Depois de sair da escola na quarta-feira, Helena foi convencida por Sofia a passarem na casa de Drica para estudarem para as últimas provas do bimestre. Ela só precisava aguentar mais duas semanas e finalmente estaria livre de acordar cedo, e livre também de caminhar os oito minutos de trajeto para a escola. Helena estudou o que conseguiu e, uma hora depois, no entanto, estava ela e as duas amigas assistindo aos novos episódios de Pretty Little Liars que Drica tinha baixado por meios ilegais.
— O que vocês fariam se A perseguisse alguma de vocês? — Sofia perguntou, bebericando o refrigerante pelo canudo de modo barulhento.
— Chamaria a polícia — Helena respondeu como se fosse óbvio.
— Mudaria de país — Drica respondeu quase que simultaneamente, pensando melhor e então se corrigindo. — Na verdade, eu provavelmente faria uma tiragem para saber se alguém que eu conhecia estava tentando me prejudicar. Acreditem, as cartas nunca mentem.
Sofia e Helena se entreolharam, rindo em silêncio da forma com que a mente de Drica funcionava.
— Tá, mas e depois? — Sofia a estimulou a continuar. — O que você faria quando soubesse que, sei lá, o Luiz estava te ameaçando com um segredo muito obscuro?
— Meu orixá se encarregaria do resto — ela deu de ombros, afastando uma mecha do cabelo cacheado, escuro como a noite, que insistia em cobrir seu olho. — Além disso, ele é muito sonso. Talvez nem precisasse de Exú no caso.
Sofia deu uma risadinha cínica, cruzando os braços com uma expressão de tédio.
— Você realmente acredita nessas besteiras?
— Sim? — ela pareceu ofendida, apontando para Helena. — Não vejo você questionando ela sobre catolicismo.
— Eu nem sou católica — Helena deu de ombros, encostando a cabeça no encosto do sofá com a atenção na cena que se desenrolava na série. — A minha avó costumava ir na Universal quando ainda podia e minha mãe me levava na missa lá em Chapadinho aos domingos, mas eu não sou nada.
— Tá vendo? — Sofia retorquiu, suspirando em sinal de quem não se importava mais com aquele assunto. — Religião num geral é uma grande besteira, só isso.
— Engraçado que você não reclama quando faço tiragens para você.
Sofia se limitou a revirar os olhos, erguendo um único ombro de forma tão despretensiosa que fez Helena esboçar um sorriso de singelo deleite. Ela olhou para as duas amigas, sentindo-se então profundamente desinteressada com a discussão que não levaria a lugar algum.
— Gosto de me entreter com besteiras — ela disse e então disparou outra pergunta em tom sugestivo: — Nenhum segredo obscuro, meninas?
— Não mesmo — Drica bufou para o desagrado da amiga. — Só as piores escolhas no departamento romântico. Todo menino que gosto tem namorada, acho que estou fadada a destruir lares.
— É. Um caso perdido — Sofia concordou com um muxoxo, voltando-se para Helena com expectativa. — E você, Leninha? Me dá alguma coisa, vai.
Ela balançou a cabeça, franzindo o cenho com o apelido que só os familiares mais próximos dela usavam.
— Nada escandaloso — Helena comprimiu os lábios, pensativa. — Dificilmente eu seria fonte de algum entretenimento de A.
Drica se remexeu no sofá, colocando os pés no colo de Sofia, que, por sua vez, encarava o vazio com um ar de intensa ponderação.
— Eu fico imaginando os podres que a família de um político tem para esconder — murmurou em tom contemplativo, movendo os olhos em direção à amiga com irrestrita curiosidade. — O que o seu pai diz sobre a família do senador?
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Questão de Tempo
Fiksi RemajaParte I. Helena Porto conhecia muito bem os dissabores de ser sozinha. Não por acaso, passou boa parte de sua vida lidando com as consequências da tumultuada separação dos pais. Ela só tinha dez anos quando foi levada para outra cidade, e então deze...