário dela, é normal com essa idade as crianças imaginarem coisa como essas.
- sim, ele conversa com eu toda noite quando to mimindo.
- Você sonha com ele? O que ele fala?- abraço seu corpinho fofo apenas pra saber que ainda tenho ela na minha vida.
- Ele me conta histólias e me enchina a desenhar.- olho novamente para o desenho.
- E o que é isso que você desenhou caindo do céu ? São pinguinhos de chuva ?
- sim.
- Por que ele está dormindo na chuva Nina?
- Ele não está mimindo Lilli ! Ele está esperando por você !- não sei o porque da minha garganta ter ficado seca de repente, eu espero que esse garoto com quem ela sonha não perturbe os seus sonhos.
- Tudo bem bebê. - prefiro não perguntar mais nada sobre o tal garoto. - Você está com fome?- ela abana a sua cabeça freneticamente pra cima e pra baixo.
- eu vou fazer a sua mamadeira com gagau ok?
- Ta. Lilli?
- sim?
- quando vamos ir pra casa da mamãe ? - meu rosto se enraivece ,não com a pequena, mas sim com a mulher a qual tenho que chamar de mãe, que nos abandonou, como pode ela ter abandonado alguém como a Nina? Eu a odeio por isso.
- Amanhã.
- Ebaaaa! Eu tô com saudades da mamãe! Quando eu ver elha vou dar um ablaço bem grandeeee! - diz pulando na cama- Igual o que eu dou eu você e no papai! elha vai glostar né Lilli? - pergunta reticente.
- Tenho certeza que sim.
- Eu queria que o papai tivesse aqui pla eu dar um ablaço bem forte. Mas ele tá no céu né? E o papai do céu cuida bem dele, então eu vou pedir pra papai do céu abraçar bem forte ele pra ele não ficar triste. - aceno que sim com a cabeça , lutando contra as lágrimas que teimam em querer sair.
Ela deita-se no chão com seu pequeno giz verde na mão e continua a pintar o desenho com o garoto, dando contorno nas árvores. Deixo-a lá enquanto preparo o sua mamadeira.
Amanhã vamos deixar a casa, e se mudar pra Irlanda, infelizmente tivemos que a vender, por isso tudo já está empacotado em caixas para a viajem, e os novos donos irão chegar para entregar-lhes as chaves na hora que estivermos partindo. Eu queria muito não poder ter que vendê-la, mas é uma necessidade, não temos muito dinheiro, e esse foi o único bem que meu pai tinha e nos deixou.
A noite parece ter chegado tão rápido, quanto um piscar de olhos. O fato da casa estar tão silenciosa me perturba, não há risadas, nem birras, nem gritos, nem conversas. Apenas eu e a Nina no quarto enquanto dou a sua mamadeira. Faço pequenas festinhas no seu cabelo até ela fechar os seus olhinhos com as suas pestanas ruivas.
Na cabeceira seus desenho descansava, verde por toda a folha, um garoto, olhos fechados, traços, sonhos. Meus Olhos lentamente se fechavam.
"Era tudo branco, neve por todo lado, as árvores eram secas e cobertas pela manta branca gelada. Eu procurava algo... Ou " alguém" , mas não encontrava. A paisagem era tão sem cor, apenas branco e mais branco, eu me sentia doente. Caio de joelhos sobre o chão coberto pela neve. Os nós dos meus dedos sangravam, e meus joelhos estavam começando a fazer o mesmo, melando o branco com a cor vermelha. Começo a cavar a neve a procura de algo, um resquício de cor, um resquício de vida, e sobre as camadas gélidas eu vi. O verde."
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Mrs. D .Ps: os erros na fala da Nina são propositais.
Não se esqueçam de votar e comentar neste e no capítulo passado. Obrigada .
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Traces of Paint • H.S
Mystery / ThrillerApós a morte de seu pai, Liath Hunt se muda com sua pequena irmã para Gorm, uma vila irlandesa afastada da civilização. Um lugar misterioso, onde começa a sofrer uma série de assassinatos. Um assassino a solta.Pode ser qualquer um daquela vila. Mas...