Capítulo 7

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- Alô? - respondo com a voz trémula assim que coloco o telefone no ouvido e atendo a chamada.

- Olá, menina Reis, é a Susana. Tudo bem?

A senhora da casa de repouso responde com um tom que não sei identificar.

- Depende. Está tudo bem com o meu pai?

Engulo em seco quando a questiono, não só pelo facto de estar preocupada como também porque a rajada de ar frio que me atinge me faz encolher e amaldiçoar a preocupação por me ter feito esquecer do casaco dentro da cafetaria.

Olho para os dois lados da rua e atravesso-a até ao outro lado, para me abrigar do vento numa árvore alta e com o tronco grosso.

Aperto o braço contra o meu corpo, para me aquecer enquanto ouço uns resmungos do outro lado da linha.

- Princesinha!

Ouço a voz rouca e grave do meu pai, que faz com que o meu coração fique quentinho.

- Papá. - tremo o lábio.

- Como está a minha aniversariante preferida? - ele diz num tom animado.

- Ohh, tu lembraste-te... - digo com um tom baixinho e triste.

- Claro que me lembrei, princesinha. - a sua indignação causa-me um arrepio. - Como está a ser o teu dia?

- Bom, mas melhorou agora que ligaste. - digo e consigo imaginar o sorriso ternurento que me lançaria.

- Sempre tão doce, como a tua mãe. Como é que ela está? Ela está por ?- pergunta, em tom alegre.

O silêncio permanece entre a linha quando não tenho coragem de lhe dizer a verdade.

Fazem mais de três anos que o meu pai foi diagnosticado com Alzheimer e que se esqueceu de tantas coisas que fico triste em não poder dizer-lhe como elas realmente aconteceram.

O falecimento da mamã foi a primeira coisa que ele se esqueceu e o aperto que fica no meu coração a cada vez que ele me pergunta por ela é de cortar a respiração.

Nunca sei o que responder porque tenho medo de virá-lo contra mim quando me acusar de estar a mentir.

- E como foi o teu dia? - pergunto, desviando-me do silêncio ensurdecedor e da dor que começa a aparecer no meu peito, assim como as lágrimas que querem subir.

- Hoje a Susana poupou-me de ter que fazer aquele exercício mais chato da fisioterapia porque eu disse que queria estar bem para te poder dar os parabéns, princesinha. - assim que ele diz isso, sinto um aperto no peito.

Ele começa a tossir, fortemente.
É a segunda vez que ele tosse enquanto conversa comigo, acho que a mudança de tempo o fez ficar assim porque ele gosta de ir ao jardim da casa de repouso.

- Aposto que ela também te deixou ir ao jardim depois da sessão. - fungo levemente.

- Sim, apanhei a tua flor preferida. - ele diz quando se recupera.

Sinto os meus olhos encherem-se de lágrimas. Desde que entrou na casa de repouso, que me tem presenteado todos os anos com umas camélias.

A flor nasce na estufa que fica no centro do jardim da casa e ele adora ir lá porque sabe que são as minhas flores preferidas, então cuida delas para depois me oferecer uma.

Olho para o céu, para conter as minhas lágrimas de cairem, mas sou incapaz porque elas vêm com força.

Respiro fundo e brinco com o pé no chão, como se fosse uma criança envergonhada.

Não consegui ir à Providence Living at Maitland esta semana porque encerraram as visitas quando a entrada ficou bloqueada pela nevasca intensa que caiu durante os dois dias seguidos.

E sinto um aperto no peito a cada vez que penso no meu pai, que ele se pode esquecer de mim por eu não ir lá, então tenho ligado todos os dias para falar com ele.

Mas todos os dias preciso de pelo menos uns segundos em silêncio com ele para conter as minhas lágrimas.

Por sorte, quando falamos por telefone, não preciso de conter o choro, mas quando estou com ele é muito mais complicado conter as emoções que pretendem dar as caras.

Quando fungo mais uma vez, parece que isso desperta a atenção dele e ele diz:

- Ohh, princesinha, ligaste!

E isso faz com que eu precise de ter o maior autocontrolo que alguma vez tive na vida porque ele realmente esqueceu-se de que estava a falar comigo.

- Sim. - respondo, com a voz entrecortada. - Queria saber como estás.

- Estou bem e tu, meu amor?

- Estava a pensar passar aí para levar um pouco de bolo, o que achas? - limpo a garganta e passo a mão nas minhas bochechas molhadas.

- Acho excelente. Mas, quem fez anos?

Ele questiona e eu apenas aperto os olhos com força para não suspirar alto e desabar.

- Chego daqui a dez minutos. Beijinhos, amo-te.

- Também te amo, princesinha.

Desligo a chamada e encosto-me ao tronco da árvore grande enquanto coloco a mão no peito e respiro fundo vezes sem conta para recuperar parte do ar que me falta.

O vento frio faz o meu rosto começar a arrefecer por ter as lágrimas a escorrer, mas limpo-as com a manga da camisola fina e respiro fundo.

Quando me viro para regressar à cafetaria, sou surpreendida ao ver dois corpos aproximarem-se de mim.

Mike e Colin vêm à frente, os dois sorridentes enquanto passam por mim e conversam sobre o jogo de hoje.

Atrás vem Derick e John, os dois mais calados, mas também têm qualquer conversa que não consigo decifrar porque Ethan entra no meu campo de visão quando dou um passo em frente.

Está com o casaco fechado até à zona dos lábios e as mãos dentro dos bolsos para aquecerem, mas ele permanece com a mesma pose de desconforto assim que repara na minha presença em frente a ele.

Os seus amigos continuam a caminhar pelo passeio enquanto que ele diminui o passo e me encara com um certo... escárnio, diria.

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Fiquei triste pelo pai dela 🥺

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