Apagões sempre me deixaram pensativo.
Olhar para a rua e ver a noite mais clara, já que está tudo escuro.
Ouvir muito mais a mim mesmo, já que não ouço nada.
Saber muito sobre quem sou, já que nunca soube.
É muito estranho esse poder de iluminar que o escuro tem.
Me pego escrevendo esses textos num apagão
Vejo as árvores ao longe balançado livres ao empurrar suave da brisa noturna.As luzes, muito distantes, de quem não vê que estamos no escuro.
A vizinhança, quieta, amarela à luz da vela, espera um dia a luz voltar.
E olha, quantas estrelas, nunca as vi antes, talvez nunca as veja depois, a luz me mostra tanto, mas me tira tanto.
Um carro solitário e devagar passa na rua escura, solitária e amarelada, ele ilumina seu caminho com seu farol incandescente que reflete para dentro das casas apagadas.
Essas nuvens antes tão brancas, agora refletem um cinza tocante, como se ainda tivessem uma parte do dia em si, mas também um pedaço da noite da qual flutuam sobre.
Bebês choram, cachorros latem, o galo canta, pessoas bocejam, e outras dormem, acostumadas com o escuro e a falta da eletricidade.
O farol ao longe ilumina a minha janela periodicamente, eu o considero meu amigo, ele me dá uma fagulha de luz sempre que eu preciso, não quando eu quero, quando eu preciso.
Não me leve a mal, a luz é incrível, mas o escuro também, não conseguiria viver sem os dois.
Eu olho para uma tela iluminada de um celular enquanto escrevo isso cercado de escuridão.
Por muito tempo senti medo do escuro, mas agora sinto aconchego e curiosidade, são coisas que uma criança sentiria no colo da mãe e quando olha pro mundo, e eu sinto isso, respectivamente.
Se a luz é vida e o escuro é morte, quero abraçar os 2, pois um enriquece o outro.
Eu me sinto uma criança todas as vezes que eu abro o olho de manhã, e sinto que ensaio para o meu sepultamento toda vez que fechos os olhos à noite.
A luz voltou, repentinamente, levando consigo aquele brilho misterioso e intrigante que era o escuro.
A vizinhança, antes amarela, brilha em luz branca e em coro comemora o retorno da luz, como se uma fagulha de esperança tivesse se acendido, não só uma mera lâmpada.
É necessário ter um pouco de luz no escuro, e também um pouco de escuro na luz.
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Pérfida Felicidade
PoetryA tragédia de nascer, a odisséia de viver, a visão do homem sobre si mesmo, o sentimento sufocante, corrosivo e incessante no peito que é respirar. Deus? Por que me deste este presente? Tão lindo, tão misterioso e efêmero, que é a vida... As vezes o...