POV HELENA
- Estou com o coração apertado de ver você indo, mas sei que seu trabalho lhe fará bem, os fãs estão loucos para você voltar. - Me sentei na beirada da cama, e continuei observando minha filha.
- Sinto saudades do palco, vai ser bom para ocupar minha cabeça. – Ela me sorriu gentilmente.
É tão triste ver minha filha assim, em pedaços. Depois de mais uma perda, e justo do primeiro amor. Chega a ser cruel, a vida tem sido cruel desde o início.
Elisa era a sua namorada, mais de quatro anos de namoro, planejavam uma vida juntas, e faleceu a dois meses. Uma jovem cheia de vida, com planos de morar em outro pais, cursar moda e depois se casar com Olivia. Todos os planos enterrados com ela em um caixão.
A família de Elisa não apoiava o namoro das duas, que sempre foi a distância, Elisa em São Paulo e a Olivia aqui em Minas Gerais, mas, elas seguiam firmes.
Eu sempre respeitei a família de Elisa e evitei comentários que pudessem causar certo desconforto, mas, quando mesmo ela com câncer, nos últimos dias, minha filha veio correndo de uma turnê em Tokio, e mesmo com todo esforço, mesmo com Olivia dormindo no banco do hospital, não deixavam as duas ficarem sozinhas, dificultou tanto que as duas pudessem ter tempo para conversar.
Como me dói lembrar da noite em que Elisa partiu.
Eu estava ao lado da minha filha, sentada em uma cadeira, no mesmo corredor da família de Elisa. Fomos avisadas que ela tinha piorado nas últimas horas.
Depois de quatro dias e meio sem dormir, Olivia cochilou no meu ombro, e acordou com os gritos da mãe de Elisa, naquele momento eu senti que ela tinha partido. Uma mãe reconhece o grito de outra. Ela perdeu a filha, a minha, estava acordando assustada, sem entender muito bem onde estava de tão cansada. Quando ela entendeu a situação ela quis ir até lá, mas eu e seu pai a seguramos.
Minutos da Olivia chorando no colo do seu pai, e do outro lado aquela família desesperada. Me senti impotente, queria ajudar, mas como ajudar quem não quer ajuda?
O pai de Elisa veio em nossa direção, proibiu Olivia de ir ao velório, para evitar aglomeração de fãs e de pessoas que não são da família.
Aquilo foi tão cruel, que mesmo eu tentando me compadecer da dor dele, que acabava de perder uma filha, eu não aguentei e falei tudo o que estava entalado. Por sorte eu consegui que Olivia pudesse pelo menos se despedir de Elisa ali no hospital.
Como levaram o corpo para o necrotério rápido, descemos até o subsolo. Tudo muito branco, muito vazio, corredores extensos e gélidos. Um silêncio ensurdecedor. Acompanhando a nossa filha. Ficamos observando através do vidro aquela cena triste.
Ela entrando sozinha, um funcionário abrindo uma grande gaveta de metal. Tirando a maca, Olivia segurou a mão de Elisa, e ficou conversando por alguns minutos.
Nesse tempo liguei para a produção das meninas, Olivia sempre foi muito solitária, suas amigas precisavam saber o que estava acontecendo. Tempos difíceis estão por vir.
Mesmo Olivia não tendo publicado nas redes sociais nada sobre a morte de Elisa, no show seguinte do grupo, já nos Estados Unidos, as meninas fizeram um minuto de silêncio pela morte da moça.
Em todos os lugares só se falava disso, por sorte o velório foi curto, o enterro rápido e não deu para os fãs de Olivia irem aglomerar. Porque senão os pais de Elisa, colocariam a culpa em minha filha mais uma vez.
Trouxe ela para nossa casa, apesar da cidade ser pequena, pacata. Nunca vi tantos fotógrafos pendurados no muro, buscando uma foto que seja da minha filha. Como as pessoas podem tentar tirar vantagem da dor do outro? Que mercado doentio.
Não conseguiram, ela não saiu do quarto, não por eles. Porque ela não quis mesmo.
A vida de Olivia era pacata em vista do que é hoje. Foi criada com o pé na terra vermelha, brincando de comidinha de barro, pulando em árvores, me ajudando na cozinha e levando marmita pro pai enquanto ele capinava pela fazenda.
Ela foi adotada com um ou dois dias de vida, não temos muita certeza sobre isso. A deixaram no mato perto de um barranco, toda sujinha de terra, do lado dela tinha uma gata preta, parecia cuidar do bebê. Meu marido pegou a criança e a gata, colocou na caixa que ele tinha atrás da bicicleta dele. E veio pedalando até a casa central.
Os donos não quiseram saber de cuidar da criança, eles tinham bastante condições para isso, mas, eles já tinham dois filhos. Eu e meu marido sempre quisemos ser pais, mas, Deus não abençoou a gente, já tínhamos quase quinze anos de casados e nada de uma cria.
Então, decidimos criar, meu marido foi no cartório e falou que o bebê nasceu na fazenda, que ele veio registrar. Hoje em dia eu sei que isso é ilegal, que agente poderia até ser preso, mas na hora... A gente fica biruta, uma criança rosinha, gordinha com uns olhos de jabuticaba. Era minha!
Não nasceu de mim, mas é minha desde o momento que eu a vi.
Tocamos a vida como dava, muito trabalho, esforço, mas Olivia cresceu forte e saudável, por diversas vezes meu marido quis contar para ela, que ela não veio da minha barriga, mas, eu sentia tanto medo, e implorava para ele e ninguém da nossa família contar.
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Roma
FanfictionDizem que todos os caminhos Nos levam para o mesmo destino, nos levam a Roma. (ouça: Roma - Maite Perroni)