Capítulo 22

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Não é adorável, estar completamente sozinha?
Coração feito de vidro, e a mente feita de pedra. 

(Lovely, Billie Eilish)

Somente Lopel nos aguardava no escritório. Nenhum sinal da pessoa que nos ajudaria. Olhei em volta antes de mirar o lobo ancião. Mais sério do que o habitual. Assim como Bertore, ele parecia desconfortável — mais do que o filho, e eu me questionava se pelos mesmos motivos.

Lopel se levantou e caminhou para a frente da mesa. Para a minha surpresa, vestia roupas cotidianas. Sem terno ou farda militar. Eu sabia que, de modo diferente dos outros dias em que lidei com o Ancião ou com o militar lupino, estava prestes a lidar com o chefe da família Gaeli.

Os olhos sempre em escuridão azulada se fixaram em mim.

— Como estás, menina Pérola?

Suprimi um suspiro.

— Não se preocupe com formalidades. Quero saber o que vai me dizer.

Lopel não se abalou. Estava adaptado a meu comportamento arredio nos últimos dias. Eles podiam pensar qualquer coisa de mim. Ser educada é cansativo quando se está morta por dentro.

Ele ofereceu um olhar rápido para Bertore.

— Meu filho mencionou a ti sobre ela. — Uma afirmação, não uma pergunta. Como ele sabia? Droga... Nos ouviu no corredor? Será que também ouviu quando respirei aliviada nos braços do filho dele? — Agora, tudo depende dela.

— Dela quem?

— Liris. A minha Suprema Beta.

Franzi o cenho imediatamente.

Lopel fora o primeiro Supremo antes de passar o cargo para o filho e tornar-se Ancião, junto à companheira. Bertore agora governava junto à irmã, a Suprema Beta. Eu não havia pensado na possibilidade de o primeiro ter tido uma Beta. Achei que bastasse ter a sua companheira auxiliando e ocupando o cargo de... Qual título mesmo Ebela me dissera? Luna Suprema?

— Liris é sua irmã, também? — Indiquei Bertore com o queixo. — É um padrão que as Betas sejam as irmãs?

— Sempre esperta, menina. Em nossa cultura lupina, sim.  — O seu sorriso não alcançou os olhos. — Eu, Liris, Tório e Xandre fomos gerados por minha Mãe Anara. Ao mesmo tempo. Estás sendo coerente em nos considerar irmãos.

Levei a mão ao pescoço e massageei a lateral. Era absurda a compreensão do que me dizia. Ele e Xandre eram Filhos de Anara, no sentido mais literal possível. Sem metáforas. Filhos da Deusa. E tinham uma irmã. E Tório, o Beta de Xandre, também estava incluso. Como eu não havia raciocinado isso antes? Era um absurdo quase óbvio. Sendo assim, será que eles podiam ser considerados deuses como a Mãe?

Respirei fundo. Bertore havia mencionado algo do tipo antes, mas somente ao ouvir de Lopel o entendimento se assentou.

Xandre era mais velho do que Bertore. Possuía a mesma idade de Lopel.

Eu havia transado várias vezes com um deus.

Um deus estava com o meu pequeno irmão.

Sentei-me na poltrona próxima. Bertore se sentou no pequeno sofá de couro à direita.

— Só vocês? Tem mais algum? — Foi a única pergunta das muitas que circundavam meus pensamentos que saiu.

— Somos os únicos — respondeu rispidamente, sem vontade de oferecer mais informações.

— Se Anara os mandou para cá há tanto tempo... Por que não estão juntos? Por que a sua Beta não vive aqui? Ela também se tornou Anciã?

— Este não é o foco. — Um rosnado arrepiante foi ouvido entre suas palavras. — Liris será o canal de conversação entre nós e os leões. Se ela estiver disposta a ajudar.

Teu Paradoxo Sou EuOnde histórias criam vida. Descubra agora