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No último final de semana de setembro os resultados seriam anunciados. No começo de outubro, todos os documentos deveriam ser apresentados no local indicado e o contrato seria assinado.

Eu estava muito ansioso, por isso enviei uma mensagem para Mayla com minhas credenciais de inscrito no site que revelaria os resultados. Ela veria e me contaria quando eu chegasse em seu apartamento.

Se antes dos testes eu estava nervoso, agora poderia ser a personificação da ansiedade. Jackie sorriu quando me viu pegar a jaqueta preta para sair e desejou boa sorte antes que eu fechasse a porta. Agora que sabia para onde eu ia, ela estava mais tranquila sobre meus encontros.

Dei meia volta para buscar as alianças de namoro que comprei durante a semana. Elas eram simples, mas significativas para o próximo grande passo em minha vida. Aquele dia mudaria tudo para mim. Eu esperava desesperadamente que sim.

Precisei me identificar na portaria, porque aquele homem com bigode aparado era o novo porteiro, e apenas então pude subir. Meus pensamentos estavam perdidos enquanto eu me preparava para o pior.

Bati na porta branca e ela foi aberta rapidamente. Dei alguns passos para entrar e apenas quando já estávamos trancados no apartamento consegui ver o rosto de Mayla, que tentava evitar meu olhar. Estava avermelhado. Seus olhos inchados deduravam o choro que naquele momento tentava conter.

- Eu não consegui - respirei fundo e senti meus olhos encherem de lágrimas por causa da frustração.

Sentei no sofá cinzento ao falar. Nunca me dei o luxo de tentar realmente conquistar algo. Eu passei minha vida vivendo de forma automática e agora sentia que meus esforços para ser tudo o que queria tinham sido em vão.

- Tudo bem, daqui a uns meses posso tentar novamente - emendei antes que ela tivesse tempo para falar.

Eu não queria ser consolado. Eu era forte.

Mayla pareceu desesperada e colocou as duas mãos em meus ombros antes de falar:

- Renan, você conseguiu. - Seus olhos encheram de lágrimas e ela me abraçou rapidamente para que eu não visse. - E você não vai desistir disso por nada.

Franzi o cenho.

- Você pode me prometer isso? Não vai desistir do seu sonho por nada nesse mundo - ela insistiu.

- Eu não vou - falei confuso.

Mayla me soltou e estendeu a mão com o menor dedo levantado.

- Então promete - ela pediu.

Aquele comportamento me fez recuar, mesmo assim estendi minha mão usei meu menor dedo para envolver o seu.

- Eu prometo.

Ela balançou a cabeça para mostrar que entendeu e pegou o celular no bolso traseiro de sua calça. O arquivo com os nomes dos aprovados já estava aberto quando ela desbloqueou a tela.

Meu nome estava ali. Aprovado. Mas não tive tempo para sorrir antes de terminar de ler, porque estava alocado em uma cidade muito distante.

Não demorei a entender o motivo para Mayla estar chorando. Se eu fosse embora, não ficaríamos juntos.

De repente, senti como se quebrasse em muitos pedaços. Era como se toda a vida que planejei e que parecia tão certa tivesse desaparecido em segundos.

- Não - comecei a falar.

Eu não aceitaria aquele resultado. Ela era um dos motivos para eu me dedicar tanto àquele concurso. Era como perder parte do meu objetivo. Uma parte importante.

- Você prometeu - ela interrompeu falando entre suas lágrimas silenciosas.

- Não foi uma promessa justa. Eu não sabia o que estava perdendo - reclamei.

- Você não está perdendo nada. Esse é o seu sonho. Esse é o melhor para a Jackie. É a sua chance de parar de sobreviver e viver de verdade a sua vida.

Recuei, respirei fundo e mordi meu lábio inferior para tentar conter minhas próprias lágrimas. É claro que eu não poderia esperar que tudo desse certo para mim, afinal nunca deu.

- Você quer que eu vá? - perguntei encarando o chão.

Mayla ficou em silêncio por um minuto inteiro.

- Se eu responder, você vai ficar. Eu gosto tanto de você que não posso ser egoísta assim. Pense em você e na Jackie, não em mim. - Ela não conseguia conter suas lágrimas, mesmo que tentasse ser forte. - Você vai poder dar um futuro melhor para ela. Era o que você queria, não?

Eu odiei pensar que Mayla estava certa. Dei alguns passos e envolvi seu corpo em um abraço. O mês de setembro estava chegando ao fim e naquela primavera, as flores não pareciam tão coloridas.

Tirei as alianças do bolso e entreguei uma delas, mesmo que não fôssemos namorar. Elas eram apenas uma representação, de qualquer forma.

- Se algum dia nos reencontrarmos, eu vou colocar essa aliança no seu dedo, Mayla.

Ela sorriu e então permitiu que as lágrimas corressem em seu rosto livremente enquanto encarava o anel.

- Eu espero que a gente se reencontre.

Sim, aquele dia mudou minha vida. Foi a primeira vez em que senti meu coração partir por uma mulher.

Quando nos despedimos no final daquela tarde, eu me sentia derrotado. Fui até a boate e pedi a demissão que sempre desejei, mas não estava feliz como imaginei.

Se não tivesse passado naquele concurso, eu estaria frustrado mas não precisaria escolher entre o futuro de Jackie e Mayla.

Jacqueline não ficou feliz quando contei. Ela também começou a chorar, mesmo que estivesse fazendo esforço para compreender aquela situação. Mayla também conversou a respeito e tentou fazer com que ficasse conformada... Mas é claro que nada do que falássemos ajudaria.

Para Jackie, ir embora significava deixar para trás Caleb, Caroline e sua tão querida influência feminina. Ela teria uma vida melhor, mas isso custaria todas as pessoas de que gostávamos.

Parece que eu pagaria caro eternamente pelos erros do meu pai. Apesar disso, eu fui grato a ele.

Se meu pai não fosse ausente, eu nunca teria precisado trabalhar como o segurança de uma boate e se não fosse assim, eu não teria conhecido Mayla e tido os melhores meses da minha vida.

Mayla passou todos os últimos dias de setembro conosco, ajudando principalmente a preparar nossa mudança. Eu não sei se aquela foi a escolha mais inteligente, porque conviver com ela apenas aumentava minha vontade de fazer aquilo durar.

Desejei poder congelar o tempo, mas percebi mais uma vez o quanto era insignificante em relação ao universo em que vivíamos. Não tínhamos controle sobre nada.

- Ainda é para sempre? - Mayla perguntou na última noite que passamos juntos, estendendo seu menor dedo em minha direção para que eu prometesse.

Sua voz estava embargada e meus olhos encheram de lágrimas também, mas agradeci ao escuro por me esconder.

- É para sempre - envolvi seu dedo com o meu.

Mayla seria para sempre única para mim e eu nunca a esqueceria. Ela mudou tudo.

Meu cisne negro não estava mais comigo e tudo o que restou foram as memórias e aquelas penas pretas.

Apenas quando já estava distante pude perceber que o cisne negro não era o lado mais sexy de Mayla. Era sua insegurança e sua impulsividade, tudo o que ela sempre tentava esconder e que me apresentou sem qualquer medo... Eu amei ter conhecido.

No final, acredito que ela nunca soube realmente o quanto eu queria ficar e tentar viver tudo o que planejamos antes de dormir.

A vida é injusta.

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⏰ Última atualização: Nov 05, 2021 ⏰

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