Nunca fui uma delas

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"Há tanta coisa que eu gostaria de dizer...mas eu não sei por onde começar...
Alguém me disse que ninguém nasce capaz de suportar toda a dor desde o inicio. Se isso realmente é verdade por que tenho que fingir que está tudo bem agora.
Talvez eu devesse buscar minha própria felicidade, mas conseguiria ser realmente feliz depois que a única coisa que parecia um simbolo de liberdade no caos foi tirado de mim?
Todo mundo tem uma ferida, certo? ele me entendiria e sentiria a mesma dor que eu? deveria conversar com ele no próximo verão? deveriamos fugir nesse verão?
Não..."

As notas pareciam mais melancólicas e confusas conforme eu avançava as páginas, a garota do inicio do diário e aquela que escrevera as últimas páginas pareciam duas pessoas difererentes. Algo estava acontecendo bem  embaixo do meu nariz e não percebi nada.

A crueldade realmente tinha muitas faces. muitas vezes agindo de forma sorrateira em quem quer que seja, e sem que percebamos ela se instala - assim como parece ter se instalado na minha familia - ela se fortalece de doses de culpa, medo, arrependimento até envenenar nossa alma. E eu teria que descobrir quais foram as doses de crueldade que Jennifer teve que engolir.

Caminhei até a parede onde tinha colado todas as informações, mas nada parecia se conectar. Encarei a foto de minha irmã com o rosto sorridente não acreditando que ela poderia ter passado por tanta tristeza antes de sua...morte.

Peguei o celular que estava no criado mudo, Jake não havia respondido minhas mensagens e nesse momento não queria falar com ele. procurei o contato que havia ligado inúmeras vezes, mas apenas uma desde que havia chegado em Duskwood.

A chamada se iniciou, o celular tocou 5 vezes antes que a pessoa do outro lado o atendesse.

- Oi, querida. - Sua voz parecia cansada - Estava no jardim, como estão as coisas ai? se divertindo?

Fui bombardeada de perguntas.

- Oi, mãe. Esta tudo bem aqui - Uma meia verdade não ia ferir ninguém - Estava apenas com saudades da sua voz.

- Você parece um pouco cansada, meu bem. - Suspirou - Se seus remédios não estão fazendo efeito deveria voltar para irmos ao médico.

- Não precisa...é só que...

- Sim? pode falar comigo. - escuto o som dos seus passos diminuirem.

- A Jennifer estava com algum problema ou estava com o comportamento fora do normal naquele ano?

O silêncio se estendeu do outro lado da linha, apenas o som de sua respiração confirmava que ainda estava ali.

- Não. - Quebrou o silêncio - Tudo estava como sempre, porquê?

- Nada, pensei ter recobrado alguma memoria, mas deve ter sido um sonho. - Mais uma mentira - Preciso ir agora, mãe.

- Lembre-se que você pode voltar a qualquer hora.

Não respondi, apenas encerrei a ligação. Depois de todos esses anos minha mãe parece ter desenvolvido sua própria maneira de lidar com o luto, ignorando ele e fingindo que aquele acidente nunca aconteceu. Agora passa suas tardes cuidando das rosas no jardim de nossa casa na companhia de minha avó.

Encaro a capa do diário em minhas pernas, ler aquilo estava me deixando triste, ficar naquele quarto estava me deixando triste. Salto da cama, por causa dos remédios que havia tomado antes acabei dormindo mais do que o necessário.

♧♧

- Jessyyyy.

A chamo assim que coloco os pés na oficina.

A garota dos olhos de esmeralda - DuskwoodOnde histórias criam vida. Descubra agora