Você me fez pintar cenários na minha cabeça
Estou vendo toda a cor
Vendo todas as cores que você projeta
(Pictures, ECÂF)
Os belos olhos azuis de um homem me observam. Estão atentos em mim.
Mas, em segundos, eles se tornam assustadores. Animalescos.
Incomuns.
Porém, lindos.
Essas são as melhores características para estes olhos anormais, rodeados de fumaça cinza e brilhante.
Eles são o conceito de excêntrico.
Diferente do branco dos olhos, até então, humanos, esta parte deles é substituída por um azul deslumbrante. Profundo. E as pupilas são pretas, em contraste.
Tudo neles é como o céu diurno.
Parecem de um lobo, mas pertencem a um homem. Este que arqueia uma de suas sobrancelhas escuras e grossas.
Não consigo ver o rosto por completo.
Mas vejo um fio castanho e ondulado que repousa no meio da testa branca.
Seus olhos, embora diferentes, são bonitos; embora delicados, são furiosos — exalam poder.
A suavidade e a força.
☾
Com um impulso, apoiei os antebraços na cama e ergui o torso. Tentei, sobressaltada, fazer com que o ar voltasse aos pulmões. Eu me tremia. Mas não entendia o motivo.
O barulho dos meus arquejos acordou Baldassare imediatamente. Ele avançou com ímpeto para me apoiar em seus braços.
— Pérola! Olhe para mim, Pérola! — Baldassare segurou meu rosto e virou, com calma, para a direção do seu. Um raio solar escapava da brecha na cortina, irradiando diretamente nele.
Olhei ao redor. Nós estávamos no seu quarto. Estivemos dormindo a manhã inteira, cansados da patrulha anterior. Já era a tarde.
Não havia nenhum sinal de olhos azuis e opulentos.
Apenas sonhei com tal coisa.
Franzi o cenho.
Por que isso me impactou a ponto de me fazer tremer?
Percebi, então, que olhava evasivamente para Baldassare.
— Minha Superior — chamou-me enquanto fazia carinho em meu cabelo —, teve mais um pesadelo. Esse pareceu ser pior do que os outros... Quer falar sobre isso?
Ainda aconchegada em seu colo, suspirei.
— Não. Não, quero dizer que não foi um sonho como os outros que já tive. Não foi um pesadelo — com Paulo, completei mentalmente. Baldassare não sabia que meu padrasto era a natureza dos sonhos ruins. — Este foi um sonho... diferente, por isso não consigo entender a reação do meu corpo. Não foi ruim.
Baldassare ergueu as sobrancelhas. Segui seu olhar, que recaiu, vagamente, sobre meu cordão cintilando na mesa de cabeceira. Em silêncio, voltou-se para mim.
Ele havia acordado com um susto e ainda estava atordoado. Seu olhar estava perdido.
Cairo dissera que o colar me traria bom sono. Balancei a cabeça para mim mesma. Pelo menos, eu não havia acreditado nessa estupidez.
— Quer me contar como foi o sonho?
Assenti.
— Sim. Mas, se rir, vai ganhar um soco.
Ele sorriu devagar.
— Vou pegar água para a gente.
☾
Estávamos conversando na cozinha há algum tempo. Ela possuía um ambiente tão espaçoso e organizado que, até mesmo eu, que não gostava de cozinhar, me sentia tentada a arriscar na culinária. As cores amarela e branca compunham o ambiente rústico, caseiro e elegante, assim como a mobília da casa inteira.
De costas para Baldassare sentado à mesa, eu estava em pé, vestindo uma blusa sua e virando na frigideira panquecas da massa que havia preparado. Apesar de mexer a cintura ao ritmo da música alegre no alto-falante, a mente estava longe — o que comumente acontecia após acordar de sonhos que me afligiam —, então me esforcei para dar atenção ao que ele falava.
— Nosso subconsciente é multifacetado, para não dizer desgraçado. Acreditar que algum sonho tenha um significado específico seria o mesmo que caçoar do processo criativo da nossa mente quando dormimos.
Mordeu uma panqueca antes de continuar.
— E é a pessoa menos supersticiosa que conheço. A não ser que seu avô tenha mudado seu modo de pensar — provocou. Ele sabia a razão de meu avô ter o apelido Feiticeiro. Em alguma conversa banal, havia comentado vagamente com Baldassare sobre as crenças de Cairo.
Eu não era extremamente cética como relatava. Se fosse, sequer aceitaria o colar "auxiliador de sono". Embora não acreditasse nas "magias", e o episódio do sonho estranho demonstrasse a inutilidade do cordão, respeitava a crença dele, e, além disso, achara o pingente bonito.
— Eu não disse que tem um significado, apenas que não entendi a razão de meu corpo ter reagido assim... Foi como um susto quando vi aqueles olhos que pareciam de lobo, mas eram humanos, me observando.
Baldassare deu um sorriso felino. Ele estava segurando uma risada e, em breve, ganharia um soco.
— Talvez ande assistindo série adolescente de lobinho, por isso seu subconsciente registrou isso no sonho.
O olhar sério que lancei a ele fez o sorriso aumentar.
— Não tenho mais tempo para isso.
— Bem, então seu corpo reagiu de modo estranho apenas porque ser encarada por um homem com olhos azuis de lobo — interrompeu-se com uma risada alta e estridente — seja... seja assustador?
Encarei-o nos olhos, sem achar graça, mas ele desviou o olhar e pegou outra panqueca com a mão, sujando-se de mel.
— Esqueça isso — murmurei.
Ele ficou em silêncio. Levantou-se, percebendo meu mau humor, e me abraçou por trás, com força. O beijo demorado que deu em meu pescoço desfez minha rigidez.
— Esquecer o quê mesmo, Pérola? — sussurrou. — A única coisa que passa na minha cabeça é que preciso lhe mostrar o quanto sou mais feroz que um lobinho.
Rapidamente, o cabo plastificado da espátula foi fortemente ao encontro de seu braço. Mas ao ouvi-lo rir, comecei a rir também.
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Teu Paradoxo Sou Eu
FantasyNely prefere erguer a arma para criminosos do que conviver com a própria família. A policial autêntica trabalha arduamente para conquistar a independência, seguindo o legado do pai. Nesse processo, a disciplina a conduz: deixou de fantasiar com a vi...