Estou na beira de algo quebrando
Eu sinto que minha mente está lentamente desaparecendo
Se eu continuar, não vou conseguir. E é tudo por sua causa(I Was Never There, The Weeknd)
Ar. Eu precisava de ar. Minha respiração era escassa quando acordei, sentei-me com rapidez, e enquanto olhava ao redor, observando a escuridão que me circundava.
Não. Aquele escuro, não. Procurei alguma brecha de luz, algum indício do dia, mas nada encontrei. Tudo indicava que era madrugada, e eu teria de enfrentar um de meus traumas enquanto tentava relacionar o que estava acontecendo.
Em instantes, o ritmo acelerado de meu coração foi sentido contra a caixa torácica. O formigamento em minhas pernas me paralisou.
Tentei relacionar se havia vivenciado ou sonhado com lobos invadindo a casa de Baldassare e nos atacando. Meu avô estava com eles. Mas... No fim, antes de supostamente perder a consciência naquela situação irreal, vislumbrei aqueles olhos inteiramente azuis, os mesmos do sonho que tivera enquanto dormia, dias antes, com Xandre.
Parecia óbvio que novamente havia sonhado. Um sonho bizarro como o anterior.
Baldassare. Eu estava novamente na cama dele após ter um pesadelo? Mas ele sabia que eu não gostava de ambientes sem iluminação. Quando dormíamos juntos, Balda sempre deixava o abajur ligado para me confortar, caso eu acordasse pela madrugada.
Ainda com o corpo trêmulo, tateei a cama, na esperança de achar seu corpo quente.
Ele não estava nela.
Levantei, alarmada. Eu só podia estar em algum quarto de sua propriedade. Talvez tivesse dormido sem perceber. Ele havia saído? Por quanto tempo?
Caminhei lentamente, tentando me apoiar nos móveis que tocava, direcionando-me para achar alguma janela, ou uma porta.
Eu queria parar e envolver meu corpo com os braços. A ideia de não enxergar o que estava à frente me apavorava. Era irracional, eu reconhecia, e infantil, mas minha mente estava presa na minha experiência quando criança.
Minha garganta parecia seca, prestes a se fechar irremediavelmente.
— Crianças desobedientes como você são visitadas por fantasmas à noite. E o cadáver de seu pai deve estar muito desapontado com você — Paulo dizia à porta do meu quarto, quando eu estava deitada, pronta para dormir após ele me bater. — Hoje, espero que ele a visite e puxe seu pé para aprender a me obedecer. Nunca mais mexa nas coisas do meu escritório.
E, ameaçando, ele saía e apagava a luz.
Eu não dormia. Por muitas noites, eu não dormi. Eu era desobediente e papai viria me visitar. Então, chorava a noite inteira. Tremia-me por completo a cada barulho repentino. Eu não temia o fantasma de meu pai, mas sim o decepcionar. Queria ser como ele, forte e obediente. Ele ficaria triste quando viesse e soubesse que eu peguei um dos livros do escritório de Paulo. Papai nunca me batia, então será que se importaria com as marcas roxas que Paulo deixara em minhas costas? Me perdoaria? Mamãe não se importou. Apenas vovô Cairo cuidou de minhas costas, no dia seguinte, dizendo que as ervas cheirosas sarariam minha pele. Ele chorou quando as passou em mim. Também estava decepcionado comigo? Ele respondeu que não.
Eu amava o vovô.
Eu só conseguia dormir quando via, pela fresta da cortina, os primeiros raios solares. Quando os passarinhos começavam a cantar, anunciando o dia, era quando eu fechava os olhos. Não tinha mais chances de papai vir. Talvez, na noite seguinte.
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Teu Paradoxo Sou Eu
FantasyNely prefere erguer a arma para criminosos do que conviver com a própria família. A policial autêntica trabalha arduamente para conquistar a independência, seguindo o legado do pai. Nesse processo, a disciplina a conduz: deixou de fantasiar com a vi...