Capítulo 32

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– Bom dia.

Digo alegremente assim que adentro pelo quarto do meu pai, na casa de repouso, e o vejo sentado na sua poltrona enquanto tem o jornal nas suas mãos.

– Tão cedo, princesinha, não vinhas só de tarde? – ele estranha, depois de encarar o relógio na parede.

– Não, papá, venho sempre de manhã. – dou um meio sorriso e aproximo-me.

Como nunca tomo a iniciativa para o tocar, com medo da sua reação, espero que ele segure na minha mão e beije a parte de trás dela.
A sua pele macia envolve os meus dedos e puxa-me para mais perto, para eu me sentar ao seu lado.

– Já comeste? – pergunto curiosa.

– Sim, mas estava a pensar em ir ao jardim para colher uma maçã. – ele revela a sua vontade.

Felizmente o Alzeimer não lhe retirou a capacidade de ter automobilidade. Bem, pelo menos, não ainda.
Ao início, um dos meus maiores medos era que ele piorasse de um dia para o outro, como se fosse bipolar e o humor divertido ultrapassasse a barreira e se convertesse em raiva numa fração de nanosegundos.

Mas esse medo foi diminuindo a cada vez que eu o via e entendia que aquilo não iria acontecer tão rapidamente. Só que, depois de quase três anos a lidar com a sua doença e a conviver com as suas emoções, precisei de me mentalizar que é sempre bom ter um pé atrás para ajudar no impacto.

– Acho uma ótima ideia, papá. – concordo. – Podemos falar do jogo do Patriots. – sugiro enquanto ele coloca o jornal de lado e se levanta da poltrona.

– Tu a quer falar de futebol americano? – enruga a testa e eu acabo por dar de ombros enquanto sorrio. – Aposto que nem acompanhaste o jogo, mas podemos falar na mesma.

– Não acompanhei? – finjo que estou magoada. – Não só acompanhei, como entendi tudo o que eles falaram durante o jogo.

– Precisamos de pôr em prática esses conhecimentos, minha princesinha. – ele sorri e caminha até a aporta.

Acompanho os seus movimentos e vou ao seu lado, pelo corredor, enquanto ele me guia e segura no meu braço.
Felizmente já não está restrito a ficar no quarto o dia inteiro e pode sair para ir ao jardim, se for acompanhado, e isso causa-me um alívio inexplicável.

Ele ajeita o seu casaco no pescoço, por causa do frio, e reparo que está com o pijama que lhe trouxe na segunda-feira. É bastante simples, com uma cor azul clara e com um tecido maravilhoso para aquecer o corpo neste tempo frio.

Ele todo está de azul e confesso que fica fofinho nesta roupa. Ele empurra a porta de saída que dá para o jardim e não consigo conter a vontade de inspirar fundo e senti o aroma a flores que este jardim transmite.

As folhas estão cobertas por uma fina camada de orvalho e consigo sentir as pétalas duras e frias na ponta dos meus dedos quando lhes toco. As camélias são as que chamam a minha atenção, com um pequeno floco de neve no seu olho e com as pétalas rosadas e suaves completamente cobertas pelo gelo.

Algumas pontas das pétalas têm as gotas de água congeladas, em momento freeze e que dá um aspeto de que o tempo parou.

Ao longe, está um senhor bem mais velho, sentado num banco que é abrigado pela armação da pequena estufa, enquanto tem alguns ramos de árvore à sua frente e os contempla como se fossem autênticas obras de arte.

O meu pai e eu vamos até à macieira que está no centro do jardim e ele procura por uma maçã que não esteja queimada do gelo. Apesar de não ser uma época muito propensa para o cultivo do fruto, esta árvore sempre tem flor ou fruto, até mesmo no inverno.

Jogada do AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora