Capítulo XLII | Miguel e Abel

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Me sentia leve como uma pena, não sentia dor nenhuma e sobre meu corpo descansava uma roupa branca. Ainda doía para respirar, mas nem se comparava com o martírio de antes.

Alguma coisa apitava ao meu lado em um barulho padronizado e irritante, as luzes no teto machucavam os olhos sensíveis e pesados de alguém que provavelmente está sob efeitos de anestesia.

Consegui achar o comando para mexer os dedos e assim pude estudar a cama de hospital em que eu estava deitada sem conseguir me mover.

Virei meu rosto com dificuldade até focar no homem sentado com uma revista tapando o rosto. 

Tentava falar mas a voz não saía, era agoniante o esforço para gritar e nem uma migalha de som saindo. Bati as unhas no metal da cama e finalmente ele foi revelado.

Os olhos tão claros que pareciam brancos me tranquilizaram… Nunca fiquei tão feliz em ver o Miguel na vida.

— Oh você acordou — ele se aproximou — Como se sente?

Mais uma vez a investida de falar foi falha.

— Não consegue falar? — eu afirmei com a cabeça — Entendo. Suas cordas vocais foram bastante danificadas, mas você vai voltar a falar.

Mexi o corpo tentando perguntar o que tinha acontecido.

— Bom, vou te falar o que aconteceu. Eu esqueci meu casaco na sua casa e só percebi quando cheguei na minha. Voltei e tive que arrombar a porta porque achei estranho você não atender, e quando entrei você tava caída no chão sangrando por todos os buracos do seu corpo, literalmente todos, Hanna.

"Fizeram exames em você e várias bolsas de sangue, pois você estava pálida feito farinha e perdeu muito sangue. Foi constatado uma substância na sua corrente sanguínea que paralisou seus membros e estava te levando a óbito. Se eu chegasse um minuto mais tarde você poderia estar morta agora. E eu agradeço a Deus por ter me feito de instrumento para te salvar."

Eu gelei, fitando os olhos dele eu me vi completamente em choque. A amargura na boca doía a garganta a cada vez que a saliva era ingerida, eu conseguia sentir um cheiro horrível saindo da dela e poderia afirmar que chegou bem próximo de ser o cheiro da morte.

— Você provavelmente foi picada por algum animal ou… — ele suspirou — Alguém tentou te matar. Você vai ficar bem tá bom? — Miguel pegou a minha mão acariciando-a.

— Tá… — saiu baixinho e falhado.

Miguel saiu para falar com alguns médicos e eu fiquei ali, parada, sem mal conseguir me mexer. Um peso no corpo e uma preguiça, meu único desejo era dormir.

Não quero pensar sobre tentativas de assassinato ou o que aconteceu comigo, eu só quero dormir.

Cada vez que eu respirava a barriga doía e eu me pergunto o porquê daqueles corrimentos… A cada bocejo meu corpo se desligava adormecendo naquele sono tão bom… Faz tanto tempo que não durmo desse jeito…

— Oi.

A voz adentrando no quarto me despertou como se tivesse levado um choque.

— Sai daqui — fiz esforço para um grito mas saiu um miado falhado.

— Como você tá? — aqueles cabelos pretos e olhos da mesma cor se aproximaram.

— Sai daqui — sibilei irritada.

— Desculpa por ontem…

— Abel, eu literalmente estava morrendo e você desligou a chamada. Qual o seu problema? — tossi sentindo a garganta arder como fogo.

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