Capítulo 15

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Jason's POV

Eu não sei quem me arrastou para a enfermaria enquanto tiravam o corpo da praia, não sei quem fez curativo nos meus ferimentos e me arrastou para uma ducha no chalé. Não conseguia enxergar nada, porque meus olhos ainda estavam de alguma forma revendo os olhos arregalados de Leo quando Calígula atravessou sua lança nas suas costas, e quando o fogo apagou das mãos dele, eu diria que tudo se apagou também.

E não bastasse isso, meus ouvidos apenas ouvem a voz chorosa de Piper, nenhum som no mundo havia transmitido tanta dor até hoje, seu charme foi tão forte que por um segundo achei que ela seria capaz de ressuscitar os mortos. Eu não fui capaz de chorar, de gritar e nem nada, porque acho que se eu começar a extravasar meus sentimentos, eu seria capaz de usar meus poderes para expressar minha fúria e faria um estrago onde eu passasse. Talvez arruinar o mundo não seria uma ideia ruim, não tem como ser um lugar bom sem o Leo.

Antes de sair da praia, escutei Nico dizer para Piper que Leo não quer que façamos nada, acho que ela estava sugerindo um meio de resgatá-lo do mundo inferior, e parte de mim não quer respeitar a vontade dele, ele não entende o buraco na nossa vida sem a presença dele? Ele acha que vamos conseguir seguir em frente? Que eu... que eu vou conseguir me perdoar?

Eu posso basicamente voar, eu poderia ter feito alguma coisa para ajudá-lo, eu deveria, na verdade. Ainda não sei porque ele jogou uma bola de fogo em mim ao invés de deixar eu atravessar para o outro lado, e por isso ele morreu. Deveria ser eu ali, não ele, ele tinha tantos planos, ele encontrou seu rumo e iria fazer a diferença para todas as próximas batalhas dos semideuses, ele não deveria ter sido derrubado por uma. Nós somos adultos, as missões deveriam ficar com os mais novos agora, ele deveria ter tido paz. Nós lutamos uma das maiores guerras da história e sobrevivemos, para ele morrer em uma missão idiota atrás de sapatos mágicos para ajudar um deus idiota. A raiva só com o pensamento faz tudo fervilhar dentro de mim.

Descobri depois que era Percy que estava me guiando de um lado para o outro e cuidando de mim, ele não tenta conversar, acho que nem ele consegue, ele parece muito furioso e triste também.

— Vão queimar a mortalha dele. — é a primeira vez que presto atenção no que falam ao meu redor, olho para Percy que me questiona silenciosamente se eu quero ir.

Devo isso ao Leo, e preciso me despedir, mesmo que não pareça real que é uma despedida. A única explicação para eu ter tido forças para sair do meu chalé e ir até lá é porque estou em um modo totalmente automático, contendo tudo dentro de mim. O pavilhão está lotado, a expressão de todos é de choque e tristeza, muitos com os olhos vermelhos de chorar, Leo é muito querido, ninguém consegue acreditar e todos estão aqui para se despedir.

Sua mortalha com o símbolo de Hefesto é brilhante, muito bonita, mas nada disso faz diferença agora. Percy me guia e todos nos deixam passar até chegarmos perto, e vejo Piper e Annabeth ali. A loira se acomoda no peito do namorado assim que ele abre os braços para ela, chorando silenciosamente. Piper ergue o rosto para mim, lágrimas escorrendo nele e tudo, cada centímetro dela demonstra dor. Mal consigo a olhar, como poderia, quando eu deixei o melhor amigo dela morrer? Mesmo assim, sem pensar que eu não mereço isso, ela sai do lado de Annabeth e vem para o meu, abraçando o próprio corpo. Eu tenho o impulso de querer puxar ela para os meus braços, todos estão sofrendo mas Leo era nossa família, a única pessoa que entende a extensão do buraco da ausência dele é a própria Piper, mas não consigo fazer isso, nem mesmo para dar consolo, não parece justo eu querer consolar alguém por algo que eu poderia ter evitado.

Ainda assim, alguns minutos depois, sinto a mão dela buscar a minha, entrelaçando nossos dedos e apertando com força. Aperto sua mão de volta, porque mesmo que não mereça, eu também preciso de forças para passar por isso. Ainda sinto dor pela flechada que levei, provavelmente porque me recusei a tomar qualquer coisa que poderia ajudar a me curar, só deixei que fizessem um curativo, mas sentir dor agora é o mínimo que posso fazer, afinal Leo está morto, e eu estou aqui.

Quíron começa a falar sobre como ele foi um dos semideuses mais corajosos que já passou por esse acampamento, como ele era talentoso, como vai fazer falta e nunca será esquecido, mas nada disso importa. Nada importa, Leo está morto.

Quando queimam a mortalha, é o fim. Nosso garoto em chamas já não existe mais, fim. Antes mesmo que as chamas consumam tudo, solto a mão da Piper e começo a sair dali, porque estou começando a me sentir incapaz de respirar. Não deveria deixá-la chorando sozinha, espero que nossos amigos cuidem dela, eu só quero... ficar sozinho, sem olhar para ninguém, poder lidar com a culpa e me odiar em paz. Não quero ninguém me olhando como se pensassem que eu, o grande Jason Grace, não consegui evitar a morte do meu melhor amigo, ou pior ainda, não quero que me olhem querendo me consolar.

Saindo do pavilhão em rumo aos chalés, bem no fundo, onde ninguém estava, reconheci alguém encostado numa árvore, olhando para as chamas da mortalha apagando. Hefesto veio se despedir do seu filho. Deveria ter feito alguma coisa para trazê-lo de volta, isso sim, então apenas reviro os olhos com a presença dele aqui - que era o mínimo - e resolvo ignorar o deus aqui e passar direto.

— Não podemos interferir nisso, você sabe disso, Jason Grace. — Hefesto diz quando passo do seu lado. Travo meus pés no chão, mas não olho para ele. — A única coisa que pude fazer foi trazer vocês de volta para o acampamento, mas se eu pudesse interferir, ele estaria vivo. Ele... morreu de forma honrosa, um verdadeiro herói.

Não respondo nada, espero alguns segundos para saber se ele vai dizer mais alguma coisa, e quando ele não diz, sigo meu caminho até meu chalé. Me jogo na minha cama e mordo minha bochecha para conter o rugido de dor quando isso faz meu ombro latejar. Queria conseguir fazer alguma coisa, mas parece impossível. Queria chorar, mas se eu chorar acho que junto eu não conteria toda a fúria que eu sinto. Queria quebrar alguma coisa, gritar, mas não faço nada disso. Queria dormir e poder me desligar dessa realidade onde meu melhor amigo está morto, mas tenho medo dos pesadelos que posso ter.

Não sei quanto tempo passou até baterem na minha porta, o que eu ignoro com destreza. Mas a pessoa não deve ter muita noção, já que abre a porta mesmo assim. Provavelmente era a última pessoa que eu queria encontrar, Apolo entra no meu quarto todo enfaixado, eu sabia que os ferimentos dele eram bem sérios, achei que ele nem estaria em condições de estar de pé, mas aqui está ele, me olhando hesitante.

— Vai embora. — digo. É a primeira coisa que falo desde que tudo aconteceu.

— Eu só... imaginei que você estaria se culpando pelo que aconteceu, e queria que você soubesse que foi uma escolha do Leo. — ele insiste em falar, e o que ele disse ao menos capta minha atenção. — Leo recebeu a missão, e assim que vocês nos encontraram, eu contei o que eu sabia, que Sibila me disse. Ela me disse que um dos meio sangues que fossem me ajudar na missão iria morrer. Quando vocês chegaram e Leo me contou que recebeu a missão, eu contei isso para ele, disse que vocês deveriam ir embora. Ele disse que não podia fazer isso, porque se não cumprisse a missão os desastres seriam enormes, guerra, fim de mundo, essa coisa que a gente lida. Pediu para eu não contar nada para vocês, e seguiu com a missão. Ele puxou para ele essa profecia, ele decidiu que se alguém iria morrer, não seria nem você e nem Nico. Por isso ele não deixou você ir ajudá-lo, ele escolheu isso, não foi uma falha sua, não foi um erro seu e nem falta de esforço. Espero que isso ajude a te trazer algum consolo. Ele era um amigo muito bom.

Não traz nenhum consolo, provavelmente aumentou minha raiva. É claro que ele filho de Hefesto idiota fez algo assim, esconder uma informação tão grande e escolher quem deveria sobreviver. Não me sinto melhor sabendo que ele morreu para garantir que eu sobrevivesse, não me sinto melhor por ele ter agido como se a vida dele valesse mais que a minha.

— Vai embora. — digo mais uma vez.

— Eu sinto muito, Jason. De verdade.

Assim, fico sozinho mais uma vez. Depois de hoje, ficar sozinho e sofrer é o mínimo do que eu mereço.

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