Eyeshadow

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O despertador em seu quarto tocava alto para um caralho, a luz do sol entrando pela janela da sala bem em cima de seu rosto. Mais uma garrafa de vodca tinha ido quase inteira na noite passada, o que significava uma linda dor de cabeça e a sensação de que o mundo estava rodando quando ameaçou se levantar.

Praguejando, tentou mais duas vezes antes de enfim conseguir, e quando o fez, foi direto até uma das garrafas d'água, abrindo-a e bebendo direto do gargalo enquanto ia para o banheiro, ligando a água gelada na esperança de que aquilo ajudasse com a sobriedade. Naquela quarta feira sua rotina na faculdade seria diferente. Era o dia da exposição de arquitetura e todos os seus alunos apresentariam o trabalho central do semestre, o segundo que mais valia pontos, ou seja, a energia estava um pouco caótica, e ainda tinha o fato do evento ser aberto ao público, o que tornava as coisas ainda mais sérias em termos de apresentação. Ele era o professor responsável, e definitivamente, não dava para chegar lá de ressaca daquele jeito.

Sentando na banheira, deixou o fluxo cair sobre suas costas, ao mesmo tempo em que bebia quase a garrafa inteira de água de uma vez só, o que o fez sentir aquela sensação estranha do líquido balançando no estômago quando ele enfim apoiou as costas no mármore. De olhos fechados sua cabeça parecia rodar menor, então decidiu ficar assim.

Seu primeiro pensamento foi a lembrança ainda vívida da noite de sábado, logo após ele se ver caindo para trás, levando a cadeira e todos os fios enrolados em seu pé juntos. Praguejando, levantou-se e seu instinto gritava para pegar o notebook e jogá-lo na parede, mas isso custaria caro depois, fora que era uma atitude completamente inútil no geral. Naquela mesma noite, precisou ignorar pela trigésima vez a ereção insistente, e quando alcançou a geladeira, dessa vez pulou a cerveja e foi direto para o destilado no freezer.

De pé, com a garrafa na boca e a visão da cadeira caída e dos objetos emaranhados, um riso desesperado tomou conta de seus lábios antes mesmo que pudesse contê-lo. Riu com vontade de chorar, de enfiar a mão no peito e arrancar o próprio coração, riu com um desejo absurdo de tacar fogo na casa ou de quebrar tudo, principalmente o crânio. Estava exaustivo ficar naquele corpo, sofrendo dia após dia por algo que não deveria ter. Afinal, Izuna deixou mais claro do que água que se ele fosse até o apartamento dele nesse minuto, eles foderiam de pé no meio da sala antes mesmo de chegar no corredor, onde provavelmente foderiam outra vez, e mais uma, e mais outra, até que ele estivesse tão dolorido que não conseguisse aguentar mais nada.

Seu segundo pensamento foi que Izuna estava destruindo sua vida. Mas isso era falta de maturidade, a verdade era ele quem não estava sabendo lidar com o que acontecia em seu peito e em sua mente. Era tão difícil conciliar o certo, o que ele queria, a tentação, a raiva, as dúvidas, o medo.

Tinha raiva do fato de Dominique ser Izuna, uma parte sua amava o anonimato, a certeza de que nunca se encontrariam. Porém ao mesmo tempo existia uma excitação por ser ele, já que o conheceu antes de descobrir a ligação, e o viu sendo si mesmo, sem restrições, sem o personagem. E porra, ele era uma pessoa incrível. E era isso que o deixava com raiva. Por que ele não podia ser podre? Alguém idiota que só sabia ser interessante na internet? E por que ele tinha que ser irmão de Madara?

Suspirando, abriu os olhos e encontrou os ladrilhos de seu banheiro úmidos, as gotas escorrendo praticamente zombando de sua linha de raciocínio. Aquilo era outra besteira. Madara daria um piti tal qual um cão que ladra e depois não passaria disso. Se tinha algo que Izuna era na vida, isso era auto suficiente. E pelo pouco que assistiu da dinâmica dos dois, o mais velho aceitava esse fato. O rastro daquele pensamento levava para um outro assunto, um patamar que ele ainda não entendia, e que no fundo não queria entender.

Ignorando a pontada em seu peito, bebeu o resto da água potável e ficou feliz ao conseguir se levantar. Pegando o sabão, lavou o rosto, então trocou a barra almiscarada pelo xampu e tirou a sujeira dos cabelos. Esfregou o resto do corpo com calma, fazendo movimentos lentos com receio de fazer a ressaca voltar a atacar, mas para sua sorte ela pareceu mesmo ter dado uma trégua. Ao terminar de se secar, passou pela caixinha de medicamentos por precaução e tomou algo para o fígado, então vestiu uma calça de alfaiataria preta e uma blusa branca. Nos pés, um sapato social. Não gostava de gravatas no dia a dia, por isso pegou apenas o blazer escuro e sua bolsa de couro.

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