1.3. super rich kids

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escrevi este capítulo inteiro enquanto ouvia super rich kids do frank ocean porque tem tudo a ver e acabou entrando nas minhas músicas mais ouvidas de 2021. só uma aleatoriedade que gostaria de compartilhar.

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Desconfiada e inquieta, Helena passou a semana inteira pensando — e repensando — sobre o inesperado convite de Georgia. Na quinta-feira, durante o intervalo, cogitou conversar sobre as possíveis motivações de Georgia com as novas amigas, mas desistiu quando se deu conta de como soaria maluca e paranoica. Nem mesmo Drica, sempre supersticiosa e excêntrica, entenderia a desconfiança que conflitava os ânimos de Helena.

No fim das contas, decidiu que confiaria na generosidade de Georgia, torcendo, rezando, para que não fosse uma armadilha na qual acabaria sendo o foco de um vexame. Helena estava numa nova cidade, onde tudo acontecia, e queria ser diferente. A nova versão de Helena precisava de amigos.

— Pai — Helena se sentou à mesa, onde Jessé almoçava com o rádio ligado em alguma estação que tocava Raça Negra. — Amanhã vou na casa da Georgia. Acho que ela chamou alguns amigos e me convidou também. Tudo bem se eu for?

Jessé mastigou a comida devagar, olhando para a filha com os olhos semicerrados, quase contemplativos. Ele ainda estava com a roupa de chofer, enquanto Helena ainda estava com a mochila da escola nas costas, o sangue quente depois de ter caminhado todo o caminho de volta para casa. Pela janela, podia ver a avó cumprimentar os transeuntes enquanto cuidava das plantas e desabafava com Flora.

— Ah, os patrões estão viajando — ele se deu conta, lembrando-se de algo que preferiu guardar para si. — Pode ir. Só toma cuidado, tá ok? Não abusa da hospitalidade e não esquece que lá eu sou empregado. Não vai me arrumar encrenca, menina.

— Pode deixar, papai — ela sorriu com graciosidade, enternecendo o coração do pai com a forma carinhosa de se referir a ele. — A última coisa que eu quero é arranjar problemas com aquela família. Dito isso, conhecendo mais ou menos a Georgia, você acha que eu devo ir? Não sei o tipo de pessoa que ela é hoje em dia.

— Para uma adolescente, ela até que não é tão horrível assim — ele disse, checando o horário no relógio de pulso antes de se levantar com o prato vazio em mãos. — Se ela te convidou, acho que deve ir e se divertir. É sempre bom fazer amigos. Se for ruim e você odiar aquela turma, então você volta correndo para casa e ponto final.

— Bela ajuda, pai.

Helena suspirou, meio desaforada pela resposta diplomática que recebeu. Então parou por um instante, dando-se conta da confiança que ele depositava nela. Não era todo pai que tratava a filha de igual para igual, como uma pessoa, em vez de uma extensão de si mesmo cuja individualidade precisava ser podada.

— Na verdade — ela se corrigiu enquanto o observava lavar a louça —, foi uma ótima ajuda mesmo. Obrigada, pai.

Antes que pudesse ser consumida com pensamentos sobre o dia de amanhã, Helena aproveitou a brecha na conversa para se trocar e ajudar a avó com as tarefas domésticas. As preocupações sobre o amanhã podiam aguardar enquanto ela tratava de cuidar da avó.

Quando Helena chegou ao condomínio de luxo da família para a qual o pai trabalhava, bateu, de repente, um misto de pânico e inquietação. Sentiu como se estivesse prestes a cometer um erro horrível, mas pediu para o porteiro, que já a conhecia pela camaradagem que tinha com Jessé, interfonar para avisar sobre a sua chegada.

— Fica em paz, menina — disse ele em tom ameno, liberando a entrada dela pelo portão pelo qual passava um Jaguar que a fez dar um passo para trás.

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