Aos 13 anos, coloquei na cabeça que queria aprender a tocar harpa. Passava o dia inteiro pensando nisso, respirava sentindo meus dedos correrem pelas 46 cordas. Meu pai sempre amou minha aptidão para música, adorava que eu tocasse, fosse o que fosse. Mas uma harpa? Aquilo era difícil. Mesmo assim, ele sempre levou cada um dos meus sonhos a sério, inclusive esse.
E ele correu atrás.
Semanas depois eu estava estudando harpa em uma escola de música de uma cidade vizinha a vinte minutos de distância, todas as terças-feiras à tarde.
Foi lá que aconteceu meu quase-primeiro-beijo.
O nome dele era André, e ele tinha um rosto bonito, apesar de algo sempre parecer deslocado a respeito dele. Ele tinha aulas de guitarra na sala ao lado trinta minutos mais cedo que eu, e sempre deixava de ir para casa para ficar esperando comigo até que um dos meus pais chegasse.
Ele era legal, de verdade. Gentil comigo e educado com os adultos. Ele comprava cookies da padaria no fim da rua para dividir comigo enquanto sentávamos na calçada, esperando.
Fez sentido, para mim, quando ele pediu para ficar comigo. Fez sentindo, também, que eu respondesse sim.
Então ele me esperou, um dia, nos fundos do prédio, para que eu o encontrasse assim que terminasse com a harpa.
E eu fui.
Observei de longe André recostado na parede, vez ou outra encarando o relógio em seu pulso. E então virei as costas e fui embora, sem nem mesmo trocar uma única palavra de despedida com ele.
Eu era nova demais e não tinha muita noção — ou experiência — do que estava fazendo, mas sabia que não sentia nada real por ele. E eu não era esse tipo de garota. Não parecia certo me expor, ou expô-lo a aquilo, a um beijo por um beijo.
Ainda não parece.
Mas hoje quis beijar Vicente. Quis muito.
E não deveria querer.
Porque não sinto nada por nada por ele.
E mesmo assim... pareceu absolutamente certo.
Em conclusão: Eu aprendi a tocar harpa.
E nunca beijei um garoto.
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Último Som
Romance"A vida inteira, meu mundo foi feito de sons. Cores se convertiam em notas, formas tornavam-se acordes. E tudo convergia em uma melodia infindável, incomparável. Minha alma. A música me reivindicou, me tomou pra si, me escolheu. Tudo o que vejo é m...