.Prólogo

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Toda história de vampiro tem um certo glamour, não importa qual gênero da obra. Do terror ao romance, há sempre um ponto alto para destacar o ar de superioridade da temida e amada criatura da noite. Foi o que Catra sempre ouviu falar.

Vampiros têm riquezas, mil e uma aventuras, conhecimento infinito, uma inteligência emocional de quem viveu séculos para evoluir tanto nesse aspecto. Literalmente. Às vezes não parece que são os mesmos que, em momentos de sede, deixam-se dominar pelo instinto feral quase demoníaco para aniquilar a primeira (ou as cem primeiras) vítimas ao redor.

Ela, que agora possui juventude eterna, por experiência própria, pode afirmar que há um pouco de ficção nesses argumentos. Não sobre vampiros. É sobre a vida plena dos vampiros, que fique bem claro.

Aliás, a dúvida sobre tal espécie existir ou não é benéfica, proposital até. Uma das poucas regras universais desses seres é que eles jamais podem ser oficialmente descobertos pela humanidade. Um grupo aqui ou ali que sabe não faz mal, desde que para o todo continue se passando por uma teoria da conspiração doida. Pois é esse anonimato que permite a respectiva longevidade de ambas vidas humanas e vampirescas. Aprenderam depois de muitas guerras silenciosas há séculos atrás que era melhor coabitar os espaços.

Outro grande aprendizado foi a sobrevivência grupal entre vampiros, ainda que oculta. Tudo fluía melhor em bando. No mundo moderno chamam-se coletivos vampíricos, convenientemente apelidados de clã.

Esses grupos habitam lugares enormes e altamente desenvolvidos, tendo acesso a montanhas de dinheiro e status por todos os setores sociais, culturais e econômicos. A premissa é basicamente a de sociedades secretas nos subsolos alheios do mundo. Tem espalhado por todos os continentes, quiçá, todos os países. Quase não existe vampiro no mundo que esteja fora de uma associação, pois são nelas que conseguem moradia, alimento, acesso a bens materiais quase que infinitos, informações, treinamento, terapia até. Alguém na face da Terra já imaginou vampiro fazendo terapia? Pois é. Eles têm tudo ao dispor desde que colaborem com as regras de onde escolheram se associar.

Uma vez em um coletivo, é opcional conviver entre humanos. Porém, a maioria opta por continuar camuflada no mundo dos mortais por diversão. Andam pelas ruas quando o Sol se vai, frequentam festas, e, eventualmente, fazem suas vítimas na calada da noite.

No caso do clã de Catra, era impossível só depender do alimento que lhes era oferecido. Todos praticamente precisavam sair para o mundo, e não era só por diversão. Para ela, o erro estava no método de sustento escolhido pelos respectivos líderes.

Lamentável como ninguém nunca deu espaço para suas sugestões de como mudar essa realidade deprimente do clã. Afinal, como podia se atrever? Era a mais jovem criatura de todas que conhecia dali. Tinha se tornado vampira há 50 anos apenas, ainda tinha muito o que aprender segundo seus coleguinhas dentuços. Não enxergavam que, diferente dos secularmente atrasados com quem convivia, ela já tinha muito da socialização e mentalidade do mundo moderno em suas veias. A começar pela noção de que os recursos do planeta não são infinitos, e isso inclui o que seria o oxigênio do vampiro: o ser humano. O sangue humano, no caso. Uma pena que Catra talvez tenha chegado muito tarde naquele lugar para espalhar a tão óbvia novidade de que eles não necessariamente precisavam matar as fontes de alimento.

A estupidez de seu líder, Prime, foi o que provavelmente condenou a maioria dos associados à fome descontrolada por anos a fio. Entre os mil e um formatos de se obter sangue, ele optou pelo mais estúpido e atrasado. E com o apoio de outra grande favorita ao posto de lideranças burras do século, a co-líder Shadow Weaver, ele organiza sequestros de humanos invisíveis na sociedade para criar o próprio banco de alimentos drenando-os até a última gota de uma só vez. Depois, distribuem as bolsas de sangue de diferentes tamanhos para os membros da sociedade secreta. Os que mais colaboram com as capturas e outras atividades para manter o grupo recebem as maiores. Quem decide os membros mais ou menos merecedores com históricos de missões é Shadow Weaver, pondo em prática sua falsa meritocracia. Ela e Prime dizem se basear sempre na 'troca de favores'. Esse é o termo utilizado. Catra desconfia que é proposital, para deixar em aberto inclusive para 'favores' um tanto quanto corruptos.

Atraída Pela NoiteOnde histórias criam vida. Descubra agora